Há três anos, quando chegou ilegalmente ao Brasil, o haitiano Feguens Charleron só pensava em estar exatamente como hoje: com trabalho fixo e morando junto com sua esposa e filhos pequenos. Após muitas dúvidas e obstáculos, faz um ano que a família e mais dois irmãos de Feguens estão adaptados à rotina brasileira, com as crianças inclusive frequentando a escola. E essa não é uma realidade apenas dele. O haitinano Jack Michel, também há três anos no País, realizou o desejo de ter sua esposa e filho na mesma casa. Depois de um tempo sozinho e enviando dinheiro à família que havia ficado lá, Michel comemora o fato de terem iniciado uma vida nova, em Londrina, com emprego fixo e os dois por perto. Há um ano na cidade, o filho já frequenta a creche e a mulher também está trabalhando.
Ambos vieram ao Brasil em busca de trabalho e fugindo das condições precárias em que o Haiti encontra-se desde o terremoto que destruiu a cidade de Porto Príncipe, capital do país. Entraram ilegalmente e até com a ajuda de coiotes pelas fronteiras: um pelo Peru e outro pela Bolívia.
A tríplice fronteira, Brasil-Peru-Colômbia, pela cidade de Tabatinga, no estado do Amazonas e em outro ponto, Brasil-Bolívia-Peru, pelas cidades de Assis Brasil e Brasileia, no Acre, são as principais rotas utilizadas pelos imigrantes.
Após um período de espera pela documentação, seguiram rumo à região Sudeste e Sul, onde havia mais oferta de mão de obra, sobretudo, na construção civil. "Fiquei dois meses no Acre esperando meus documentos. Enquanto isso, famílias me ajudavam com dinheiro e alimentação, porque ainda não podia trabalhar", lembra Charleron, que hoje trabalha como pedreiro na construção civil.
Michel, por sua vez, ficou um mês no estado do Amazonas até que conseguiu sua carteira de trabalho com o visto brasileiro. "Não me acostumei com o calor de lá e também não tinha emprego. Fiquei sabendo que no sul havia mais oportunidades e não tive dúvidas em partir."
Apesar de relatarem estar felizes juntos, os haitianos afirmam que a situação financeira é crítica, mesmo com trabalho. Ambas as esposas e filhos já chegaram ao Brasil após darem entrada com o processo de migração no país de origem.

Números,br>Durante semanas, a reportagem da FOLHA tentou levantar quantos são e onde estão esses refugiados e imigrantes dos últimos cinco anos que vieram ao Brasil. Com informações pulverizadas, (Polícia Federal, Ministério da Justiça, Itamaraty, IBGE) - e já que não há consenso da classificação de sua situação - a dificuldade em encontrar números fiéis é grande. Uma coisa é certa: eles estão chegando de todas as partes do mundo, estabelecendo moradia e, ao longo do tempo, trazendo a família.
De acordo com o Ministério da Justiça (MJ), o Brasil bateu recorde em 2014 ao acolher 2.320 refugiados. O número é 3,5 vezes maior que 2013, quando foram acolhidos 651 pessoas. Em outubro do ano passado já eram 7.289 refugiados reconhecidos no total, de 81 nacionalidades distintas (25% deles são mulheres). O balanço foi divulgado pelo Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), órgão colegiado à Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça (MJ).
Dados do relatório "Refúgio no Brasil: análise estatística", publicado pelo Alto Comissariado das Nações Unidas (Acnur), com base no Conare, mostram também que, no mesmo período, o comitê aumentou expressivamente os atendimentos. As solicitações de refúgio saltaram de 566, em 2010, para 8.302 somente no ano passado, representando um aumento de 1.466%. O comitê deferiu 88,5% das solicitações de refúgio apreciadas em 2014, uma taxa mais que duas vezes a de 2013 e a maior desde 2010, quando o órgão começou o controle dos dados.

Imagem ilustrativa da imagem Falta estrutura para receber refugiados



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