O aspecto turvo no céu de Londrina percebido com mais clareza no início da manhã e no entardecer deixou no ar também o questionamento entre muitos londrinenses sobre uma possível “visita indesejada” das nuvens de fumaça produzidas pelas queimadas no Pantanal. No entanto, a chegada deste material pelo ar na Região Metropolitana de Londrina foi mesmo a única explicação encontrada por especialistas ouvidos pela reportagem, uma vez que imagens de satélite divulgadas pela Nasa (Agência Espacial Norte-americana) nesta segunda-feira (14) mostravam o deslocamento provocado por correntes de vento do Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul em direção ao Sul do País.

Imagem ilustrativa da imagem Fumaça do Pantanal 'turva' céu do Norte do Paraná
| Foto: Roberto Custódio-14/09/20

“Para dizer com 100% de certeza teria que fazer uma análise das amostras de ar, mas existe uma alta probabilidade de que sim, inclusive na região Norte, de que aquela névoa que observamos no horizonte sejam provenientes do Pantanal. Mas existem, também, as queimadas realizadas aqui mesmo que poderiam transportar poluentes e agravar ainda mais a situação”, ponderou o meteorologista do Simepar (Sistema de Tecnologia e Monitoramento Ambiental do Paraná), Reinaldo Knaibe.

No início de setembro a fumaça do Pantanal já havia sido percebida no Noroeste do Paraná, na região de Porto Rico. Poucos dias depois, moradores da região de Cascavel também relataram terem sentido o clima ainda mais seco e um aspecto “esfumaçado” no horizonte. Entretanto, conforme destacou Knaibe, a densidade desta fumaça foi maior na fronteira com o Paraguai. Já nesta segunda-feira, foi a vez dos curitibanos se depararem com o resultado da tragédia ambiental que o País vem sofrendo, conforme publicou o site MetSul Meteorologia.

Com 14,4 mil focos de queimadas registradas apenas neste ano, 210% a mais em comparação com o ano passado, segundo o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), o Pantanal se tornou, assim como a Amazônia, a maior fonte preocupação de ambientalistas do Brasil e do mundo. “São partículas, material particular muito danoso ao aparelho respiratório", avaliou à FOLHA a diretora de Ciências do Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), Ane Alencar. Ao parafrasear o professor Paulo Artaxo, da USP (Universidade de São Paulo), lembrou que um dia de queimada na Amazônia é muito "pior" à saúde dos brasileiros que os dias de trânsito intenso nas grandes cidades.

Além de lamentar que o processo de degradação ambiental dificultará muito a recuperação do bioma local, Alencar mencionou que a expectativa é que o País passe a registrar com ainda mais frequência fenômenos ambientais extremos, o que também é resultado de um processo global de aquecimento da Terra. “Os eventos que causam seca extrema na Amazônia estão ficando mais frequentes e mais intensos. O aquecimento das águas do Atlântico Tropical que está acontecendo este ano e que provavelmente está impactando a seca no Pantanal está sendo um pouco mais forte por conta do aquecimento global. Está provocando os ciclones no Sul do Brasil. O que estes efeitos têm é exacerbar os fenômenos climáticos, mais frequentes ou intensos. Em cada região vai ser um específico”, explicou.

No caso do Norte do Paraná, o fenômeno que deverá carimbar o mês de setembro é justamente a estiagem. Sem ter registrado precipitações, o clima deve permanecer com baixa umidade até o dia 27, previu o Simepar nesta terça (15). Essas previsões são bem diferentes da média histórica de chuvas para o mês, que é de 210 mm.

Questionada sobre qual é o papel dos paranaenses e demais brasileiros no atual contexto de degradação ambiental, Alencar avaliou que não "desviar o olhar" para o problema já é uma forma de se atuar contra ele. "O governo federal não deveria estar negando que isso é um problema. Negar que isso está acontecendo, que estamos passando por uma crise ambiental, não é uma coisa boa para o País. A primeira coisa que cada um de nós precisa fazer é conseguir ver a verdade e exigir que esse problema tenha um olhar, começando por aceitar que é um problema. As queimadas aqui acontecem por conta de ação humana”, lamentou.

BOMBEIROS DO PARANÁ ATUARÃO NO PANTANAL

A tragédia ambiental que vem sendo registrada no Pantanal de Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul está mobilizando soldados do Corpo de Bombeiros e servidores da Defesa Civil até mesmo de outros estados. De Londrina, equipes do Corpo de Bombeiros também foram deslocadas para colaborar com o combate aos incêndios que já destruíram cerca de 15% do bioma pantaneiro e deixaram 2,2 milhões de hectares danificados.

Enquanto 26 soldados partiram de Londrina em viaturas no início da tarde desta terça-feira (15), uma equipe com cinco soldados sobrevoou o Paraná em uma aeronave do governo do estado e chegou a Campo Grande (MT), onde participou de reuniões com membros da Defesa Civil local para traçar as estratégias da missão no Pantanal.

De acordo com o tenente-coronel Ezequias de Paula Natal, comandante da missão, os representantes do Corpo de Bombeiros do Paraná ficarão na região por 15 dias, prazo que pode ser prorrogado. “Tudo vai depender do desenvolvimento da operação”, afirmou.

O comandante lembrou que a ação vai além da preservação do meio ambiente. “É uma questão de saúde também. Diminuir os focos de incêndio significa menor quantidade de fumaça no ar, com reflexo imediato na respiração das pessoas”, comentou Natal.