Com veto a celulares, alunos têm rotina diferente nas escolas
Estudantes de colégio de Cambé dizem estar tranquilos com a mudança determinada pelo governo federal
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sábado, 01 de março de 2025
Estudantes de colégio de Cambé dizem estar tranquilos com a mudança determinada pelo governo federal
Jéssica Sabbadini - Especial para a FOLHA

O período escolar de 2025 começou um pouco diferente para estudantes espalhados por todo o país. Isso porque o governo federal sancionou no dia 13 de janeiro a Lei N° 15.100/2025, que restringe o uso de celulares e aparelhos eletrônicos nas escolas. Com isso, fica vetado o uso dos aparelhos durante todo o período em que o estudante estiver na escola, incluindo intervalos.
O objetivo, de acordo com o Ministério da Educação, é promover um ambiente escolar mais saudável e equilibrado, além de resguardar a saúde física e mental dos estudantes. Apesar da proibição, o celular continua sendo uma ferramenta pedagógica em casos em que o professor determina que é importante a utilização das tecnologias dentro da sala de aula.
Aluna do 3° ano no Colégio Cívico-Militar Professora Helena Kolody, em Cambé, na Região Metropolitana de Londrina, Giovana Souza, 16, garante que não ficou surpresa com a notícia da proibição dos celulares dentro das escolas pelo fato de que alguns professores já haviam comentado sobre a possibilidade. Mesmo antes da lei, a jovem conta que já costumava aproveitar os intervalos para jogar com os amigos em vez de ficar no celular, então não foi uma mudança brusca: “não é algo que fez tanta falta nos intervalos”.
A principal dificuldade para a jovem é a comunicação com os pais, já que costumava avisar o pai se voltaria ou não de van para casa ou se preferia que ele a buscasse. Agora eles já deixam combinado a volta antes de saírem de casa.
Em visita ao colégio em Cambé durante um intervalo no período matutino, a reportagem notou que muitos estudantes pegam o lanche, uma cadeira e levam para a área externa da instituição, formando "rodinhas" de conversa. Outros optam por jogar pingue-pongue ou futebol nas quadras.
Antes, segundo Lucinéia de Angelis, diretora do Colégio Cívico-Militar Professora Helena Kolody, era comum ver estudantes sentados sozinhos e com a atenção voltada única e exclusivamente para o celular. “A gente observou que a interação entre eles melhorou. Antes tinha alunos que ficavam isolados no canto, cada um no seu celular, agora a gente percebe que eles interagem mais, fazem rodinhas e se juntam para jogar”, relata.
Para Angelis, a lei vem para reforçar um trabalho que já vinha sendo feito na instituição, principalmente envolvendo a conscientização e o diálogo sobre a não utilização do aparelho. Ao definir como um processo que leva tempo, a diretora garante que primeiro é necessário desconstruir hábitos antigos para poder construir novos junto aos estudantes. “Eu acho que a longo prazo nós vamos ter resultados muito positivos”, afirma.
Chefe do NRE (Núcleo Regional de Educação) de Londrina, Jéssica Pieri aponta que a orientação fornecida para as 122 escolas nos 19 municípios da região é que deve prevalecer o diálogo com toda a comunidade escolar, envolvendo tanto pais quanto os cerca de 70 mil estudantes da área.
“Toda mudança causa um desconforto a priori, porém nós precisamos nos adequar a essa legislação. A gente prima pelo diálogo, pelo entendimento e pela parceria com a escola e com a família para que, juntos, possamos construir esse modelo de trabalho dentro da escola com menos interferência do celular”, aponta.
No trabalho pedagógico, os alunos poderão continuar utilizando o aparelho, sendo que o objetivo da restrição é evitar as distrações, como o fato de muitos ficarem jogando no celular durante as aulas. Pieri ressalta a importância de as famílias compreenderem a importância da medida, assim como convida os pais a comparecerem às escolas dos filhos para conversar com a equipe pedagógica. “No diálogo a gente pode construir um aprendizado melhor para os nossos estudantes, quando a família e a escola trabalham juntas”, afirma.
Vitória Cubaski, 18, que está no 3° ano do ensino médio, concorda que o momento ainda é de adaptação, já que utilizar o celular era um hábito. Nos intervalos, ela mandava fotos da merenda todos os dias para a mãe, assim como nos horários de chegada e saída do colégio. “Mas ela sabe que eu estou aqui, que estou em segurança, então a gente vai vivendo”, garante.
Também no último ano, André da Costa Stasiak, 16, admite que é uma sensação estranha colocar a mão no bolso e não sentir o celular. Ele conta que percebeu uma melhora na aprendizagem nas primeiras semanas, já que conseguiu prestar mais atenção nas aulas. “A gente consegue copiar mais os conteúdos, interagir mais com os colegas e debater com os professores, o que é muito importante. A gente consegue aprender muito mais”, opina.
Angelis relata que alguns estudantes levaram o celular para a escola, mas reforçou que os aparelhos vêm sendo recolhidos pela equipe pedagógica. Ao final da aula, a direção conversa com o estudante antes de fazer a devolução. No caso de alunos reincidentes, os pais é que precisam fazer a retirada do aparelho. Inclusive, a diretora reforça a participação dos pais nesse processo, sendo que a maioria aprova a proibição do uso do aparelho na escola.
A instalação de caixas dentro de cada uma das salas de aula também está nos planos da instituição, para que os professores tenham um controle maior. Dessa forma, caso precise utilizar o aparelho em sala de aula para alguma atividade pedagógica, o docente pode comunicar os estudantes para que levem os celulares para o colégio no dia. “Ele vai guardar na caixa e depois retirar quando for pedido pelo professor”, explica, exemplificando o caso da necessidade de acessar as plataformas disponibilizadas pela Secretaria de Estado da Educação.
USO CONSCIENTE DA TECNOLOGIA
Jackson Almeida, analista de Políticas Educacionais do movimento Todos Pela Educação, avalia que a proibição dos celulares nas escolas traz uma série de benefícios, assim como alguns desafios relacionados à implementação. Dentre os pontos positivos, ele aponta a importância que a lei tem no combate à fragmentação da atenção do estudante dentro de sala de aula, promovendo um ambiente mais propício ao aprendizado e à interação entre os alunos.
“Mas para ser eficaz, essa medida precisa vir acompanhada de protocolos claros e estratégias pedagógicas que incentivem o uso consciente da tecnologia”, aponta, complementando que os resultados positivos precisam ser apresentados às famílias e aos estudantes para que exista esse engajamento.
O uso constante do celular, segundo o analista, afeta a concentração dos estudantes e fragiliza o processo de ensino-aprendizagem, fazendo com os professores precisem disputar a atenção do estudante. Por isso, ele reforça a importância de oferecer aos docentes capacitações para que possam trazer aulas dinâmicas e interativas.
Almeida pontua ainda que a lei permite a utilização do aparelho e das tecnologias para fins pedagógicos e de aprendizado, uso que já foi comprovado como benéfico por especialistas.
Durante os intervalos, o pesquisador ressalta que é fundamental que as escolas promovam atividades para que os alunos possam aproveitar o tempo junto com os colegas, ainda mais resgatando a atmosfera lúdica e criativa dos recreios. Segundo ele, jogos, esportes e espaços de convivência são boas opções de interação nos intervalos.

