A explosão de uma unidade armazenadora de grãos da Cooperativa C.Vale, em Palotina (Oeste), chocou o Brasil na última quarta-feira (26). Foram confirmadas oito mortes de trabalhadores, além de 11 pessoas feridas e uma vítima que seguia desaparecida, segundo o Corpo de Bombeiros.

Especialistas apontam que esse tipo de acidente é bastante conhecido no Brasil e no exterior, e que a suspensão de pó seco no ar em um ambiente fechado pode criar o combustível para uma explosão de grandes proporções.

De acordo com o engenheiro agrônomo Irineu Lorini, especialista na área de armazenagem, é necessária uma fonte de ignição para que ocorra a queima do pó e a explosão na sequência. “É o que chamamos de explosão de pó”, resume.

O engenheiro, que já trabalhou em Londrina e mora em Florianópolis, explica que os grãos são descarregados em moegas, passam por secagem e limpeza para atingirem um padrão de qualidade antes de seguir para o armazenamento, onde ficam durante vários meses.

“Nesse processo de transporte o grão vai levando vários tombos. O milho, por exemplo, vai quebrando e gerando partículas que viram uma poeira, uma espécie de farinha, que é muito leve”, explica Lorini, pontuando que, quando esse pó fica em suspensão em ambiente confinados, “qualquer faísca pode incendiar e começar a explosão”.

O engenheiro civil Giovanni P. Bonometti, especialista em manuseio e moagem de grãos, aponta que os produtos precisam ser mantidos secos para evitar a fermentação. “Eles ficam com um grau de umidade baixo e vão se ‘esfregando’ uns nos outros, o que gera o pó muito fino que se deposita onde for se não tiver uma corrente de ar”, diz.

Bonometti, que é do Recife, aponta que o fenômeno da explosão é semelhante ao funcionamento de um motor em combustão e que, se não houver uma corrente de ar, o estrago tende a ser menor; mas se o ar dispersar essas partículas, a destruição aumenta.

“É vasto na literatura dos Estados Unidos e do Canadá. São acidentes comuns e muito pesquisados por lá. Chega um ponto que essa mistura ar-pó é ideal. Na presença de uma faísca, ela inflama e explode. E essa primeira explosão levanta o pó que está na região e o calor provoca as próximas explosões”, acrescenta.

CUIDADOS

Bonometti aponta que o ideal seria que “todo grão que entra na instalação passasse por uma peneira” para remover as partículas, o que evitaria “importar problemas” de outras unidades ou do próprio transporte. Também é importante ter sistemas de aspiração para remover a poeira, com a devida manutenção dos filtros.

O engenheiro ainda cita que os equipamentos - como os transportadores, por exemplo - devem ser feitos de materiais que não produzam faíscas com o atrito, além de toda a estrutura elétrica ser à prova de pó e água. Durante a operação do silo, a empresa deve manter a manutenção preditiva dos equipamentos.

Lorini também destaca a importância de fazer a limpeza periódica das unidades armazenadoras, retirando o pó “na medida que vai parando a safra ou nos intervalos de recebimentos”.

Para o profissional, trata-se de um risco inerente da atividade, mas podem ser adotadas ações para se evitar ao máximo a criação de uma fonte de ignição. “É um acidente que a gente gostaria que não acontecesse. Ele é raro, mas existe essa possibilidade.”

O engenheiro agrônomo, que trabalhou na Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), diz que já visitou a unidade de Palotina e que o local tem capacidade de armazenamento da ordem de 100 mil toneladas.

“Ali a explosão aconteceu em uma parte do túnel e se ramificou, foi acontecendo em cascata e indo para outras partes. Essa frente de pressão vai tentando sair até achar uma saída”, explica.

SEGURANÇA

O engenheiro agrícola e de segurança do trabalho, Valdir da Cruz de Oliveira, participou nesta sexta-feira (28) de uma fiscalização do Crea-PR (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Paraná) na Cooperativa C.Vale. Ele cita que o estrago foi grande na unidade, e que ainda é cedo para apontar o que causou o início da explosão.

Segundo Oliveira, nos túneis de ligação entre os armazéns, que estão a cerca de 4 metros de profundidade, a explosão rompeu das lajes de concreto, que têm de 25 a 30 centímetros. Acima dos túneis, o solo que estava compactado foi rompido.

“Você sabe que aconteceu uma explosão de pó, muito provavelmente que tenha se originado em um túnel”, declaram, citando que a profundidade total da estrutura varia de 10 a 12 metros, com túneis por onde os grãos são retirados.

Em relação à segurança do trabalho, o engenheiro ressalta que todas as cooperativas do Paraná seguem a NR (Norma Regulamentadora) 33, que trata do trabalho em espaços confinados, a NR 35, para trabalhos em altura, e outras normativas similares.

Oliveira explica que as unidades armazenadoras de grãos são espaços confinados bem característicos e um dos mais perigosos, ao lado das petrolíferas e mineradoras, e que os riscos incluem soterramento e confinamento, asfixia por gases e explosões.

“Não conheço nenhuma cooperativa do Paraná que jamais coloque um funcionário sob um trabalho desse sem a informação e o treinamento necessário”, enfatiza.

A fiscalização do Crea-PR focou na constatação, levantamento e registro de informações para criação de um relatório interno. Um dos pontos que serão verificados é se a manutenção dos equipamentos era feita com supervisão de profissional habilitado e registrado no conselho.

RISCOS

A capitã Ana Paula Bagge, do CBMPR (Corpo de Bombeiros Militar do Paraná), aponta que, além dos riscos de explosões, outros problemas ocorridos em trabalhadores de silos são lesões no trato respiratório e nos olhos, devido ao contato com a poeira, e questões relacionadas à ergonomia das pessoas que acessam os espaços confinados. “Ainda, podem ocorrer acidentes em geral, como quedas e sufocamentos por conta do ambiente hostil”, acrescenta.

Segundo a agente, o Corpo de Bombeiros possui uma normativa específica para unidades de armazenamento e beneficiamento de produtos agrícolas e insumos, trazendo procedimentos para estrutura, acessos, saídas, entre outras informações, inclusive previsão de treinamento de funcionários.

“O CBMPR orienta sobre a importância do cumprimento das legislações específicas que envolvem esse cenário, assim como a realização de treinamentos com os trabalhadores, utilização de equipamentos de proteção e a orientação quanto aos riscos de acidentes existentes”, completa.