São Paulo, 22 (AE) - Longe dos holofotes, a comissão parlamentar de inquérito que mais barulho fez no ano passado, com métodos polêmicos de investigação e manchetes quase diárias na mídia, está recolhida para finalizar seu trabalho. Imersa em milhares de documentos envolvendo principalmente sigilos bancários, telefônicos e fiscais, a CPI do Narcotráfico já antecipa que o trabalho de investigação precisará prosseguir com as CPIs estaduais. "Tem muito ainda a avançar", justifica o deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS), sub-relator dos trabalhos da comissão em Campinas, cidade apontada pela CPI como o centro de lavagem de dinheiro do crime organizado.
A CPI interrompeu seu trabalho de campo no final do ano passado, após ouvir dezenas de testemunhas e implicados e de reunir mais de 500 volumes, alguns com mais de mil páginas. Os sigilos quebrados são cerca de 300 - de empresas e pessoas citadas nos depoimentos prestados à comissão - e é sobre eles que a comissão se debruça agora, não sem reclamar da falta de técnicos especializados para analisar a papelada. Os deputados contam hoje com a ajuda de funcionários da Receita Federal, do Banco Central e do Tribunal de Contas da União, mas o atraso no envio de informações pedidas a alguns órgãos públicos tem atrapalhado, reclama o presidente da comissão, Magno Malta (PTB-ES).
Ele calcula que até março, quando a comissão deve encerrar seus trabalhos, apenas 30% dos documentos serão analisados. O que ficar pendente será encaminhado às comissões parlamentares dos Estados. São Paulo, Espírito Santo, Minas Gerais, Paraná e Maranhão já têm comissões investigando as ramificações do tráfico em seus Estados.
O atraso no recebimento dos documentos pedidos à Receita e BC pode respaldar um pedido de prorrogação da CPI. O relator da comissão, Moroni Torgan (PFL-CE), disse nesta semana que não pretende fechar seu relatório sem antes analisar os sigilos já quebrados. "Enquanto não forem analisados pelo menos 80% de toda esta documentação não vamos terminar a CPI", declarou o relator na quarta-feira. A idéia dele é pedir a prorrogação dos trabalhos pelo menos até junho. Campinas - Pompeo de Mattos, que está tratando dos documentos referentes a Campinas, diz que a cidade onde coordenou as investigações é o centro de referência para o trabalho da comissão. "Ela merecia uma CPI própria tal a quantidade de envolvidos", afirma, lembrando que as investigações mostraram a conexão com Estados como o Acre e Alagoas, na distribuição da droga e lavagem de dinheiro. Só lamenta o fato de os envolvidos no crime "não terem aberto o bico".
Segundo ele, o "único erro" da CPI em Campinas foi não ter negociado com o advogado Arthur Eugênio Mathias, apontado como braço-jurídico do crime organizado, para que desse nomes de envolvidos. O deputado conta que Mathias se propôs a revelar nomes, mas com a condição de isso fosse feito em segredo. "A CPI poderia ter fatos, ainda que em segredo, mas a proposta não foi aceita porque foi considerada aética pelos deputados". Para Pompeo, Mathias "sabe tudo" sobre as ramificações do crime organizado na cidade. "Tudo o envolve", afirma.
O advogado está preso desde o final de novembro em Campinas, após ter sido acusado pelo caminhoneiro Adilson Dias Luz de integrar quadrilha de roubo de carga. Adilson, porém, voltou atrás nas acusações e agora acusa delegado, promotores e a própria CPI de tê-lo forçado a incriminar Mathias. O deputado Pompeo rebate as acusações e minimiza o fato de o caminhoneiro ter recuado em suas denúncias contra Mathias. Segundo ele, o motorista Jorge Meres, hoje a principal testemunha da comissão sobre as ramificações do tráfico e crime organizado no País, reafirmou as denúncias de Adilson contra o advogado e deu ainda mais informações.
Pompeo atribui a reviravolta na história de Adilson ao fato de ele não ter recebido do governo a proteção necessária após as denúncias. "Acredito que ele recuou muito menos pelo que contou e mais pelo que não recebeu", disse. De acordo com o deputado, o governo não cumpre seu dever de implantar com eficiência o programa de proteção de testemunhas.