O ginecologista Nicodemos Júnior Estanislau Morais, 41, preso no dia 29 do mês passado, em Anápolis (GO), acusado de ter abusado sexualmente de 53 mulheres, também pode ter cometido o mesmo tipo de crime no Paraná, onde atuou em 2018. Ele, que já está em liberdade, é investigado por importunação sexual, violação sexual mediante fraude e estupro de vulnerável.

Médico já trabalhou em hospital em Porecatu, na Região Metropolitana de Londrina
Médico já trabalhou em hospital em Porecatu, na Região Metropolitana de Londrina | Foto: Arquivo Folha

A reportagem da Folha de Londrina entrou em contato com a delegada Isabella Joy Lima e Silva, da Deam (Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher) de Anápolis (GO), para comentar sobre o caso. “A gente começou a atender as vítimas aqui de Goiás e tentamos entrar em contato com o delegado de Porecatu para saber mais sobre o registro de ocorrência dessa vítima de Porecatu, mas o delegado não passou a informação para a gente. Aí nós conseguimos saber pelo inquérito de uma outra pessoa, que tinha essa vítima do médico no Paraná, que passou por uma situação dentro do consultório no hospital municipal de Porecatu. Entramos em contato e ela informou que o caso dela tinha sido arquivado, porque o médico tinha poder político com autoridades locais. Ela nem foi ouvida na delegacia, fez o depoimento por carta precatória. Teve que ser ouvida em Londrina, porque em Porecatu, por ser uma cidade muito pequena, ela já tinha perdido o cargo e foi até descredibilizada”, destacou. “O caso dela em Porecatu foi arquivado, só que parece que existem muitas vítimas tanto na cidade de Porecatu, quanto na cidade de Assaí, mas ninguém tem coragem de denunciar, porque ele tinha as ‘costas quentes’.”

Ao ser confrontado pela reportagem sobre o comportamento do médico, o prefeito de Porecatu, Fábio Luiz Andrade, se limitou a dizer que Morais não era servidor contratado pela prefeitura e que ele prestou serviços ao município por intermédio de uma empresa terceirizada, vinculada ao Hospital Santa Alice, de Santa Mariana. Andrade ressaltou que durante o tempo em que prestou serviços no município a prefeitura não recebeu nenhuma denúncia formal relacionada ao médico. A reportagem entrou em contato com o Hospital Santa Alice, de Santa Mariana, que foi o grupo que conduziu o hospital de Porecatu na época, mas ninguém respondeu ao pedido de entrevista.

A reportagem também entrou em contato com a assessoria de imprensa da Polícia Civil do Paraná e foi informada que não foi encontrado nenhum boletim de ocorrência com o nome do médico. No entanto, a FOLHA teve acesso ao documento do boletim registrado pela vítima.

A vítima contou à reportagem que o médico se dirigiu a ela com "termos chulos" e que "quando tentou pela primeira vez, não conseguiu formalizar a denúncia em Porecatu". Ela informou que na consulta realizada em 2019, assim que o médico começou a utilizar uma linguagem mais pesada, pediu a presença do marido ou de uma enfermeira no consultório, porque não queria que o exame ocorresse somente com o médico e ela sozinhos. “Mas ele falou que não cabia a presença de outra pessoa.” Ele chegou a requisitar um exame intra vaginal para a semana seguinte, mas ela não retornou ao consultório.

Na delegacia de Londrina, ela foi ouvida por um delegado. No entanto, no início deste ano, foi informada que o processo foi arquivado. A mulher diz ter conhecimento de outras vítimas do médico em Porecatu, mas que essas pessoas não registram a queixa por medo de retaliações. Ela lamenta que as autoridades locais não lhe deram ouvidos e diz que muitas ocorrências poderiam ter sido evitadas se o médico tivesse sido punido na época.

O Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal (CRM-DF) determinou a interdição cautelar do ginecologista. Na prática, a entidade suspendeu, temporariamente, o registro profissional dele. Com isso, Morais perdeu o direito de exercer a medicina até a realização de um julgamento definitivo sobre o caso. A análise pode ocorrer em até um ano. O Cremego (Conselho Regional de Medicina de Goiás) afirmou que o caso está sendo analisado administrativamente e que não iria se pronunciar.

A delegada de Goiás afirma que as vítimas tinham em média entre 20 e 30 anos e tinham como característica serem "muito bonitas". Uma delas tinha 12 anos na época do suposto abuso. "Ele escolhia pacientes jovens, bonitas e que estavam sozinhas. Segundo as investigações, ele praticava atos libidinosos nas mulheres durante consultas ou exames. Sempre começava a consulta com perguntas inapropriadas, com expressões chulas e quando ele ia fazer o toque ou exame transvaginal, acabava manipulando e até fazendo penetração com os dedos em vez só do toque típico do exame ginecológico. Ele acabava pegando nas partes íntimas da vítima e fazia com que as vítimas pegassem nas partes íntimas dele também”, destacou.

Morais tinha registros de médico em três estados (GO, PA e PR) e no Distrito Federal. Questionada se essa seria uma forma do médico se esquivar das denúncias, a delegada afirmou que não se pode afirmar isso. “A gente acredita que sim, mas nós não temos como provar isso.”

Desde o dia 29, Morais estava no Centro de Inserção Social Monsenhor Luiz Ilc, conhecido como cadeia pública de Anápolis, quando o juiz Adriano Linhares, da 2ª Vara Criminal da cidade, decidiu na segunda-feira (4) que Morais poderá responder em liberdade às acusações de fraude sexual. Ele está com tornozeleira eletrônica, não pode sair da cidade sem autorização judicial e está proibido de ter contato com as vítimas e atender nos mesmos locais onde trabalhava antes de ser preso. A delegada já concluiu dez inquéritos de supostas vítimas do médico e já os encaminhou ao Poder Judiciário de Goiás.

A reportagem entrou em contato com o advogado Carlos Eduardo Gonçalves Martins, responsável pela defesa de Morais, mas ele preferiu não se pronunciar.

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