SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Diante da crise do coronavírus, o hospital Albert Einstein firmou parceria com dois colégios de elite na região do Morumbi (zona oeste) para acolher os filhos de funcionários do hospital que não têm com quem ficar durante o dia.

Desde quarta-feira passada (25), cerca de 300 crianças de 3 a 13 anos passaram a ir ao colégio Miguel de Cervantes, o primeiro a aderir à iniciativa, semelhante a uma creche improvisada, durante o horário de trabalho dos seus pais.

Supervisionadas por funcionários da escola e grupos de voluntários, elas fazem até cinco refeições por dia, pagas pelo hospital, e participam de atividades extracurriculares e brincadeiras, como leitura, esportes e cantigas de roda -todas respeitando o distanciamento social, por mais que pareça impossível pedir isso a uma criança pequena.

"A gente trabalha com grupos muito pequenos", explica Felipe Spinelli, diretor-superintendente de ensino do Einstein. As crianças sentam distantes umas das outras nas salas de aula e nos refeitórios e não dividem brinquedos ou materiais didáticos.

Apesar do contato restrito, Spinelli garante que há quem chame a iniciativa de colônia de férias. "São atividades lúdicas, interessantes, não é para ser uma coisa pesada. A gente quer que as crianças saiam de lá felizes."

Caso o número de crianças atendidas passe de 400, o colégio Porto Seguro será acionado para acolher mais filhos de funcionários.

Os voluntários foram recrutados em poucas semanas através de contatos com grupos de pais, professores e, principalmente, movimentos juvenis da comunidade judaica. "Essa rapazeada se mobilizou, buscou um número enorme de voluntários. Tive até que pedir para parar, porque era muita gente", diz Spinelli, rindo. Houve uma preocupação em buscar pessoas jovens (e mais distantes, portanto, do grupo de risco do covid-19).

A engenheira civil Daniela Macário, 26, tinha acabado de arranjar um novo emprego quando a cidade entrou em quarentena. Com tempo livre, já que a contratação foi prorrogada, ela decidiu se voluntariar após saber do projeto por WhatsApp.

"No começo eu estava com bastante medo, para ser bem sincera. Poxa, eu podia evitar a situação de me expor ao vírus participando desse trabalho. Mas o que passou na minha cabeça é: se hoje tem tanta gente -médicos, enfermeiros- trabalhando para combater o coronavírus, por que eu não posso ajudar um pouquinho?", afirma.

Ela conta que adaptou brincadeiras como batata-quente e passa-anel para diminuir o contato físico, mas que é difícil garantir o distanciamento o tempo todo -especialmente com a faixa de idade com que trabalha, de três a seis anos.

"Nós acabamos ficando tão próximos lá que, se alguém tivesse o vírus, ia pegar. Não tem como. Porque um metro, meio metro de distância, com certeza você já está numa área de risco", diz. "O cuidado que a gente toma mais é o físico, mesmo, de lavar muito as mãos e usar álcool em gel, porque o distanciamento de fato nessa idade é bastante difícil."

Devido ao risco, ela decidiu restringir contatos com a própria família, para não ter o risco de contaminá-los. Fora do Cervantes, ela só vê o namorado, com quem mora.

As crianças, conta, se apegaram rápido: aprenderam seu nome no primeiro dia e perguntam se ela vai no dia seguinte. Na quarta-feira (1) criaram juntas um rap que fala dos cuidados diante do coronavírus."Para elas não é fácil. Elas estão em um outro ambiente e não sabem direito por quê. Você se sentir um pouco parte disso, tirar um sorriso, fazer uma brincadeira nova, é impagável."