SÃO CARLOS, SP (FOLHAPRESS) - Um terreno hoje cercado por condomínios e conjuntos habitacionais de Presidente Prudente, no interior paulista, deve se transformar na principal jazida de fósseis de aves da Era dos Dinossauros no país.

Nos últimos anos, paleontólogos encontraram no local o primeiro crânio de uma dessas aves primitivas a ser descoberto no Brasil. Com idade entre 70 milhões e 80 milhões de anos, o animal tinha tamanho similar ao de uma pomba moderna e dentes no bico, a exemplo de seus parentes próximos, os demais dinossauros carnívoros.

Milhares de outros ossos fossilizados de aves também foram identificados no sítio paleontológico. "São, no mínimo, três espécies ainda não descritas de aves nesse material. Tudo indica que elas trocavam os dentes periodicamente, tal como os crocodilos de hoje", afirma William Nava, do Museu de Paleontologia de Marília, responsável por identificar e garimpar a riqueza pré-histórica do local desde 2004.

O crânio emergiu depois de meses de preparação de um bloco de rocha. Antes disso, Nava já tinha identificado uma pré-maxila (grosso modo, a ponta do bico) com dente e diversos outros materiais associados a aves do grupo dos Enantiornithes.

Esses animais também costumavam ter dedos com garras em suas asas, embora, de resto, fossem muito semelhantes a seus parentes atuais. Acabaram desaparecendo há cerca de 65 milhões, junto com os dinossauros ditos não avianos (ou seja, que não eram aves; a especificação é necessária porque, do ponto de vista evolutivo, aves também são dinos).

Fósseis de aves com essa idade são muito raros no Brasil e, em geral, são muito fragmentados, em parte por causa do tamanho pequeno e do esqueleto delicado desses animais. O único exemplar mais completo, com o tamanho de um beija-flor, foi identificado em rochas da chapada do Araripe, no Ceará, em 2015.

A anatomia dos novos fósseis está sendo estudada em parceria com dois argentinos, Luis Chiappe (paleontólogo que trabalha no Museu de História Natural de Los Angeles) e Agustín Martinelli, do Museu Argentino de Ciências Naturais, e também com o paleontólogo brasileiro Herculano Alvarenga, especialista em aves extintas.

Além da identificação das espécies e de suas relações de parentesco com outras Enantiornithes, os pesquisadores também estão tentando entender a grande concentração de indivíduos e espécies em pouco espaço do terreno. "Pode ter acontecido um evento catastrófico que transportou esses cadáveres por uma distância curta e os sepultou de modo relativamente calmo com lama fina, permitindo a sua preservação", explica Nava.

Apesar da localização em área urbana, o sítio está a salvo de futuros empreendimentos imobiliários. O local acaba de receber proteção oficial do município de Presidente Prudente - por sorte, o terreno pertence à prefeitura e foi tombado e cercado. Além dos restos de aves, os pesquisadores também já identificaram na área fósseis de lagartos, anfíbios, crocodilos, dentes de dinossauros herbívoros e carnívoros, escamas de peixes e coprólitos (fezes fósseis; ainda não se sabe a espécie que as defecou).