A curitibana Kelly Simões tem desempenhado a missão de ajudar na intermediação, planejamento e logística para trazer filhos de brasileiros em segurança de clínica de fertilização ucraniana. Ela, que realizou o procedimento de ter suas duas filhas pelo procedimento de barriga de aluguel na Ucrânia, nunca imaginou que nos dias atuais estaria envolvida nos bastidores da guerra entre Rússia e Ucrânia. Kelly e o marido tiveram suas duas filhas, Maria Victória e Helena, com ajuda de barriga de aluguel na clínica Biotexcom, na Ucrânia. O procedimento é legalizado naquele país, enquanto no Brasil só é possível ter barriga de aluguel com parentes próximos.

Kelly teve suas duas filhas, Maria Victória e Helena, com ajuda de barriga de aluguel em clínica ucraniana
Kelly teve suas duas filhas, Maria Victória e Helena, com ajuda de barriga de aluguel em clínica ucraniana | Foto: Vivi Schon/Divulgação

“Há quatro anos eu fiz dois programas de barriga de aluguel na Ucrânia. Eu tive duas filhas lá e o meu relacionamento com a clínica começou em 2018. Nessa última vez, fui buscar minha última filha, que nasceu em 2021, e me tornei uma representante da clínica para estar auxiliando todos os casais nesse processo”, declarou Simões.

Simões revelou que, desde que a guerra começou, ficou diretamente ligada com as mães que estão grávidas e as que já assinaram o contrato e estão na expectativa pelo procedimento, que envolve transferência dos materiais (óvulos e espermatozóides) e FIV (Fertilização in Vitro) nas mães de aluguel. “Meu foco é nos casais grávidos que estão buscando os bebês. O nosso trabalho é arrumar toda logística de como os pais devem buscar os bebês, onde vai ser entregue, que dia o casal deve viajar, entre outros detalhes. Todo plano traçado até o momento está funcionando”, informou.

“Quando aconteceu a guerra, foi muito rápido, e ficamos sem ter um suporte da clínica. Como eu tenho um contato direto com ela e já tinha experiência de ter passado por esse processo, eu acabei criando esse grupo dos casais que contrataram as barrigas de aluguel. Eu acabei tentando dar um suporte, inclusive emocional, para esses casais. No primeiro fim de semana da guerra, um casal aqui do Brasil me mandou uma mensagem pedindo ajuda. A clínica não divulga os contatos das barrigas de aluguel e quando estourou a guerra, por intermédio de outros casais que fizeram o procedimento no passado, nós conseguimos encontrar a maioria das gestantes, mesmo que a clínica não goste de divulgar.” As gestantes chegaram a ser atendidas em bunkers e, quando necessário, recebiam atendimento na clínica.

Simões já ajudou até o momento cinco casais que já ganharam o bebê e já estão no Brasil. “Agora, em maio, não vai nascer nenhum bebê de brasileiros, mas em junho e julho tem mais dois casais brasileiros que vão para lá para resgatar os bebês”, destacou. Ainda há mais dez casais que já assinaram contrato com a clínica e que esperam a retomada dos processos das barrigas de aluguel. “A clínica já disse que já vai retomar o serviço.”

"DEU TUDO CERTO"

Uma das mães que teve seu filho resgatado foi Priscila Rodrigues Bogucki, mãe de João Levi. “Antes de eu começar isso, eu estava em processo de fertilização in vitro. Fiz quatro tentativas em São Paulo, sem sucesso, quando vi uma reportagem sobre barriga de aluguel na Ucrânia. Eu me interessei e entrei em contato com um casal que me passou ‘o caminho das pedras’. Fui em março do ano passado para lá e nem imaginava que poderia estourar uma guerra entre a Rússia e a Ucrânia. Se soubesse não teria feito lá, porque é um risco muito grande que corremos. Poderia ter dado tudo errado, mas graças a Deus deu tudo certo. Em março, fomos para lá para coletar o material genético e em quatro ou cinco meses já deu positivo, na primeira tentativa. Nós não esperávamos que seria rápido e até tomamos um susto, pois no ano passado ainda estava na pandemia, as fronteiras ainda estavam fechadas.”

Bogucki se recorda do sentimento que teve quando a guerra estourou. “Se eu fechar meus olhos, me lembro da hora que acordei com o meu telefone, com aquele monte de mensagem sobre a guerra. Eu estava sozinha em casa e foi um desespero total de toda a família”, declarou.

A previsão do nascimento seria para o dia 24 de março, mas o bebê nasceu no dia 19. “A embaixada foi orientando a gente qual seria o melhor caminho, porque não não tinha voo para Kiev, não tinha como entrar lá.”

Bogucki precisou ir para Viena, na Áustria, e de lá pegou o trem para uma estação da Polônia, próxima da fronteira com a Ucrânia. “Era a estação em que estavam chegando os refugiados. Tivemos que pegar um outro trem lá e foi complicado, porque as pessoas lá não falavam inglês, mas a embaixada estava em contato com a gente o tempo todo. Conseguimos pegar o trem. Duas pessoas da embaixada foram levar a gente para o hotel. Como tinha toque de recolher, não tinha como a gente andar pela cidade por nenhum transporte. Só com essas pessoas autorizadas chegamos lá.”

Um casal foi contratado pela clínica para levar o bebê para Lviv e como outros casais já tinham passado por isso, Bogucki decidiu confiar a receber seu filho lá, em vez de se arriscar ir para Kiev. Ao chegar na cidade, Bogucki viu tudo funcionando, mas toda hora soava o alarme da cidade e todos tinha que correr para se proteger.

Ela diz que, olhando para trás, valeu a pena. “Faria tudo de novo. Não me arrependo de nada. Às vezes, até penso por que eu não fiz isso antes. Parecia que eu nunca seria mãe. O nosso destino era ter ido para lá mesmo, porque o nosso processo aconteceu de primeira. Foi tudo muito rápido. É nosso primeiro filho, e agora é só curtir. Estou torcendo pelas minhas amigas do grupo também, que vão buscar seus filhos mais para frente”, declarou.

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