"O delegado, do escrivão ou do investigador não são treinados para cuidar de presos. É fuga em cima de fuga", diz vice-presidente da Adepol, Daniel Prestes Fagundes
"O delegado, do escrivão ou do investigador não são treinados para cuidar de presos. É fuga em cima de fuga", diz vice-presidente da Adepol, Daniel Prestes Fagundes | Foto: Rei Santos/4.9.2015



Em 2017, mais de mil presos fugiram das carceragens de delegacias do Paraná, o que corresponde a quase três fugas por dia. O último balanço divulgado pela Adepol-PR (Associação dos Delegados de Polícia do Estado do Paraná), no início da semana, era de 1.011 fugas, mas o número não para de subir. Somente nesta quarta-feira (27), 22 fugas foram registradas. Na madrugada, 12 detentos fugiram da Cadeia Pública de Cambé, na Região Metropolitana de Londrina. Durante a tarde, outra ocorrência foi registrada na Delegacia de Ibaiti (Norte Pioneiro). Dez presos escaparam por um buraco aberto em um muro da unidade.

Com prédios antigos, mal conservados e que não foram projetados para receber presos, a Sesp (Secretaria Estadual de Segurança Pública e Administração Penitenciária) enfrenta uma das piores situações carcerárias do País. O Estado abriga hoje 9,7 mil custodiados em cerca de 400 delegacias que têm espaço para apenas 4,4 mil vagas, um deficit de 5,3 mil vagas. Para a Adepol, a situação é calamitosa. A entidade chegou a acionar a Comissão Interamericana de Direitos Humanos para tentar encontrar uma solução para o problema.

"Nosso objetivo é levar aos comissionados um estudo completo sobre a situação carcerária do Estado do Paraná, mostrando ao órgão internacional os absurdos e as graves violações de direitos humanos que ocorrem em decorrência da custódia ilegal de presos em Delegacias de Polícia do Paraná", explicou o diretor jurídico da Adepol, Pedro Filipe de Andrade.

"Estamos travando essa luta com a administração penitenciária desde que iniciamos nossa gestão na Adepol em 2015. Entendemos que já esgotamos as tratativas com todos órgãos e entidades de direito interno; infelizmente houve pouco avanço ao longo desses quase três anos, o que nos faz agora recorrer a organismos internacionais. O que não podemos e não vamos aceitar é que o Estado do Paraná não tenha competência e vontade política para resolver essa questão", ressaltou o presidente João Ricardo Képes Noronha.

O vice-presidente da Adepol, Daniel Prestes Fagundes, destacou os impactos que a guarda de presos causa à Polícia Civil. "Quem pisa em uma delegacia sabe que o serviço não é bom. Isso não é culpa do delegado, do escrivão ou do investigador. Os servidores estão sob estado de estresse permanente. Eles não são treinados para cuidar de presos. É fuga em cima de fuga", desabafou. Segundo ele, as fugas causam retrabalho para a polícia e retira os policiais civis da função de investigar.

OUTRO LADO
A Sesp, a direção da Polícia Civil e o Depen (Departamento Penitenciário) informaram que estão cientes do problema de superlotação nas carceragens das delegacias do Estado. Mais uma vez, a Sesp lembrou que no início de 2011, cerca de 14 mil presos estavam sob a custódia da Polícia Civil. Segundo o órgão, sete anos depois, a população carcerária foi reduzida para cerca de 9,5 mil presos, uma diminuição de 32%.

A Secretaria também expôs que a cúpula da segurança pública tem trabalhado para zerar o número de presos em delegacias. De acordo com a nota, semanalmente, o Cotransp (Comitê de Transferência de Presos), que conta com representantes do Poder Judiciário e do Ministério Público, autoriza a transferência de presos de delegacias para o sistema prisional.

Por fim, a nota cita que, segundo a Sesp, "a solução para o caso de superlotação são as obras de construção e ampliação de 14 unidades prisionais, que resultarão na abertura de cerca de 7 mil novas vagas. Uma delas é a Casa de Custódia de Londrina, que terá capacidade para abrigar 752 presos". As obras, no entanto, seguem em ritmo lento.

Presos fazem motim em Cambé

Após a fuga de 12 presos da Cadeia Pública de Cambé, na madrugada desta quarta-feira (27), presos que não conseguiram escapar provocaram um incêndio em uma das galerias. Quatro detentos precisaram ser internados em razão das queimaduras e inalação da fumaça.

De acordo com a Polícia Civil, a fuga ocorreu por volta de 0h20, quando os presos quebraram a laje e fugiram pelo muro. Por volta das 2 horas, os outros internos que não conseguiram fugir iniciaram uma rebelião, incendiando duas das quatro galerias. "Só não houve morte pela ação rápida do agente carcerário e pelo auxílio do pelotão de Choque da Polícia Militar, que já dava apoio por causa das fugas", afirmou o delegado Roberto Fernandes de Lima.

Segundo ele, antes da fuga, a cadeia, que tem capacidade para 52 detentos, abrigava 193 em quatro alas. "Mas, destes 193, 170 ficam na ala principal, onde só caberiam 32", informou. No incêndio, duas galerias foram danificadas e uma terá de ficar interditada até a reforma. Dos quatro detentos feridos pelo fogo, dois estão na ala de queimados do Hospital Universitário de Londrina em estado grave. De acordo com o hospital, eles estavam inconscientes e respiravam por aparelhos na tarde desta quarta.

Os outros dois detentos foram levados para a Santa Casa de Cambé, mas com ferimentos leves. O agente carcerário e o policial civil que inalaram fumaça não corriam perigo de morte. O delegado Roberto de Lima afirmou que, com uma ala interditada, será necessário transferir de 90 a 100 detentos com urgência, o que foi solicitado à VEP (Vara de Execuções Penais). Ainda de acordo com ele, dos 193 presos, 103 já tinham condenação. Dos presos que fugiram, oito permaneciam foragidos até o início da noite.

IBAITI
Dezesseis detentos escaparam da Cadeia Pública de Ibaiti (Norte Pioneiro) por volta das 15h desta quarta-feira (27). Os presos aproveitaram o período de visita, abriram um buraco na parede do solário e ganharam a rua Antônio Moura Bueno, no centro da cidade, onde está situada a unidade carcerária. A cadeia de Ibaiti comporta apenas 20 pessoas, mas, no momento da fuga, somava 131 presos. De acordo com a PM (Polícia Militar), seis dos 16 fugitivos haviam sido recapturados até o final da tarde.