Brasília - O assassinato, com um tiro, do indígena guajajara Paulo Paulino, 26, em 1º de novembro passado, no Maranhão, ocorreu durante um conflito com caçadores de animais silvestres que entraram sem autorização na terra indígena Arariboia, apontou o inquérito aberto pela Polícia Federal. Um dos caçadores, Márcio Gleik Pereira Moreira, 37, também morreu no conflito, com um tiro.

Índios da etnia Guajajara na aldeia Jenipapo, na Terra Indigena Arariboia, no Maranhão
Índios da etnia Guajajara na aldeia Jenipapo, na Terra Indigena Arariboia, no Maranhão | Foto: Eduardo Anizelli/Folhapress

A PF discordou da versão inicial dos indígenas de que teria ocorrido uma emboscada de madeireiros, mas reconheceu à reportagem que os caçadores não tinham ordem para estar dentro da terra indígena.

Paulino era um dos "guardiões da floresta", um grupo formado por guajajaras e hoje com 120 integrantes que atuam para proteger a Arariboia da invasão frequente de madeireiros e caçadores.

Outro "guardião", Laércio Guajajara, 34, também foi atingido por um tiro no conflito e passou a receber a proteção do governo do Maranhão ao lado de outros dois "guardiões".

O relatório final produzido pela PF do Maranhão foi encaminhado à Justiça Federal sem ser divulgado à imprensa. A PF indiciou quatro pessoas, mas seus nomes também não foram revelados.

O Ministério Público Federal, que ainda pode pedir novas diligências, concordar ou não com o resultado do inquérito policial, informou que ainda não recebeu o resultado das investigações e se recusou a fornecer à reportagem o nome do procurador da República responsável pelo caso.

O trecho de uma nota divulgada à imprensa pela PF contrariou o Cimi (Conselho Indigenista Missionário), vinculado à CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). A PF informou, na nota, que "foi possível afastar as hipóteses relacionadas a conflitos étnicos ou mesmo por emboscada de madeireiros a indígenas, tudo convergindo para a conclusão de que o lamentável episódio se originou da troca de tiros motivada pela posse de uma das motocicletas utilizadas pelos não indígenas".

Em nota nesta quarta-feira (8), o Cimi contestou: "A Polícia Federal, ao reduzir o assassinato de Paulino Guajajara a um lamentável episódio de troca de tiros, desconsidera uma história de mais de 40 anos de conflitos com madeireiros nesse território, ao longo dos quais os indígenas vêm sendo assassinados e tendo seus territórios destruídos sem que nenhum assassino seja punido".

A reportagem procurou a PF para saber se as mortes ocorreram a partir da invasão da Arariboia por caçadores, o que não foi mencionado na primeira nota.

Em resposta, a PF reconheceu que "conforme resultado das investigações, é possível afirmar que, apesar de proibido, não indígenas adentraram na Terra Indígena Arariboia para caçar, utilizando de motos que foram danificadas por indígenas. Esta constatação foi corroborada por várias fontes de informação, inclusive admitido por indígena diretamente envolvido nos fatos, sob o argumento que pretendia impedir o retorno dos invasores ao local".

A principal atividade dos "guardiões da floresta" tem sido a repressão aos invasores da terra indígena, o que inclui apreensão e destruição de equipamentos utilizados nos crimes ambientais. Indagada se levou isso em conta ao falar de suposto "furto" da motocicleta, a PF respondeu à reportagem que, "apesar da importância essencial para o fortalecimento dos valores étnicos e culturais dos povos primitivos (indígenas) e à preservação do meio ambiente", considera "importante ressaltar que o Estado detém a exclusividade de organizar e executar atos próprios de preservação da ordem pública, não reconhecendo indistintamente a terceiros a legitimidade para a promoção de atos próprios dos órgãos de segurança pública ou de persecução penal". A PF informou que não iria se manifestar sobre a nota do Cimi. A terra indígena Arariboia tem sido alvo frequente de madeireiros e caçadores.