Koehler quer países em desenvolvimento nas decisões Do correspondente Paulo Sotero
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domingo, 26 de março de 2000
New Orleans, 27 (AE) - Para Horst Koehler, o novo diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), o aumento da participação dos países em desenvolvimento nas decisões sobre a economia internacional e nos frutos da expansão global não é uma proposta teórica, mas uma questão prática que envolve a própria preservação do bem-estar nas nações mais prósperas.
"No longo prazo, não há nenhuma perspectiva de um bom futuro nos países ricos se não houver também uma boa perspectiva nos países pobres", disse Koehler à Agência Estado, em sua primeira entrevista depois de sua eleição, na semana passada, para o comando do FMI.
A própria decisão de Koehler de escolher um jornal brasileiro para dar sua entrevista inaugural foi motivada por esse cálculo. "Queria dar um sinal ao mundo em desenvolvimento de quanto eu o levo realmente a sério."
Um economista alemão de 57 anos que trabalhou na reunificação de seu país como vice-ministro das Finanças do governo de Helmut Kohl, Koehler nasceu na Polônia ocupada pelo exército nazista durante a Segunda Guerra e viveu até os dez anos na parte oriental da Alemanha, sob ocupação soviética.
Ele falou à AE por telefone de Londres, onde preside, desde 1998, o Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento (BERD), criado na década passada para ajudar a Rússia e os países do antigo bloco soviético na transição do regime de planejamento central para a economia de mercado.
Dois anos atrás, ele disse que sua história pessoal lhe deu "um sentimento pessoal de responsabilidade de que não devemos permitir que aconteçam novamente coisas como a guerra".
É esse sentimento, combinado a suas experiências no governo da Alemanha, no BERD e cinco anos na presidência da Associação de Bancos de Poupança da Alemanha, que ele traz agora ao FMI.
"Não se constrói uma economia de mercado em dez anos", disse ele, tempos atrás. Mas Koehler admite que "a paciência não é um dos meus fortes" e diz costumar estabelecer objetivos ambiciosos e cobrar sua execução.
Ele chegou ao comando do FMI depois de um processo de seleção que alimentou uma grave crise diplomática entre a Europa e os Estados Unidos, excluiu os países em desenvolvimento e deu munição nova aos que acusam a instituição de impor soluções dos ricos aos pobres e agravar as situações que se propõe a remediar.
O novo diretor-gerente, que já criticara publicamente o processo que levou à sua escolha, afirmou que, assim como prega reformas a outros, o FMI deve também estar aberto a reformar-se. Ele disse ainda que, antes de criticar as nações em desenvolvimento, "os países ricos que estão atrasados nas reformas devem perguntar-se o que eles próprios estão fazendo para promover a prosperidade sustentada para as nações".
Koehler indicou também querer analisar as mudanças que o FMI já iniciou e pretende examinar todas propostas de reforma que estão sobre a mesa, bem como as que pretende recolher pessoalmente em viagens que fará à América Latina, áfrica e ásia
antes de se pronunciar sobre o caminho a seguir. Mas rejeitou taxativamente as propostas mais radicais, como a de uma comissão de economistas formada pelo Congresso dos Estados Unidos sob a presidência de Allan Meltzer, da Universidade Carnagie Mellon, como "incorretas".
Ele disse também que pretende incluir as organizações não governamentais na discussão, mas de uma maneira que não enfraqueça as instituições democráticas. Numa referência indireta aos Estados Unidos, ele lamentou a tendência dos políticos de, "usar as ONGs como parte das controvérsias do jogo democrático, particularmente durante as campanhas eleitorais".
Pediu, também, que os ministros das Finanças defendam publicamente as políticas que seus representantes apoiarem na diretoria-executiva do Fundo em lugar de se distanciarem das decisões do FMI quando elas se tornam alvos de críticas.
Koehler defendeu uma redistribuição das cotas do FMI para melhor refletir o aumento do peso relativo dos países em desenvolvimento, sobretudo da ásia, no PIB mundial.
Seu interesse por um maior reconhecimento e envolvimento das nações em desenvolvimento nos processos decisórios da estratégia econômica global que lhes afeta não significa, no entanto, que o novo dirigente do FMI será menos insistente do que seu predecessor, o francês Michel Camdessus, sobre a necessidade de esses países executarem políticas econômicas austeras e reformas estruturais.
Pelo contrário, falando sobre os problemas de corrupção e má administração de empresas e do Estado, que travam o crescimento na América Latina, ele afirmou que é preciso aprofundar o debate sobre a globalização. Em lugar de se falar apenas dos atores globais, "é preciso dar às pessoas uma percepção mais clara do que elas precisam fazer no seu ambiente local para ajudar a si próprias", disse.
A desigualdade no acesso à riqueza e à propriedade é, claramente, o problema que mais chama a atenção no novo dirigente do FMI na América Latina. Nesse sentido, ele representará uma continuidade em relação a Camdessus. Mas Koehler indicou que diverge de seu antecessor e tende para uma posição mais próxima da que o governo brasileiro defende sobre o envolvimento do FMI no desenho de políticas sociais.