Rio, 02 (AE) - O ex-presidente do Banco Central (BC) Francisco Lopes foi indiciado por desvio de dinheiro público, hoje, no Rio, pela Polícia Federal (PF), no inquérito sobre a venda de dólares do BC aos Bancos Marka e FonteCindam, durante a mudança da política de câmbio brasileira.
Amanhã (03), o dono do Marka, Salvatore Alberto Cacciola
deve ser indiciado por gestão fraudulenta - mas a PF também apurou indícios de sonegação de impostos do banco carioca, fechado após a crise da alta do dólar, no início de 1999.
Chico Lopes não quis depôr ao delegado Luiz Pontel, responsável pelo inquérito, assim como se recusou a falar na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Bancos na Câmara dos Deputados e no inquérito no qual foi indiciado por evasão de divisas, no dia 11. Ele apenas ofereceu material gráfico - escreveu numa folha de papel, para que a letra e a assinatura dele sejam comparadas com a de outros documentos da investigação que teriam sido assinados por ele.
A PF informou que as assinaturas poderão ser usadas para comparar a letra de Chico Lopes com a do bilhete em que está escrito que o ex-presidente do BC tem no exterior US$ 1,67 milhão em nome do amigo e sócio na consultoria Macrométrica, Sérgio Bragança.
Chico Lopes pode receber pena de dois a 12 anos de prisão e multa por peculato, se a Justiça Federal abrir processo contra ele, depois de receber denúncia que o Ministério Público Federal (MPF) deve fazer, a partir do indiciamento de hoje. Para a evasão de divisas, a pena prevista é de dois a seis anos de prisão e multa.
O ex-presidente do FonteCindam, Luiz Antônio Gonçalves, também foi indiciado hoje por Pontel, por gestão temerária.
O advogado de Gonçalves, Técio Lins e Silva, disse que a medida é resultado da pressão do MPF. "O Ministério Público exige uma posição acusatória", afirmou Silva. "O indiciamento era inevitável porque senão ele (Pontel) iria ser processado", criticou.
Um dos motivos que levou ao indiciamento de Gonçalves foi o fato de os dólares que o banco comprou do BC foram usados para cobrir prejuízos na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) tanto do próprio FonteCindam como dos fundos de investimento que a instituições administrava. O BC informou à PF que o pedido feito pelo FonteCindam não incluía ajuda aos fundos.
Segundo Silva, uma carta enviada pelo FonteCindam ao BC, que está na folha 55 do primeiro volume do inquérito, comprova que a ajuda foi pedida tanto para o banco como para os fundos. A divergência, disse o advogado, é um "sofisma" porque, ao pedir ajuda, era óbvio que o banco, como administrador dos fundos, iria cobrir todos os prejuízos. "O fundo é o banco, em última análise", avaliou.
Amanhã, deverão ser indiciados Cacciola e a diretora-jurídica da instituição em janeiro den 1999, Cíntia Costa e Souza, por gestão fraudulenta, e o economista Luiz Bragança, irmão de Sérgio Bragança e sócio da Macrométrica, por tráfico de influência. O advogado de Cacciola, José Carlos Fragoso, afirmou que o Marka está sendo punido pela forma "atabalhoada" como o governo mudou a política cambial.
Os indiciamentos não devem significar o fim das investigações do caso Marka. A perícia realizada no banco de Cacciola apontou também indícios de que a instituição praticou sonegação de impostos e superfaturamento de balanço, entre outros crimes, e a Receita Federal vai ser informada do fato, segundo agentes da PF.
Os dois bancos compraram dólares para cobrir prejuízos que teriam com aplicações na BM&F, depois de Chico Lopes assumir a presidência do BC, com uma nova política de câmbio que fez a cotação do dólar passar de US$ 1,22 para US$ 1,32, em 13 de janeiro de 1999. Para cumprir os contratos de venda de dólar a US$ 1,22 no mercado futuro, o Banco Marka comprou a moeda norte-america a US$ 1,27, e o FonteCindam, a US$ 1,32.
Segundo Silva, a compra do FonteCindam foi legal e "até um pouco acima" do teto máximo do valor da moeda estipulado pela política de Chico Lopes. O relatório da CPI dos Bancos, no entanto, condenou a operação, que teria dado um prejuízo de R$ 1 57 bilhão ao BC.