A sede da Funai (Fundação Nacional do Índio) em Londrina foi ocupada por um grupo de 16 indígenas da etnia caingangue, moradores da aldeia São Jerônimo, em São Jerônimo da Serra, no Norte Pioneiro, na tarde desta segunda-feira (5). O objetivo do grupo era pedir ajuda no sentido de coibir agressões supostamente cometidas a mando do cacique da aldeia. Após ter ouvido os dissidentes, o chefe da Funai em Londrina, Marcos Cesar da Silva Cavalheiro, se reuniu com alguns caciques das oito terras indígenas na região e com o Ministério Público Federal através de videoconferência.

Moradores de aldeia cobram apoio da Funai para solucionar crise
Moradores de aldeia cobram apoio da Funai para solucionar crise | Foto: Gustavo Carneiro

De acordo com o indígena Nielson Ferreira, 29, a aldeia vive sob uma “ditadura” do cacique João da Silva, que assumiu a presidência do Conselho Estadual de Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais no Norte do Paraná após o então presidente, o cacique Natalino Marcolino, pedir licença para concorrer ao cargo de vereador em Tamarana. Embora conflitos internos por divergências políticas já estejam acontecendo desde 2015, o estopim para a saída do grupo da aldeia foram incêndios provocados em suas residências na semana passada. As três casas pertencentes ao grupo de moradores teriam sido completamente destruídas.

Conforme apurou a reportagem, a aldeia São Jerônimo é a única dentre as oito da região que possui dois caciques, já que indígenas de três etnias diferentes – Caingangue, Xetá e Guarani, convivem no local. João da Silva representa os índios da etnia caingangue há 12 anos na aldeia. Já o lado Guarani é liderado por Nelson Vargas. São Jerônimo da Serra abriga, também, a aldeia Barão de Antonina.

Nos últimos anos, outras comunidades indígenas foram aprimorando seus processos de escolha de seus líderes, o que não aconteceu em São Jerônimo. Nielson Ferreira disse que a maioria dos moradores é favorável a realização de uma eleição. “Ele, como presidente do conselho, deveria falar para pararem as brigas. O conselho tem que tentar apaziguar a comunidade e ele (João) é quem pede briga. Nós podíamos entrar em briga como foi em 2015, mas como sabemos do nosso direito, lei civil e lei indígena, pensamos em procurar a Funai porque ela tem que dar uma resposta para nós”, disse.

A reportagem esteve na Funai e também conversou com uma indígena de 35 anos que, ao lado da filha de 19, mostrou hematomas e arranhões que teriam sido provocados pelo grupo do cacique. “Primeiro foi com as mãos. Agora dessa vez fui arrastada pelos cabelos e pisoteada”, disse.

A reportagem procurou o cacique, porém ele não atendeu as ligações e nem respondeu as mensagens ao longo desta segunda-feira.

À FOLHA, Cavalheiro disse que o grupo poderá ser encaminhado provisoriamente para as dependências do Centro Cultural Caingangue, na avenida Dez de Dezembro. Entretanto, avaliou a situação como muito complicada para a Funai intervir, mesmo reconhecendo que os indígenas não podem ficar em situação de vulnerabilidade nas ruas de Londrina.

Cavalheiro confirmou que os incêndios foram cometidos, fato que gerou a formalização de um Boletim de Ocorrência e a presença da Polícia Militar no local. "Procuramos respeitar essas questões culturais, políticas e religiosas. Recebemos essas informações, mas não são assuntos da Funai nem do MP", esclareceu.

Questionado se os fatos relatados pelo grupo têm ocorrido com frequência nas aldeias da região, Cavalheiro afirmou que não. "O que procuramos fazer é apaziguar. Quando o indígena se sente lesado ele geralmente procura a Justiça e vamos passar para o MPF", explicou.

Paralelamente aos episódios registrados na aldeia, algumas comunidades indígenas realizam processos de escolha de seus líderes com mandatos de até quatros anos. "Para facilitar cada candidato escolhe uma cor e na hora da votação cara indígena pega um papel e coloca na urna", explicou. Entretanto, a Funai somente acompanha os processos, quem decide realizá-los ou não é a própria comunidade. Nestes locais, os mandatos atuais chegarão ao fim no ano que vem.