Brasil é único país a abrir concurso público para agente secreto
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segunda-feira, 10 de janeiro de 2000
Por Wilson Tosta
Rio, 10 (AE) - Um concurso público para agente secreto. A contradição consta de edital publicado no dia 27 no "Diário Oficial" da União (DOU) pelo Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, abrindo processo seletivo para preencher 54 vagas de analista de informações da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
O cargo é o mesmo de Temilson de Rezende, o "Telmo", suspeito de ter feito o grampo ilegal no Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A historiadora Priscila Antunes, que elabora tese sobre a Abin, diz que o Brasil é o único país do mundo que escolhe publicamente os "arapongas".
"Pela Constituição, não tem jeito: tem de ter concurso", disse ela. A pesquisadora explicou que o órgão precisa preencher vagas abertas por aposentadoria, morte ou desligamento de agentes, remanescentes do Serviço Nacional de Informações (SNI), da ditadura. Muitos funcionários saíram da área de informações do governo, afirmou, para a de segurança privada. O SNI acabou em 1990, substituído pela Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE). Só em 1999 foi sancionada pelo presidente Fernando Henrique Cardoso a Lei 9.883, que criou a Abin, em substituição à Subsecretaria de Inteligência.
A exigência legal de realização de concurso público para contratar pessoal que fará trabalho sigiloso na Abin tem gerado piadas sobre a capacidade do órgão de manter sigilo sobre si mesmo, requisito básico para sobrevivência de um serviço secreto. Para preservar de identificação pública os participantes da seleção, eles serão identificados pelos números de inscrição. O edital está disponível na home page http://www.cespe.unb.br, que descreve as atribuições, o trabalho e as habilidades exigidos de um agente da Abin.
Um analista, diz o edital, deve fazer "pesquisa em redes de informações", "entrevistas em língua portuguesa e em idioma estrangeiro" e "obtenção de dados valendo-se de técnicas e meios sigilosos, com irrestrita observância aos direitos e garantias individuais e fidelidade às instituições e aos princípios éticos que regem os interesses e a segurança do Estado." Entre as habilidades relacionadas para o cargo, são citadas no edital "memorização de nomes, conceitos e instruções orais e escritas", "pertinácia e resistência ao trabalho rotineiro", "capacidade de agir sob pressão e em situações imprevistas" e "habilidade para interagir com pessoas de meios socioculturais distintos". O agente da Abin, de acordo com o texto, terá direito a contratação pelo Regime Jurídico Único (RJU), 40 horas semanais de trabalho e salário inicial de R$ 2.313,48 brutos.
Ser brasileiro ou português, ter curso superior em qualquer área e 18 anos completos quando iniciar o Curso de Formação em Inteligência são requisitos básicos para ingressar na Abin. Haverá provas de conhecimentos gerais (noções de Direito, História e Geografia), português e idioma estrangeiro a escolher (inglês, russo, francês, espanhol, árabe e alemão).
"Hoje, tem muita gente na Abin na faixa de 20 a 30 anos", disse Priscila. Ela deverá defender em abril a tese, no Departamento de Ciência Política e Antropologia da Universidade Federal Fluminense (UFF).