Cerca de 400 pessoas estiveram presentes no protesto realizado na manhã desta sexta-feira (23), no restaurante universitário do Campus Uvaranas, da UEPG (Universidade Estadual de Ponta Grossa), pedindo a expulsão de sete estudantes do curso de Agronomia que teriam trocado mensagens racistas por meio de um grupo de aplicativo. O caso foi enviado à ouvidoria da UEPG por intermédio de uma denúncia anônima no dia 22 de agosto. Na sequência o caso foi encaminhado ao MPPR (Ministério Público do Paraná). Desde então, o MPPR (Ministério Público do Paraná) investiga o caso. Segundo a assessoria da instituição, os fatos chegaram ao conhecimento do Ministério Público do Paraná em Ponta Grossa e foi instaurado procedimento para apuração, que tramita sob sigilo.

A UEPG abriu um processo administrativo interno para apurar o caso. As investigações podem culminar em punições disciplinares que podem chegar à expulsão da instituição, mas até o momento os estudantes envolvidos só foram afastados.

Além das manifestações racistas, os alunos também são acusados de trocar mensagens com cunho homofóbico, apologia ao nazismo e incitação à violência. Entre as figurinhas publicadas estão imagens de pessoas trajadas com roupas da Ku Klux Klan acompanhada pelos dizeres “Preto aqui não”, outra com os dizeres “Se eu ganhasse um real a cada vez que sou racista, provavelmente um preto fdp iria me roubar”, outras com imagens de Hitler e também imagens de bonecos colorizados com a suástica ou com a bandeira dos Estados Confederados agredindo um boneco com as cores do movimento LGBTQIA+.

A manifestação foi organizada pelo Coletivo 4P - Poder Para o Povo Preto. "Sobre a participação da comunidade acadêmica, contamos com a presença ampla dos cursos da área de humanas, exatas, saúde, agrárias e inclusive contamos com a presença de acadêmicos de agronomia manifestando seu repúdio e indignação frente ao caso de racismo, LGBTfobia e referências de cunho nazista, além de alguns alunos do colégio agrícola representando suas questões, demandas e também repúdio. A respeito da aprovação, os acadêmicos que interagiram com o movimento estudantil se demonstraram favoráveis ao movimento, a Universidade não se pronunciou oficialmente até o momento. Em termos de número, para nós a manifestação foi expressiva, esperamos mais pessoas na manifestação de segunda no campus central.", declarou Clara Prado, do curso de Letras da UEPG.

"Nós queremos que a comunidade entenda que esse ciclo de ódio não pode se perpetuar e ser normalizado. Relembramos o caso ocorrido em Piraí do Sul onde crianças negras foram colacadas para interpretar escravos em desfile cívico que é um exemplo de racismo explicito que deve ser tão combatido quanto o racismo praticado nas redes ocorrido lamentavelmente na nossa UEPG."

"Queremos mostrar o que deveria ser óbvio, o quão nocivo, repulsivo, abominável é o racismo, LGBTfobia e referências de cunho nazista, questões estas que tem sido validadas por pessoas em situação de poder. Mostrar nossa indignação, repúdio e desprezo a estes atos que por alguns são defendidos como brincadeiras, como 'só figurinhas' num grupo de integração. Para nós estes atos são tão conscientes quanto criminosos, estes estudantes devem ser responsabilizados e expulsos como já ocorreram em outras instituições minimamente sérias. Pedimos que a Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989 seja atendida", afirmou Prado, em nome do coletivo.

O fato repercutiu também no conselho municipal do município. “Falo em nome do Compir (Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial de Ponta Grossa) e como mulher negra tal não poderia deixar de me manifestar. Meu total repúdio a esse ato criminoso, que não representa a instituição UEPG, mas não podemos nos silenciar, porque o silêncio também é uma violência”, declarou Cris Zelenski.

O presidente do Instituto Sorriso Negro dos Campos Gerais, José Luiz Teixeira, afirmou que pela naturalização do racismo no Brasil, isso não o assusta. “Até porque não são só sete alunos racistas. São muito mais, porque eles são invisíveis. Infelizmente a gente não consegue enxergá-los. Eles nascem, começam a caminhar e se tornam adultos invisíveis e começam a fazer toda manifestação dessa forma. Ficamos sabendo que toda a situação de racismo foi publicizada, e hoje tivemos uma manifestação com o centro acadêmico e com outras agremiações estudantis.”

Ele argumentou que o sigilo que a UEPG operacionalizou na situação não pode ser aceito. “O processo não pode ficar em sigilo e não iremos aceitar isso. Se os alunos fizeram essa autodeclaração de racismo de forma naturalizada e publicizaram as mensagens, porque a UEPG insiste em manter o sigilo em uma situação que precisa ser pública? O sigilo também dói na raça negra e não cicatriza perante o sigilo. Se eles foram capazes de trocar mensagens racistas em uma rede social, devem aguentar isso de uma forma publicizada”, declarou.

Teixeira ressaltou que situações de racismo são cotidianas. “Inclusive, eu, na qualidade de presidente da comissão racial da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), estou oficiando a delegacia de Ponta Grossa para que nos informe quantas denúncias de racismo foram registradas na delegacia e que não foram publicizadas. A gente não sabe o que virou inquérito, para a gente reafirmar que há racismo também em Ponta Grossa”, declarou. Ele reforçou que não sabe a quantidade em que ele acontece no dia a dia. “Há pessoas que sofrem e não publicizam isso. Não falam nem em casa, com vergonha de ter sofrido isso. No Brasil que a gente clama por justiça social e por uma igualdade plural, o racismo, que é tão medíocre, ao mesmo tempo é tão latente”, destacou.

Embora o racismo seja um crime inafiançável, muitos casos semelhantes acabam enquadrados como injúria racial. “Desde 2015, quando o Tribunal de Justiça do Distrito Federal trabalhou a questão do racismo e incorporou a lei 7716, que trata sobre o racismo, eu falo que não pode mais existir racismo qualificado como injúria racial. Delegados, que em muitos momentos são brancos e racistas, não operam a situação como racismo, mas como injúria racial. O inquérito tem que incorporar o racismo. Não dá para a gente aceitar isso nesses casos como injúria racial, porque o sujeito paga a fiança, vai embora e responde em liberdade. Isso não pode ser pago com fiança. O racismo é crime inafiançável”, declarou.

POSICIONAMENTO DA UEPG

Com base na denúncia de racismo em grupos de mensagens de alunos da Universidade Estadual de Ponta Grossa, a instituição informa que determinou o afastamento cautelar de sete acadêmicos.

Em até 30 dias, com o término do inquérito administrativo que apura o caso, os infratores podem sofrer as medidas disciplinares previstas no regimento institucional, que tem como uma das possibilidades de resultado a exclusão dos estudantes do quadro discente da instituição.

A conclusão do inquérito será enviada ao Ministério Público do Paraná, que já investiga o caso desde o mês passado, quando a denúncia foi encaminhada pela Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis da UEPG.

Complementarmente às campanhas já realizadas historicamente pela Universidade, a UEPG intensificará ações de sensibilização sobre direitos humanos junto à comunidade interna.

A UEPG reforçou que é uma instituição inclusiva, que destina 15% do total de suas vagas para cotas raciais e, desde 2018, conta com uma Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis - PRAE, a primeira das Universidades Estaduais do Paraná, na qual a Diretoria de Ações Afirmativas e Diversidade (DAAD-PRAE) atua exclusivamente com temas relacionados ao combate à discriminação. Entre as inúmeras ações, em novembro do ano passado, a Prae participou da Cátedra Unesco de Educação Superior e Povos Indígenas e Afrodescendentes na América Latina, que debateu ‘Universidades Estaduais do Paraná na Luta Contra o Racismo’.

A Universidade Estadual de Ponta Grossa, por meio da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis, informa que o número de estudantes da graduação se apresenta como 1,15% Amarelos, 80,55% brancos(as), 0,4% Indígenas, 13,30% Pardos(as), 3,1% Pretos(as) e 1,57% não autodeclarado. Assim, o percentual de estudantes negros na instituição é de 16,4%. Os dados se baseiam em estudo recente, sobre identidade racial, aplicado para estudantes da graduação.

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