Manifestantes querem repetir sucesso da mobilização contra a OMC em Seattle
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sexta-feira, 14 de abril de 2000
Por MONICA YANAKIEW, Correspondente da AE
Washington, 15 AE) O começo foi em Genebra, no dia 16 de maio de 1998. Quando anoiteceu, centenas de jovens encapuzados romperam o silêncio da pacata cidade suíça, atirando pedras contra as fachadas dos bancos, incendiando carros e improvisando fogueiras.
A manifestação deixou um saldo de 5 feridos e 20 presos. Mas marcou o início de uma mobilização contra as instituições internacionais, criadas há meio século para colocar certa ordem sobre a economia mundial, destruída pela depressão e duas grandes guerras.
O alvo dos protestos, dois anos atrás, era a Organização Mundial do Comércio (OMC), cujo cinquentenário estava sendo comemorado por um punhado de líderes internacionais, alguns com fama de progressistas. Entre eles, Tony Blair, da Grã-Bretanha, Nelson Mandela ,da áfrica do Sul, e Fernando Henrique Cardoso, do Brasil.
Não foi um incidente isolado. Em novembro passado, a OMC realizou uma reunião ministerial em Seattle, nos Estados Unidos, na esperança de lançar a Rodada do Milênio, para liberalizar ainda mais o comércio. O encontro foi um fracasso: milhares de manifestantes saíram às ruas, para impedir as negociações.
Os enfrentamentos com a polícia resultaram na prisão de 600 pessoas e num prejuízo de US$ 17 milhões. Mas os manifestantes saíram de Seattle convencidos de que tinham sido ouvidos e era preciso continuar.
O próximo encontro foi marcado para amanhã, em Washington. Convocados por uma coalizão de 400 organizações sindicais, ecológicas, estudantis e religiosas, dez mil manifestantes planejam ocupar as ruas de Washington amanhã e segunda. Desta vez, os alvos serão as sedes do Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (Bird), onde ministros, representando 183 países, discutirão os rumos da economia mundial.
A polícia, escaldada pelos acontecimentos de Genebra e Seattle, está preparada. Cercou os dois prédios e acionou equipes de ciclistas, que só costumam circular pelos guetos de Washington, atrás de grupinhos traficando drogas em esquinas pouco iluminadas.
"As bicicletas nos permitem ter uma maior mobilidade", explicou um policial. "Podemos seguir as pessoas por calçadas e vielas, andar na contra-mão do tráfico, e cercar rapidamente quem estiver andando ou correndo", acrescentou.
Mas os participantes da Mobilização pela Justiça Social também estão mais organizados: tem um site na Internet (www.a16.org) e uma frequência de rádio (95.7 FM), para manter informados os manifestantes e coordenar ações de protesto. Um manual eletrônico, da Equipe de Médicos A16, detalha as medidas a serem tomadas se a polícia reagir com bombas de gás lacrimogêneo.
"Mantenha a calma e a concentração", diz o manual. "Você é forte e o desconforto é temporário." O importante é buscar refúgio num lugar seguro, para respirar ar puro. Correr aumenta a irritação porque o calor provoca a abertura dos poros e permite que a pele absorva melhor os produtos químicos lançados no ar por policiais.
O ideal, recomendam os médicos, é vestir roupas que cobrem o corpo inteiro, amarrar um lenço banhado em vinagre na testa, e proteger os olhos com os óculos de plástico usados pelos nadadores. Alguns manifestantes planejam usar fraldas para adultos, na eventualidade de passarem horas numa corrente humana
sem um banheiro público por perto.
Nem todos os protestos serão conduzidos pela multidão de jovens, de cabelos coloridos e roupas exóticas, que se preparavam para enfrentar a polícia no quartel-general da Mobilização pela Justiça Social - um velho galpão na Rua Flórida. Na mesma igreja, frequentada pelo presidente Bill Clinton, dezenas de intelectuais participaram de um encontro ontem, para explicar a centenas de interessados, quais são os riscos da globalização.
John Cavanagh e Sarah Anderson, do Institute for Policy Studies, falaram do impacto das crises financeiras e dos programas de ajuste sobre trabalhadores no mundo inteiro. No caso do Brasil, o resultado foi a demissão de 5.600 funcionários da General Motors e da Ford.
Em outra palestra e em entrevistas, o ex-economista chefe do Bird, Joseph Stiglitz, explicou que os protestos refletem "o medo" que reina no mundo inteiro. Numa economia globalizada, uma crise na ásia afeta outros continentes, os empregos e os capitais migram facilmente de um país a outro.