Em meio a tantas carências enfrentadas pela população em situação de vulnerabilidade, há um nicho de pessoas cujas necessidades são ainda maiores e mais urgentes e até as quais nem sempre chegam as ações solidárias. Um grupo muitas vezes esquecido pelas redes de apoio é aquele formado por idosos, doentes crônicos, acamados e indivíduos com necessidades especiais. Para tentar amenizar o sofrimento de quem tem uma quantidade de demandas incompatível com a renda mensal, a Associação de Moradores do Residencial Vista Bela, na zona norte de Londrina, e a ONG Centro de Apoio Coração Solidário se uniram e, neste sábado (17), realizaram a distribuição de alimentos e cobertores a cem famílias cadastradas. A primeira campanha de inverno do ano começou às 9 horas e seguiu até o meio-dia. No total, foram doados 1,7 mil quilos de alimentos.

Imagem ilustrativa da imagem Entidades doam cestas básicas e cobertores a moradores do Vista Bela

“A gente classifica as famílias, faz visitas às casas, vê as necessidades, o número de pessoas e a renda familiar para colocar no nosso cadastro. O critério é que estejam em situação de muita vulnerabilidade, praticamente sem renda nenhuma”, disse a presidente da associação de moradores do bairro, Vera Regina Jane Vieira. “É um público alvo que estava sendo mais esquecido. Esses ficam mais distantes porque não têm a possibilidade de largar um paciente ou uma criança e ir atrás de uma ação”, comentou a integrante da ONG, Thaís Fernanda Coelho.

Se antes da pandemia já era difícil para essas pessoas sobreviverem apenas com o valor do benefício social ou, em alguns casos, sem renda nenhuma, após a crise sanitária tudo ficou mais complicado. No último ano, o custo de vida aumentou com a disparada dos preços dos alimentos, do gás e dos serviços básicos, como água e luz. “Se um pai de família onde não há pessoa com necessidade especial dentro de casa já tem dificuldade para sustentar a casa, imagine com o mesmo valor, só que com a necessidade especial? As demandas são muito maiores”, destacou Coelho.

DESAFIOS

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Na fila para recebimento das doações não faltam relatos de desafios de toda ordem, especialmente financeira. A dona de casa Rosângela Ferreira dos Santos é mãe do Rodrigo, 20, que tem deficiência visual e atraso intelectual. O rapaz recebe um benefício, mas atravessar o mês apenas com o valor do auxílio está cada vez mais difícil. “Essa ajuda é muito bem-vinda. As coisas estão caras e a gente fica só dentro de casa. Do valor do benefício, eu tiro para comprar remédios que nem sempre eu consigo de graça no posto de saúde, ainda pago o condomínio e nem tudo dá para comprar. A parte da alimentação, hoje, é o que mais pesa. Essa cesta veio na hora certa”, comemorou.

Moradora do Vista Bela recebe alimentos e cobertor: associação de bairro e ONG Centro d Apoio Coração Solidário realizaram campanha
Moradora do Vista Bela recebe alimentos e cobertor: associação de bairro e ONG Centro d Apoio Coração Solidário realizaram campanha | Foto: Simone Saris

Maria Lúcia Galdino também tem um filho especial de 33 anos e a família vive apenas com o benefício concedido pelo governo ao rapaz. “Piorou com a pandemia porque antes, eu sempre fazia um trabalhinho, um salgado para vender, mas agora, sem escola e com ele dentro de casa o tempo todo, não tem como. Tenho que me dedicar totalmente a ele. Essa cesta básica me traz um alívio muito grande”, desabafou a dona de casa.

O aposentado Arnaldo de Souza é diabético, tem sequelas de um acidente que sofreu e a esposa, que ajudava a complementar a renda familiar trabalhando como empregada doméstica, também teve que interromper a atividade por problemas de saúde. Ela tem sofrido com a falta de ar. “Eu só recebo um benefício, fiz um empréstimo porque tinha que comprar um negócio e agora estou pagando. Também pago R$ 300 de condomínio. É isso o que atrapalha a gente. Está difícil a vida. Uma cesta básica pode parecer pouco, mas neste momento ajuda muito. Eu sozinho, a mulher doente, não dou conta”, relatou.

Acompanhando o movimento no ponto de distribuição dos donativos, Jurandir Antunes Ferreira lamentava não estar incluído no cadastro. “Estou sem nada em casa. Sem óleo, sem feijão, sem arroz. Não tenho vergonha de falar porque a vida está difícil para todo mundo. Recebo um salário de aposentadoria, mas gasto a metade desse dinheiro com remédios”, disse ele, que tem doença de Chagas, esofagite e câncer de pele. “A vida é difícil, tem hora que a gente desanima, se revolta e pergunta por que tem que passar por tudo isso.”

DEMANDA ALTA

Coelho reconhece que o número de pessoas que se enquadrariam nos critérios definidos pela entidade e pela associação de moradores é bem maior que cem, mas por enquanto, a quantidade de donativos é insuficiente para acolher a todos que esperam por uma ajuda. Além de alimentos, as entidades também arrecadam fraldas para crianças e adultos. “É muita procura, a demanda é muito grande, mas todos esses que estão sendo atendidos hoje, são cadastrados com laudo médico comprovando que realmente têm essa dificuldade.”

Para que a ação deste sábado acontecesse, foram vários dias de trabalho e, ao longo de toda esta semana, muitas pessoas colaboraram na separação e embalagem das cestas básicas e dos cobertores e na distribuição de senhas. Quem teve o nome incluído no cadastro das entidades já chegou ao ponto de distribuição com a senha em mãos e o horário da retirada definido, para evitar aglomerações. Os cem beneficiados foram divididos em grupos de cerca de 30 pessoas, com um período de uma hora para atendimento de cada grupo.

Na arrecadação dos donativos, a associação de moradores e a ONG contaram com o apoio de comerciantes da zona norte, empresas da cidade e fabricantes de alimentos e de produtos farmacêuticos. A ajuda vai se estender por seis meses, garantindo uma cesta básica a cada uma das cem famílias cadastradas até o final deste ano. As entidades também contam com a parceria de uma entidade ligada à Igreja Adventista do Vista Bela, que ajuda na coleta de alimentos para serem distribuídos.

Quem quiser colaborar, pode entrar em contato com a ONG Centro de Apoio Coração Solidário, pelo telefone 3339-4590, das 8 às 16 horas, de segunda a sexta-feira, ou pela página Cacs Cacs, no Facebook.