Dois incêndios ocorridos em pouco mais de uma semana em terreiros de umbanda de Curitiba são investigados pela polícia. Na madrugada da última quinta-feira (1º), o Terreiro das Marias, no bairro Santa Quitéria, foi destruído pelas chamas. A origem do incêndio ainda não é conhecida, mas o caso já é investigado pela DHPP (Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa) da PCPR (Polícia Civil), que possui um setor especializado na investigação de crimes de ódio. O laudo pericial da Polícia Científica deve esclarecer se o incêndio foi criminoso. Testemunhas devem ser ouvidas na semana que vem.

Barracão do Terreiro das Marias foi consumido pelo fogo
Barracão do Terreiro das Marias foi consumido pelo fogo | Foto: Divulgação/Página do Terreiro das Marias no Facebook

Já o incidente no Templo Império da Rainha, no Portão, no dia 24 de julho, foi registrado por câmeras de segurança. O vídeo mostra dois homens espalhando um líquido inflamável e ateando fogo em uma construção ao lado do terreiro. As chamas foram apagadas por um dos responsáveis pelo local antes de causarem maiores danos. O caso é apurado por outro distrito policial, mas também é acompanhado pela delegacia especializada, segundo informações da PCPR.

INTOLERÂNCIA RELIGIOSA

Cláudia Gonzales, dirigente do Terreiro das Marias, diz que a hipótese de ataque é a principal suspeita no centro religioso, embora a polícia ainda não tenha concluído a investigação. Segundo a mãe de santo, as instalações elétricas do local eram novas e haviam sido refeitas por um eletricista profissional. Também haveria indícios de que o fogo começou em um terreno vazio ao lado do terreiro.

A suspeita é reforçada pelo aumento dos casos de intolerância em todo o país nos últimos anos. Um balanço divulgado em junho pelo MMFDH (Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos) informou que houve 506 denúncias de discriminação religiosa ao Disque 100 (direitos humanos) em 2018 — a maioria contra adeptos da umbanda (72), do candomblé (47) e "matrizes africanas" (28). Em 2011, foram 15 relatos. O número chegou a 759 em 2016.

“Há pessoas e outras igrejas que não conseguem aceitar nossa religião”, conta a mãe de santo — que relata um histórico de provocações e intimidações ao seu terreiro, incluindo disparos de rojões e intervenções de vizinhos ameaçando chamar a polícia. “Não passaram disso, mas quando acontece algo como o que aconteceu aqui, a gente fica pensando se chegariam a esse ponto”, disse.

O Terreiro das Marias lançou uma vaquinha on-line para arrecadar recursos para a sua reconstrução. Ainda não se sabe se houve dano estrutural causado pelo incêndio.

O babalorixá Moacir do Bará, marido da dirigente do Templo Império da Rainha, criou a Federação dos Cultos Afros de Umbanda e Candomblé do Brasil e conta que tem ouvido cada vez mais relatos de intolerância feitos por filiados. Os casos vão desde a discriminação de filhos de adeptos de religiões de matriz africana na escola até apedrejamentos. “Infelizmente está aumentando”, disse. “Muitos estão se recolhendo, mas temos que botar a boca no trombone para acabar com isso.”