Imagem ilustrativa da imagem HU pagava duas vezes por serviços terceirizados, aponta Polícia Civil
| Foto: Saulo Ohara/Folha de Londrina



Os desvios de recursos de cerca de R$ 1,1 milhão do Hospital Universitário, identificados pela Polícia Civil na Operação Espelho Falso, eram feitos utilizando pagamentos em duplicidade para empresas que forneciam médicos terceirizados para a instituição e contavam com a participação de Lucélia Pires Ferreira, que era secretária da Diretoria Clínica do hospital e morreu no mesmo dia em que daria esclarecimentos sobre o esquema. A operação foi deflagrada nesta terça-feira (12), com o cumprimento de oito mandados judiciais de busca e apreensão domiciliar e cinco de sequestro de bens.

Segundo o delegado Tiago Vicentini, as investigações indicam que o esquema perdurou de 2016 até o primeiro semestre de 2018 e foi escancarado quando o TCE (Tribunal de Contas do Estado) do Paraná pediu esclarecimentos sobre pagamentos em duplicidade feitos em nome de médicos. Uma reunião foi marcada pela diretoria do hospital para que Lucélia, que centralizava em si as ordens de pagamentos para as empresas terceirizadas, desse esclarecimentos sobre o ocorrido. "Ela faleceu no dia da reunião, sob circunstâncias suspeitas. No começo das diligências [para investigar a morte], foi identificado indício sumário de que ela poderia estar incorrendo, junto com outras pessoas, em crimes contra a administração", diz Vicentini.

Lucélia, que secretariava os contratos, fazia cópias do registro ponto (espelho) dos médicos terceirizados que efetivamente trabalharam por uma determinada empresa e entregava o documento falsificado para outra empresa, que recebia por ela. A investigação indica que ela também montava os espelhos em nome de médicos sem vínculos com o hospital e juntava para pagamentos das empresas investigadas e notas emitidas sem justificativas, em valores que eram pagos e deveriam ser estornados, mas não eram.

Segundo o delegado, o esquema começou com a empresa em nome do genro de Lucélia – a reportagem tentou identificar a empresa, mas não encontrou registro dela na internet. Como o genro não é médico, uma profissional assinava como responsável técnica. "As notas eram praticamente sequenciais, demonstrando que o HU era a sua única cliente", diz Vicentini.

Quando este contrato perdeu a eficácia, uma nova empresa, no nome desta médica, foi criada e passou a prestar o mesmo serviço. Segundo o delegado, o modus operandi com esta segunda empresa permaneceu o mesmo. Uma terceira empresa contratada para prestar serviços médicos de anestesia para o HU emitiu pagamentos por serviços teoricamente prestados tanto pelo genro de Lucélia quanto pela médica envolvida – o genro, entretanto, era graduando em medicina veterinária.

Oito pessoas foram indiciadas pela Polícia Civil por prática de peculato, falsificação de documento público, organização criminosa, fraude em licitação e lavagem de dinheiro. Outras duas ex-diretoras do HU terão o sigilo bancário quebrados, diz o delegado.

Suspeita de envolvimentos

Vicentini afirma que a investigação não indicou o envolvimento de outros servidores do HU. "As provas indicam que a Lucélia era a única pessoa que tinha domínio dos fatos e, sem ela, a subtração de verbas seria praticamente impossível", afirma. Para ele, o hospital é vítima "de uma desorganização" e as apurações não chegariam neste nível se não houvesse apoio de auditoria técnica fornecida pela UEL.

Por outro lado, a Polícia Civil ainda vai apurar se houve omissão da gestão anterior. "Por mais que não haja indício de que os gestores estivessem mancomunados com os investigados, eles tinham, o dever de fiscalizar. Se confirmado que houve omissão, eles devem responder por isso", afirma.

Morte da servidora

Enquanto a Polícia Civil em Londrina apura o esquema fraudulento, a Delegacia de Bela Vista do Paraíso levanta as causas da morte de Lucélia, ocorrida no dia em que daria esclarecimentos à instituição. Segundo Vicentini, os indícios são de que ela teria provocado a própria morte, já que não foram encontrados indícios de agressões, mas o laudo indicou "causa indeterminada" e o inquérito ainda não está concluído.

Posicionamento da UEL

A UEL enviou, no fim da manhã, uma nota à imprensa a respeito do assunto. Confira o texto na íntegra:

Nota sobre possível fraude no HU/UEL

Em 2 de outubro de 2018, a Universidade Estadual de Londrina (UEL) recebeu ofício do Tribunal de Contas do Estado (TCE) indicando irregularidade administrativa, servidores médicos do Hospital Universitário (HU/UEL) prestavam serviços vinculados a empresas terceirizadas. A superintendência do HU/UEL convocou a Diretora Clínica e a Secretária Executiva da Diretoria Clínica, a qual tinha por atribuição coordenar as atividades de contratos das empresas prestadoras de serviços médicos, para prestar informações sobre os indícios. Tal contato não se efetivou pelo óbito da secretária executiva.

A Direção do HU ampliou as ações administrativas na busca de avaliar as atividades relacionadas aos procedimentos de contratação e controle dos prestadores de serviços. Além da irregularidade administrativa apontada pelo TCE, a Diretoria do HU observou suspeita de fraude e deu ciência dos fatos à Reitoria e à Assessoria de Auditoria Interna, solicitando apoio administrativo no levantamento das informações necessárias para a análise da suspeita. Implantou, também, o Setor de Controle de Prestadores de Serviços centralizado na Divisão de Recursos Humanos.

As empresas e os contratados citados pelo TCE foram notificados a apresentarem documentos para subsidiar a análise da irregularidade administrativa. A partir destes novos fatos, ocorreu a suspensão de Contratos e Atas de Registro de Preços.

A Reitoria instituiu Comissão de Sindicância para averiguação preliminar das irregularidades. Os trabalhos realizados indicaram abertura de Procedimentos Administrativos Disciplinares para apuração e responsabilizações administrativas. Tudo o que foi apontado pela comissão sindicante foi oficiado ao Ministério Público Estadual e ao TCE-PR.

A Auditoria Interna elaborou relatório referente a Serviços Médicos Terceirizados do HU e o encaminhou à Direção do HU, à Reitoria da UEL e à Divisão de Combate à Corrupção da Polícia Civil do Paraná dando-se início a um trabalho conjunto de investigação. A Reitoria deu ciência, também, ao TCE-PR e Ministério Público do Estado.

Desde o surgimento destes indícios de irregularidades, a UEL vem envidando esforços internos e com outras instituições já mencionadas para elucidar o caso, visando a proteção do interesse público e manutenção dos serviços públicos de qualidade para a sociedade.

Reitoria.