Aos oito anos, na década de 1960, o menino não compreendia o fato de o ajudante de pedreiro que trabalhava na obra de sua casa não saber ler e escrever. Foi à escola no Rio de Janeiro, falou com a professora e passou a aplicar algumas das lições aprendidas para Sebastião, que, ao ir embora, não só era capaz de escrever o próprio nome como deixou um bilhete de gratidão. A história pode ter o tom de fábula, mas era a vocação de Carlos Alberto Decotelli se manifestando – e ela estava certa. O economista, que é doutor em finanças – e tem título de pós-doutorado na Bergische Universitãt Wuppertal, na Alemanha –, dedicou boa parte de sua vida adulta ao ofício de professor em importantes universidades do País. Sua missão agora é bem mais complexa do que atuar em sala de aula. Como presidente do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), autarquia do Ministério da Educação, ele é responsável por gerir os principais programas do setor. Em visita a Londrina, esteve na redação da FOLHA para uma entrevista.

“Hoje temos alguns bilhões parados nas contas bancárias que os prefeitos não usam", declarou Decotelli
“Hoje temos alguns bilhões parados nas contas bancárias que os prefeitos não usam", declarou Decotelli | Foto: Marcos Zanuto / Grupo Folha

A principal agenda do presidente da FNDE na região foi conhecer o Codinorp (Consórcio de Desenvolvimento e Inovação do Norte do Paraná). O consórcio criado em 2007 é formado por dez municípios – Bela Vista do Paraíso, Cafeara, Centenário do Sul, Florestópolis, Guaraci, Jaguapitã, Lupionópolis, Miraselva, Porecatu e Prado Ferreira – e busca soluções em comum para as prefeituras e suas secretarias de educação. “O Paraná é referência para consórcio de municípios. Vim buscar a inspiração operacional porque o FNDE entende como proposta para o governo federal que devemos manter uma eficiência maior na utilização dos recursos públicos, integrando inteligências, compartilhando soluções. Recursos públicos mais bem cuidados, com melhor qualidade da entrega e controle mais rígido”, afirmou Decotelli. A ideia é que o modelo seja difundido por todo o território. “Viemos aprender in loco como o Codinorp está funcionando e convidarmos o consórcio para dar uma palestra em Brasília. A sugestão é propormos para as prefeituras no Brasil inteiro aderirem ao modelo de consórcio. Estas terão um tratamento diferenciado aos recursos destinados para a educação”, adiantou.

Em seu discurso de posse como presidente do fundo, Decotelli afirmou que desejava que a autarquia fosse mais ampla na elaboração de estratégias, no lugar de cumprir o papel de apenas repassar os recursos. Em cinco meses de atuação – o economista integrou a equipe de transição de governo –, ele elaborou estratégias de curto, médio e longo prazos para o FNDE. Em um dos trabalhos de ação mais imediata, os técnicos do órgão recebem grupos de prefeitos, assim como vão às cidades para tirar dúvidas e explicar como melhorar a relação entre as administrações municipais e o fundo. “Hoje temos alguns bilhões parados nas contas bancárias que os prefeitos não usam. Porque cada um dos programas do FNDE tem um protocolo e uma maneira de acessar, usar, liberar e prestar contas. Muitas cidades não sabem como usar. Trabalhamos para que esses saldos nas contas sejam zerados porque os municípios que já conseguiram usar esses recursos têm tido melhores taxas no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) e no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), explicou Decotelli.

O Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), que ficará em vigor até 2020, é considerado uma estratégia de longo prazo. “O novo Fundeb será implantado como emenda na Constituição e há propostas sendo estudadas. No entanto, a nossa visão é que a estrutura de consórcios esteja funcionando junto com esse novo modelo do Fundeb. A ideia é maximizar os resultados a partir da inteligência da gestão compartilhada dos consórcios”, detalhou o gestor, que tem como algumas de suas responsabilidades a Alimentação Escolar (PNAE) e o Programa Nacional do Livro e Material Didático. Mais do que números e cifras, cabe ao Fundo a manutenção de um ambiente propício para o bem-estar dos estudantes. “A alma da escola é o que podemos propiciar para que as crianças tenham alegria em ir às aulas. Hoje, eu tenho uma consciência que o maior desafio da escola é poder oferecer a alma para os alunos, para que cresçam íntegros e socialmente motivados”, concluiu.