SÕ PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Há quatro dias, a família do bebê Arthur Ferreira Belo, de 1 ano e 11 meses, publicou no Instagram um apelo ao governador de São Paulo, João Doria (PSDB), para a isenção de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre o medicamento Zolgensma, indicado para o tratamento de AME (Atrofia Muscular Espinhal) tipo 1, considerado o mais grave. O imposto representa 18% do valor do medicamento e ultrapassa R$ 2 milhões.

A AME é uma doença rara causada por uma alteração do gene responsável por codificar a proteína necessária para o desenvolvimento adequado dos músculos.

A doença, portanto, causa fraqueza, hipotonia, atrofia e paralisia muscular progressiva. O tipo 1 acomete de 45% a 60% do total de portadores da doença e pode levar à morte.

Aos três meses, Arthur não segurava a cabeça, engasgava com facilidade e tinhas as pernas fracas. A mãe, a dona de casa Alessandra Ferreira Santos, 28, o consultou com vários pediatras. Todos diziam que com o tempo ele seria uma criança mais firme.

O funcionário de uma UBS do bairro do Grajaú (zona sul), onde a família mora, recomendou a Alessandra que levasse o Arthur ao Hospital Infantil Darcy Vargas. Após três dias de internação e a realização de exames, veio o diagnóstico de AME tipo 1.

"O neurologista foi duro em suas palavras. Você vai ser uma mãe de UTI, seu filho vai atrofiar e a expectativa de vida é de dois anos. Foi o que ele disse", relata Santos.

Um amigo ajudou a família a iniciar o tratamento de Arthur. Aos cinco meses, em maio de 2019, o bebê foi internado no Hospital da Luz e ficou durante três meses.

"Soube do Zolgensma pelo neurologista, mas na época o remédio ainda estava em estudo. Eu nunca tinha ouvido falar nem da doença."

Santos deixou o emprego num hortifruti para cuidar do filho e o marido é autônomo. Trabalha em casa com manutenção de celulares.

A campanha para arrecadar os cerca de R$ 12 milhões ( US$ 2,125 milhões) para adquirir o Zolgensma, considerado o medicamento mais caro do mundo, começou em outubro do ano passado. O montante é o valor de mercado nos Estados Unidos devido a uma combinação de investimento em pesquisa e inovação tecnológica, baixa escala, aplicação única (não há sessões sucessivas para "diluir" o custo) e falta de concorrência.

Em setembro, através de ação judicial, a família conseguiu que a União completasse o valor arrecadado em campanha através do perfil @amearthurbelo nas redes sociais para a compra do medicamento.

No dia 22 do mesmo mês, o governo federal depositou R$ 8,39 milhões numa conta judicial. No total, até esta segunda-feira (19), a família de Arthur conseguiu R$ 11,4 milhões e descobriu que precisa de mais de R$ 2 milhões para pagar o ICMS.

Arthur completará dois anos em oito de novembro e seus pais correm contra o tempo. Ainda não há dinheiro para cobrir as demais despesas com o tratamento, que incluem a viagem até Curitiba (PR), os custos do Hospital Pequeno Príncipe -onde será feito o procedimento-, e da aplicação da medicação.

"Eu peço ao João Doria que olhe por nós, agora que estamos a um passo de mudar a vida do meu filho. Não tenho condições físicas, emocionais e financeiras. Passamos um ano de muita luta, desespero e medo. Eu gostaria de pedir que ele [João Doria] isente o medicamento do imposto. São muitas mães lutando pela vida dos seus filhos", afirma Santos.

Em 7 de agosto, a bebê Marina Moraes de Souza Roda, hoje com dois anos, foi a primeira criança a receber a dose única do Zolgensma. O procedimento ocorreu no Hospital Israelita Albert Einstein, no Morumbi (zona sul).

Um dia depois, João Doria foi homenageado pela família de Marina e recebeu um certificado em agradecimento ao decreto de isenção do imposto feito na época. Ele e a primeira-dama Bia Doria tiraram fotos com a bebê e os pais no hospital. O momento foi compartilhado nas redes sociais de Doria.

Dias após a aplicação de Marina, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) aprovou uso o medicamento para o tratamento do tipo 1, em crianças de até dois anos, no Brasil.

O registro do Zolgensma, da empresa Novartis Biociências S. A, foi publicado em 17 de agosto do Diário Oficial da União.

O ajudante de motorista Wesley Silva Sales Lopes, 23, e a esposa, a dona de casa Williane de Sales Lopes, 20, convivem com a falta da filha Heloísa, que morreu em 2016, aos 4 anos, de atelectasia pulmonar.

Agora, o filho Arthur Silva Sales Lopes, que completará 11 meses no dia 24 de outubro, luta contra a AME tipo 1.

Segundo Wesley, a doença foi descoberta aos seis meses por demora no diagnóstico. Após apresentar febre e engasgos, Arthur ficou internado no Hospital Cândido Portinari, na Vila Jaguara (zona oeste), por três meses.

Sem saber o que tinha, o bebê foi transferido ao Hospital Cruzeiro do Sul, onde permaneceu pelo mesmo período. Lá, a equipe médica deu o diagnóstico de AME.

"Perdemos o chão, mas resolvemos pesquisar sobre a doença e no instagram descobrimos outras crianças com o mesmo problema e também o zolgensma. Pensamos em iniciar uma campanha imediatamente", conta Wesley.

A campanha do Arthur Sales começou há quatro meses, pelo Instagram @amearthurzinhosales. O montante arrecadado até esta segunda não chega a R$ 60.000.

"Estamos pensando em realizar sorteios e bazares, mas precisamos de ajuda. O valor do ICMS sobre o valor de um medicamento que já é tão caro preocupa não só a mim, mas também as famílias das outras crianças que têm o mesmo problema. É uma quantia alta a mais que teremos que arrecadar e não será fácil."

Segundo Wesley, um dos médicos que atendeu o Arthur afirmou que a morte da filha Heloísa pode ter sido provocada por um quadro de AME.

Outro lado Em nota, a assessoria de imprensa do Governo de SP afirmou que João Doria não suspendeu a isenção do ICMS, mas "naquela situação emergencial específica, foi feita a edição de um decreto com benefício válido até 31 de agosto."

Segundo o órgão, paralelamente, conforme determinado pelo Tribunal de Contas do Estado, está em elaboração um projeto de lei para tratar do assunto, que será enviado à Assembleia Legislativa ainda nesta terça-feira (20). Com prazo de 15 dias para apreciação dos deputados, o Governo resolverá outras situações pontuais.