A advogada Yasmin Christine Ideriha, 33, mãe do pequeno Antônio, lembra que não passou por uma gestação muito tranquila. Tendo uma gravidez considerada de risco, ela precisou ficar muitos meses em repouso e até encarou, no oitavo mês, uma ameaça de parto prematuro. Essa caminhada a levou a procurar uma humanização maior durante o momento do parto, justamente para ter a melhor experiência possível.

O momento de dar à luz fica gravado na memória, e que não deve ser marcado por situações negativas
O momento de dar à luz fica gravado na memória, e que não deve ser marcado por situações negativas | Foto: iStock

O primeiro passo foi se informar sobre a atuação das doulas e encontrar uma profissional para acompanhá-la. Depois disso, optou pelo parto normal e “mais natural possível”, sem intervenções e analgesia, para aproveitar ao máximo a experiência.

“A doula veio até a minha casa e ficamos das 2h até 5h, que foi quando decidimos ir para a maternidade. Nesse tempo que ela ficou aqui comigo, passou óleo essencial, fez massagem, me acalmou”, conta a mãe. “Eu pude ter isso em casa, em um ambiente calmo, ao lado da minha mãe, em um ambiente totalmente acolhedor.”

Quando chegou na maternidade, no dia 17 de dezembro de 2022, recebeu o mesmo tratamento humanizado e diz que não sofreu “nenhum rastro de violência obstétrica”. “Foi muito acolhedor o ambiente, muito respeitoso. Inclusive, tinha passado o horário de plantão da médica e ela não trocou, para eu não perder aquele ritmo de confiança.”

A experiência positiva de Yasmin pode ser descrita como um parto humanizado, aquele em que as escolhas e decisões da mulher são colocadas em primeiro lugar. Diferente do que muita gente pensa, a humanização não é sinônimo de um parto feito em casa e sem assistência.

“O parto humanizado é aquele que coloca a mulher, a gestante, como protagonista em um momento que é muito importante para ela. É aquele parto que a gente vai respeitar as escolhas e compartilhar as decisões”, explica a ginecologista obstetra e coordenadora médica da Maternidade Municipal Lucilla Ballalai, Pollyanna Anderson Alves.

A profissional também esclarece que isso não está relacionado ao parto ser normal ou cesárea. “Nem todo parto normal é humanizado e nem toda cesária não é humanizada.”

É por isso que a humanização do parto possui três pilares, segundo a médica: o protagonismo da mulher, o respeito aos aspectos sociais, culturais e emocionais da gestante, e a fundamentação em evidências científicas. No Brasil, uma das ações visando esse trabalho foi a criação do Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento, em 2000.

Segundo Alves, a presença de doulas tem auxiliado na maternidade, justamente porque essa profissional tem um vínculo mais estreito com a mulher, e a ajuda a compreender o momento de dar à luz.

“A gestante que leva a doula, é a gestante que entendeu o que é o parto. Não só o normal, mas a doula entra na cesariana também. Tem esse apoio emocional”, diz.

A doula que acompanhou Yasmin é Isabela Garrido. Ela diz que cabe a essa profissional dar amparo informacional e emocional para a mulher durante toda a gestação. É uma preparação para que a gestante esteja preparada para viver isso da melhor maneira possível.

“Eu costumo dizer que a doula é a primeira profissional a chegar e a última a sair, porque, de fato, desde o início do processo a doula já está ali com a gestante e ela só sai depois do pós-parto imediato. Eu só saio quando está todo mundo bem”, conta Garrido. “Um parto humanizado contempla o acesso à informação, essa mulher decidindo, e essa mulher tendo seus desejos respeitados.”

De acordo com Garrido, a doula possui diferentes papéis ao longo da gravidez. Inicialmente, compartilha informações e auxilia na tomada de decisões, como a elaboração do Plano de Parto. Também, atua no alívio da dor com métodos não farmacológicos, contribui com posicionamentos, exercícios, técnicas de respiração, massagens etc. E apoia a golden hour (hora dourada, em português), termo que se refere à primeira hora de vida do bebê, em que é feito o contato pele a pele com a mãe e o aleitamento.

“Nosso papel enquanto doula em momento nenhum substitui a enfermeira ou o médico. Muito pelo contrário. Nós somos uma pessoa a mais na equipe, e somos a pessoa que está o tempo todo com a gestante, cuidando”, esclarece.

“Todos os dias eu acordo e vejo que meu filho está ali com saúde, que está bem, é um alívio muito grande”, diz Rita Barros
“Todos os dias eu acordo e vejo que meu filho está ali com saúde, que está bem, é um alívio muito grande”, diz Rita Barros | Foto: Arquivo Pessoal

Outra mãe atendida pela doula é a professora Rita de Cássia Clemente de Barros, 27, que deu à luz ao seu primeiro filho, Theo, no dia 19 de abril deste ano. Ela conta que foi para a maternidade apreensiva, mas que foi bem atendida pela equipe de plantão.

“Eles super respeitaram minhas decisões, meus momentos. Tudo que eu solicitei foi concedido. Tive um ótimo apoio lá, tanto físico quanto emocional”, lembra a professora, que teve um parto normal na Maternidade Municipal.

Mãe de primeira viagem, Barros diz que esse último mês tem sido um período de descobertas. E que a experiência humanizada impactou positivamente o seu puerpério, que é o período após o parto.

“O Theo está descobrindo o mundo aqui fora e eu estou descobrindo como ser mãe. Cada dia é uma novidade. Todos os dias eu acordo e vejo que meu filho está ali com saúde, que está bem, é um alívio muito grande”, diz emocionada.

IMPORTÂNCIA

A médica Pollyanna Alves explica que a Maternidade de Londrina realiza, em média, 300 partos por mês, mas os números são sazonais. Em abril, considerando todos os atendimentos, o que inclui consultas com psicóloga e enfermeira, passaram cerca de 900 pacientes.

No seu ponto de vista, a humanização do parto é uma questão estabelecida e é importante que a mulher tenha todas as informações. Nesse ponto, entra o trabalho das doulas.

“Todo mundo que entrar, vamos fazer um parto humanizado. Mas é lógico que é personalizado. Por exemplo, a paciente tem um social, um emocional totalmente diferente, tem o que ela prefere ou não prefere - às vezes a posição do parto, com luz acesa ou apagada, com incenso, com música”, relata.

Isso é importante, acrescenta a doula Garrido, porque a experiência de dar à luz é definitiva para muitas mulheres. É um momento que fica gravado na memória, e que não deve ser marcado por situações negativas.

“Uma mulher que é violentada ou não assistida, negligenciada no momento do parto, isso vai reverberar muitas vezes para a vida toda. Se você sentar conversar com uma mulher sobre o dia do parto, ela vai te contar detalhes, porque é um dia que marca para sempre”, afirma Garrido.

“Esse parto humanizado acaba diminuindo a ansiedade e o estresse. Quando ela está no controle, quando ela decide, ela tem mais confiança e isso torna uma relação melhor com a equipe e torna o momento melhor para ela”, completa Alves.

HUMANIZAÇÃO

A designer Maira Rodrigues Cardoso, 33, lembra como se fosse hoje do dia em que entrou em trabalho de parto - que, inclusive, foi muito rápido. Ela, que reside em Arapongas, tinha receio com o deslocamento até Londrina e não conseguir chegar no Hospital Evangélico a tempo. Mas tudo deu certo e seu filho Thomas nasceu no dia 18 de fevereiro.

“O que fez toda a diferença foi saber exatamente o que estava acontecendo, entender em que fase eu estava, porque foi muito rápido”, conta Maira Cardoso
“O que fez toda a diferença foi saber exatamente o que estava acontecendo, entender em que fase eu estava, porque foi muito rápido”, conta Maira Cardoso | Foto: Arquivo Pessoal

Era um sábado de Carnaval e seu trabalho de parto durou cerca de duas horas; no hospital em si ela ficou apenas 40 minutos. “O parto foi no Evangélico, e aconteceu na sala de observação, não deu tempo nem de a gente ir na sala de parto”, conta. “A Isa [Garrido, doula que a atendeu] falou para o meu marido chamar a enfermeira e, quando ela chegou, já tinha nascido. Foi uma loucura mesmo.”

A humanização, para Cardoso, teve importância maior no período de gestação, já que ela conseguiu se preparar e se conhecer. Na sua primeira gravidez, há 15 anos, a designer fez uma cesária, mas a possibilidade de um parto normal nem foi discutida.

“Quinze anos atrás era tudo muito diferente. Agora eu tinha em mente que, se fosse ter outro filho, eu ia procurar profissionais para ter a experiência de outra forma”, destacando, também, que conseguiu se preparar melhor para esse momento.

“O que fez toda a diferença foi saber exatamente o que estava acontecendo, entender em que fase eu estava, porque foi muito rápido. Ninguém achou que o bebê estava nascendo. Foi uma questão de eu saber.”

Outra diferença percebida pela designer foi o respeito ao direito à golden hour. “Logo que o Thomas nasceu, os profissionais chegaram e eu pude ficar com ele, diferente do meu primeiro parto em que o bebê nasceu e já foi tirado. Eu tive a oportunidade de amamentar, meu marido cortou o cordão [umbilical]”, afirma.