Faz alguns meses, escrevi que o primeiro mandamento do advogado é a concisão. Ser conciso nos dias de hoje é mais do que uma necessidade. É um imperativo de salvação dos náufragos dessa caótica situação em que se encontra o sistema de prestação de serviços judiciários. A prolixidade, dizia eu então e repito agora com maior ênfase, não se coaduna com a celeridade processual. Petições longas exigem tempo e paciência de um magistrado assoberbado com a pletora de autos e papelada. Pilhas e pilhas de processos se amontoam e mofam nas prateleiras, à espera de alguém que os leia e decida.
Mas a brevidade não é mandamento apenas do advogado, senão de todos os que militam no foro. A propósito, lembra-me Piero Calamandrei, quando descreve uma cena deliciosa descortinada perante a Suprema Corte da Itália. Conta ele que, naquela tarde, faria sustentação oral perante a Corte. Percebeu, depois, que os provectos juízes, do alto de suas cadeiras, olhavam para ele com extrema benevolência e simpatia. Nos semblantes extenuados, era possível entrever, num leve sorriso, certo ar de felicidade. As mãos trêmulas pela idade e pela fadiga, quase se estendiam para cumprimentar aquele advogado tão generoso e fazer-lhe um afago. Sim, eu me lembro - disse ele. Foi naquela tarde em que renunciei à palavra...
Não há como negar: os juízes agradecem a brevidade e simplicidade no falar e no escrever.
Mas, no princípio, eram as trevas, a caneta e a máquina de escrever. E, depois...o homem criou o divino computador! Com um toque de mágica, a tecla aciona um mecanismo fabuloso que opera o milagre de transportar-nos para o mundo maravilhoso da cibernética, um admirável mundo novo cujas fronteiras não têm limites e onde podemos saciar nossa sede de onipotência. Estupendo! Com um simples comando, posso trazer para minha sala as grandes obras da humanidade no campo das ciências, letras e artes. Posso intrometer-me no Louvre e trazer Rembrant, Da Vinci e Delacroix para minha casa; posso bisbilhotar a biblioteca do Vaticano e dar uma revoada fantástica por um passado remoto, em alguns minutos. Tenho à mão um acervo imenso de textos doutrinários e de julgados dos tribunais; tenho ali à minha frente códigos e leis esparsas. Posso obter, com o toque de uma varinha (teclinha!) de condão, instantaneamente, o extrato de minha conta bancária.
Juízes, promotores de Justiça e advogados podem agora, em questão de minutos, transferir para o papel (Valha-me Deus!), automaticamente, grande número de julgados e longos trechos de doutrina, que anteriormente já serviram para rechear outros alentados petitórios intermináaaaaaveis...
E viva a modernidade! Viva a tecnologia avançada! Viva a Internet!
Desgraçadamente, porém, a prolixidade, por culpa exclusiva das facilidades oferecidas pelo prodigioso computador, vem contaminando os operadores do Direito, que, agora, querem mostrar que também são capazes de proferir sentenças e elaborar pareceres e petições de fôlego. E que fôlego!
Contou-me um colega que, recentemente, uma sentença de 21 laudas de citações do juiz não conseguiu encontrar a conclusão. Esquecera-se o magistrado de dizer qual das partes tinha razão...
Em algumas ocasiões, o juiz tem indeferido pedidos que as partes nem sequer fizeram. Em outras, costura uma colcha de retalhos... ‘‘Esta sentença não é deste processo’’ queixava-se uma advogada. ‘‘Meu navio nem era proveniente de Gênova, mas de Atenas!’’
Soube de outro caso em que o advogado apelou de sentença favorável a ele, por engano... do computador!
Colegas magistrados! Colegas promotores! Colegas advogados! Eu lhes suplico humildemente! Contenham seu ímpeto de rechear suas sentenças, seus pareceres, suas petições! Pode ser contraproducente. E fatalmente o será, pois o tempo é curto. Ponham a mão na consciência e lembrem-se de que alguém terá de ler, depois, essas numerosas páginas, ainda que repositório, eu sei, eu sei, da mais alta cultura jurídica e vernácula...
A propósito, o essencial, tal como a preciosa pérola, cabe em pequenas conchas.
* Albino de Brito Freire é juiz de Direito em Curitiba