Uma nova legislação, que altera pontos do Estatuto da Igualdade Racial, deverá contribuir para a criação de políticas públicas de combate à desigualdade no Brasil. O texto 14.553/2023, sancionado em abril pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), é visto como um passo no caminho certo por especialistas para a promoção da igualdade racial.

As firmas terão que apresentar informações levando em conta o critério de “autoclassificação em grupos previamente delimitados”
As firmas terão que apresentar informações levando em conta o critério de “autoclassificação em grupos previamente delimitados” | Foto: iStock

A lei prevê que empresas públicas e privadas deverão apresentar informações de etnia e raça dos trabalhadores, levando em conta o critério de “autoclassificação em grupos previamente delimitados”.

Os dados serão acrescentados nos formulários de admissão, demissão e acidente de trabalho, registros do Sine (Sistema Nacional de Emprego) e da Rais (Relação Anual de Informações Sociais), nos documentos de inscrição na Previdência Social e nos questionários de pesquisa do IBGE.

A pesquisadora e integrante do Neab (Núcleo de Estudos Afro-brasileiros) da UEL, Fátima Beraldo, avalia que a nova legislação é um avanço para o movimento social. Para ela, os dados servirão de base para novas políticas públicas voltadas à igualdade racial e ajudarão no combate ao racismo.

“O processo da formulação de políticas públicas requer dados estatísticos para sustentação. E como [vamos] ter dados que ancoram essas políticas se nos documentos do Estado não há como identificar a cor de pele, diga-se cor de pele preta, da pessoa, porque o quesito raça e cor foi ocultado ou adulterado?”, questiona Beraldo.

Essa percepção é semelhante à do presidente do CMPIR (Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial) de Londrina, Welisson Vieira de Aguiar. Ele diz que o levantamento dos registros vai mostrar “a quantas anda” a questão da desigualdade no Brasil, sobretudo do ponto de vista institucional. “E uma vez que existem dados concretos, isso acaba fazendo com que o poder público tenha e efetive medidas para amenizar essa desigualdade.”

Para Beraldo, existe na cidade um “firme compromisso de setores como a Prefeitura e a UEL para fazer o enfrentamento ao racismo, sempre na perspectiva de promover a igualdade racial e instituir políticas para melhoria das condições de vida do povo negro e outros segmentos sociais, historicamente em situação de vulnerabilidade.”

A Lei 14.553/2023 determina que, a cada cinco anos, o IBGE deverá fazer pesquisa para identificar o percentual de ocupação de segmentos étnicos e raciais no setor público. O intuito é auxiliar na implementação da Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial.

Outra medida recentemente adotada pelo governo foi destinar um mínimo de 30% dos cargos de comissão e de confiança para pessoas negras na administração federal. A determinação consta no Decreto 11.443/2023, assinado em 21 de março, em alusão ao Dia Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial.

“Hoje nós já temos essa ideia da inserção dos negros no poder público, que ainda é bem pequena, e principalmente nos espaços de decisão, que é menor ainda. É importante para que cada vez mais as políticas públicas sejam efetivas e que isso cada vez mais contribua com a questão da igualdade de fato”, avalia Aguiar.

TRABALHO

A professora Renata Vieira Meda, do curso de Direito da UEL, aponta que a lei é importante para identificar e coibir a discriminação contra pessoas negras, combater o assédio moral no mercado de trabalho, que tem as mulheres negras como principais alvos, e para abordar a questão da diferença salarial entre brancos e negros.

“Essa lei não vem sozinha, já vem do estatuto [da Igualdade Racial] e de uma política [Nacional de Promoção da Igualdade Racial]. O Estado vem aumentando uma regulamentação para tentar diminuir a discriminação e aumentar as oportunidades para a população negra”, afirma. “O IBGE, que faz a identificação das populações negras no mercado de trabalho, vai conseguir identificar a majoração, o aumento das oportunidades destinadas às pessoas negras.”

Meda destaca ainda a importância da Convenção Internacional Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial e o programa Brasil sem Racismo na formação de um arcabouço jurídico para combate ao preconceito racial.

No entanto, para que as medidas tenham impacto na realidade social, as ações afirmativas, aponta Meda, devem ter caráter permanente. “Só com essa perpetuidade é que a gente vai conseguir alcançar uma redução da discriminação.”

Fátima Beraldo diz que vê com otimismo as novas ações de combate ao racismo no Brasil. “O Estado brasileiro tem uma reparação a fazer com a pessoa negra, que é histórica. É uma dívida econômica, política, cultural, mas, principalmente, uma dívida moral e ética. E o Brasil não tem como pensar em maioridade caso não encaminhe uma solução nesse sentido”, destaca.

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