Elite sem terra acha Fidel democrático
PUBLICAÇÃO
sábado, 01 de março de 1997
Elite sem terra acha Fidel democrático
Coordenadores da marcha dos trabalhadores rurais pela reforma agrária defendem democracia cubana como modelo político
Agência Folha,
de Pirassununga
Os oito coordenadores da marcha do MST que vai a Brasília cobrar reforma agrária do presidente Fernando Henrique Cardoso podem ser definidos como a elite da elite dos sem-terra. Todos defendem a democracia como modelo político. Mas acreditam que Cuba, que Fidel Castro governa há quase 40 anos, é um país democrático.
Eles foram escolhidos entre os 600 participantes da marcha. Por sua vez, esses 600 foram eleitos como os mais capacitados de cada acampamento ou assentamento do MST nos Estados de Sao Paulo, Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul.
O gaúcho Claudiomir Goulart, 22, acha que a China também é democrática. Para ele, as milhares de pessoas mortas na chamada revoluçao cultural chinesa serviram para o processo de formaçao do povo. Goulart é o único da coordenaçao que defende a manutençao da pena de cadeia para usuários de maconha. Eles incentivam os menores a ingerirem a droga. É como um vírus, explica.
Cuba também é o modelo político do catarinense Lenoir Shcabarum, 23. Ele aponta Marx como seu ídolo. Como a maioria dos sem-terra, começou a militância na Igreja Católica. Apesar da pouca idade, está há sete anos no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e já recebeu 16 hectares de terra do governo.
Na mesma linha, Gilberto Barden, 36, também gaúcho, acredita no modelo democrático de Cuba. Lá, a participaçao do povo é muito maior do que no Brasil. Mas Barden nao acredita que o Brasil precise de uma revoluçao nos moldes de Cuba. Na conjuntura em que se desenvolve nosso País, nao há nenhuma possibilidade. A luta do MST é popular e de massa. Nunca armada. O ex-metalúrgico Joaquim Modesto, 31, paulista e responsável pela segurança da marcha, é mais transigente com a possibilidade de o MST partir para alguma forma de luta armada.
Partindo do MST, isso nunca vai acontecer. Mas os latifundiários estao se armando. É difícil dizer que os trabalhadores, os sem-teto, os metalúrgicos vao ficar quietinhos, diz.
A única mulher do grupo, a auxiliar de enfermagem Cleide Rabello, 26, vive em um acampamento do MST no Paraná. Seus pais perderam as terras por nao poderem pagar dívidas com bancos. No MST, estou me realizando com a possibilidade de exercer minha profissao, diz.
O tempo de participaçao no MST nao é fator determinante para alguém assumir posiçao de liderança. Pedro dos Santos, 25, paranaense, está no grupo há apenas seis meses e representa seu Estado na coordenaçao da marcha.
Ele nunca foi agricultor. Trabalhava como funcionário público de uma prefeitura do interior do Paraná. Com meu emprego, só consegui uma casinha e o carro. Eu queria terra. Ajudei em uma invasao em Palmital e fiquei por lá.
O mais velho entre os coordenadores da marcha é José Tavares da Silva, 43. Diz que, com o MST, realizou o sonho de ser cantor. Hoje, coordena a Brigada Nacional de Músicos da entidade.