BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O avanço acelerado no total de casos do novo coronavírus, os registros das primeiras mortes no Brasil e o temor de colapso na rede de atendimento fizeram o Ministério da Saúde rever as previsões iniciais para o enfrentamento da crise da Covid-19.

A pasta intensificou nos últimos dias as ações de prevenção e combate à doença. Entre as medidas estão facilitação de processos licitatórios, restrição de exportação de equipamentos, recomendação de suspensão de cirurgias e exames eletivos e reforço das equipes de profissionais de saúde.

Em apenas um dia, o número de casos do coronavírus passou de 291 para 428 no Brasil, de acordo com a atualização de dados do Ministério da Saúde nesta quarta-feira (18). Até a tarde desta quinta-feira (19), havia seis mortos -quatro em São Paulo e dois no Rio de Janeiro.

Diante desse cenário, o governo federal passou a adotar outras providências para garantir o atendimento da população e evitar um colapso do sistema de saúde.

Na quarta, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, afirmou que o governo implementará um serviço de telemonitoramento de sintomas do coronavírus, em nova ação para fazer frente à pandemia. Ele também defendeu o uso da telemedicina no combate ao vírus. Segundo ele, a ferramenta deve ser apresentada até sexta-feira (20).

Isso porque, pelos cálculos do ministério, 85% das pessoas que tiverem o novo coronavírus poderão ter tratamento simples, com atendimento médico básico e uso de antitérmico em casa. Já os outros 15% precisarão recorrer aos hospitais, parcela que, segundo Mandetta, está muito acima da capacidade do sistema, se os quadros de contágio se derem de forma concentrada.

O Ministério da Saúde estima que o Brasil enfrentará um período de estresse com a dispersão do novo coronavírus entre os meses de abril e junho e só a partir de julho o país entrará em um quadro de estabilização.

De janeiro para cá, quando foram anunciadas as primeiras medidas para o enfrentamento da doença, as ações do ministério passaram a ter escalas revistas pouco a pouco após exemplos do impacto causado pelo coronavírus em sistemas de saúde de outros países, como a Itália.

Inicialmente, era previsto o aluguel de mil leitos extras em UTIs (unidades de terapia intensiva), número planejado para minimizar gargalos em hospitais e equilibrar a alta ocupação dos leitos. Agora, o ministério trabalha com um cenário de oferta extra de 2.000 leitos temporários para cuidados intensivos, dos quais 540 já foram liberados.

Para secretários de Saúde ouvidos pela reportagem, no entanto, por mais que haja investimentos, não há garantia de que as medidas sejam suficientes -o que tem levado equipes a buscar novas soluções junto ao governo.

Esses gestores pediram, por exemplo, que empresas fossem proibidas de exportar equipamentos básicos de UTI para se ter garantia de aluguel e compra em caso de necessidade.

O ministério também já avalia requisitar leitos da rede privada e instalar leitos provisórios em escolas e contêineres -estes, destinados para primeiro atendimento. Outro ponto em análise é a transformação de navios de cruzeiro em hospitais.

Ao mesmo tempo que aumenta o leque de opções, o governo busca rever critérios para ocupação de serviços.

Na última semana, pediu a estados que suspendessem exames e cirurgias eletivos (programados), na tentativa de evitar sobrecarga na rede e coinfecção. Avalia ainda rever critérios de vagas de UTI.

"Nossa ocupação de leitos de UTI está na faixa de 78%. Temos 22% de ociosidade que vamos ter de usar com maior racionalidade", afirmou em entrevista coletiva nesta semana o secretário-executivo do ministério, João Gabbardo dos Reis.

A declaração mostra como a pasta tenta se equilibrar entre expandir serviços na rede e atenuar gargalos na rede. É o caso do funcionamento de postos de saúde e do número atual de médicos para atuar nestes locais.

Até o início do ano, o governo não tinha intenção de fazer novos contratos em capitais e cidades maiores que faziam parte do programa Mais Médicos. A exceção era a incorporação de cerca de 1.800 médicos cubanos que atuavam antes do fim dos contratos, em 2018, e decidiram permanecer no Brasil.

A chegada do novo coronavírus, no entanto, expôs parte do gargalo deixado na rede pela falta de reposições em um grupo de cidades, medida iniciada no último ano e que é apontada por especialistas como um dos motivos para uma queda no número de médicos na atenção básica --passou de 64.045, em 2018, para 62.837 no último ano.

Agora, a pasta anunciou edital para contratar 5.811 médicos pelo período de um ano. Ao mesmo tempo, já planeja até recrutamento voluntário de estudantes do último ano de medicina e de outras áreas da saúde para atuarem em funções de apoio.

Para o secretário-executivo do Conasems (conselho nacional das secretarias municipais de saúde), Mauro Junqueira, mesmo com o esforço em ampliação da rede, é cedo para saber se as medidas vão dar conta do impacto que pode ser gerado pelo novo coronavírus.

Ele faz um apelo para que haja colaboração da população para conter o vírus e, assim, preservar o sistema de saúde.

"Se vai funcionar ou não, depende muito das pessoas. É melhor eu ter um paciente em casa que contamina quatro, do que 1 na rua contaminando 80. O Brasil será a Itália amanhã, se a população não ajudar."