Uma propaganda veiculada no jornal Paraná Norte (em novembro de 1934) já destacava as vantagens para os interessados em desbravar a região de Londrina. O anúncio feito pela antiga CTNP (Companhia de Terras Norte do Paraná) mencionava terras férteis cobertas por matas virgens e com água abundante. A publicação faz parte da história oficial da cidade que completa 83 anos neste domingo (10). Ao longo do tempo, a propaganda simbolizou um dos marcos históricos para o início da colonização de Londrina.

Porém, o anúncio da CTNP não foi tão inovador à época, segundo apurou o pesquisador Humberto Yamaki, professor do Departamento de Arquitetura da UEL (Universidade Estadual de Londrina), pós-doutor em desenho urbano pela Oxford Polytechnic, na Inglaterra. Nos últimos anos, Yamaki consultou acervos do Museu Histórico de Londrina e de bibliotecas de Curitiba, São Paulo e Rio de Janeiro. O professor reuniu 31 mapas na publicação "Terras do Norte - Paisagem e Morfologia", lançada na última quinta-feira (7). Ao trazer à tona decretos de colonização e projetos para a concessão de ferrovias no Paraná, Yamaki revela a intenção do governo do Estado de explorar a região antes mesmo de 1929, data da primeira expedição da CTNP.

Parte dos mapas publicados é inédita. As reproduções foram complementadas com informações das leis e decretos em vigor na época. Com o cruzamento de dados, a pesquisa propõe uma reflexão sobre a colonização de Londrina. "Compilamos o material e separamos os mapas de viação, que são os projetos viários do Estado, concessões de ferrovias, concessões de terras para a colonização e as terras da Companhia. O material é organizado de forma cronológica, de 1907 até 1932", resume Yamaki.

A obra é o resultado de um trabalho intenso de pesquisa desenvolvida nos últimos anos e que terá continuidade na UEL. Pioneiros de Londrina; representantes da Secretaria Municipal de Cultura; alunos, professores e funcionários da UEL participaram do lançamento do livro no Museu Histórico de Londrina, antiga estação ferroviária, destino final de grande parte dos colonos e imigrantes que desembarcaram na terra vermelha. A publicação contou com o apoio do Promic (Programa Municipal de Incentivo à Cultura) e do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e está disponível no Museu Histórico, na Biblioteca Municipal e nas bibliotecas do campus da UEL.

Traçado das linhas férreas seguia principais rios do PR

Página do livro "Terras do Norte - Paisagem e Morfologia": linhas férreas previstas em lei traçadas sobre o "Mappa de Viação do Estado do Paraná", de 1925
Página do livro "Terras do Norte - Paisagem e Morfologia": linhas férreas previstas em lei traçadas sobre o "Mappa de Viação do Estado do Paraná", de 1925 | Foto: Reprodução



O Plano Geral de Viação Férrea do Paraná (Lei 1939/1920) previa a ligação principal entre o litoral do Estado e o rio Paraná, além de outras cinco linhas distribuídas ao longo dos principais rios do Estado. A proposta, conforme frisa Humberto Yamaki, apresenta semelhanças com o modelo paulista. No livro, os traçados previstos na lei foram acrescentados ao "Mappa de Viação do Estado do Paraná" (1925). Porém, algumas concessões foram alteradas e boa parte da linha férrea nem chegou a ser implantada.

Para o pioneiro de Londrina, médico Lauro de Castro Beltrão, o cruzamento de dados e a apresentação dos mapas relacionados à colonização acentuam a perda de lideranças no cenário político e o abandono da região ao longo dos anos. Surpreso com a quantidade de concessões previstas já em 1920, Beltrão lamentou os atrasos no desenvolvimento.

O pioneiro elogiou a pesquisa e ressaltou que o levantamento como um todo desmistifica a história da cidade por meio da apresentação de mapas antes desconhecidos. Segundo ele, o pai, o engenheiro Alexandre Gutierrez Beltrão, já havia traçado a demarcação da área que foi objeto do contrato de colonização entre a CTNP e o Governo do Estado. "Meu pai fez isso antes dos ingleses virem para cá. Durante dois anos, na mata virgem na época, ele estabeleceu o perímetro das terras por meio da orientação das estrelas. Como ele tinha sido professor de topografia, através das estrelas é que ele fazia a localização dos pontos. Hoje se faz isso por satélite", aponta.

Para o jornalista e escritor Widson Schwartz, a obra acrescenta detalhes importantes à história de Londrina. "Ao delimitar quais eram as divisas, onde estão situadas essas áreas e os lotes destinados à colonização, Yamaki complementa a história da cidade. De um modo geral, isso não muda o cerne da colonização, mas resgata detalhes interessantes para a memória da formação do município", ressalta. (V. C.)