Brasília - As cenas dos momentos de folga do presidente Jair Bolsonaro (PL) no litoral catarinense, enquanto a Bahia enfrenta crise gerada pelas fortes chuvas, têm constrangido aliados e membros do governo federal. Parlamentares da oposição ainda intensificam as críticas e cobraram que o mandatário suspendesse os dias de praia para liderar a ajuda diante da tragédia na Bahia.

Bolsonaro teria sinalizado a aliados que pode ceder e ir ao estado, mas não foi assertivo nem confirmou uma data para antecipar o fim do descanso
Bolsonaro teria sinalizado a aliados que pode ceder e ir ao estado, mas não foi assertivo nem confirmou uma data para antecipar o fim do descanso | Foto: Vilmar Bannach/Photo Press/Folhapress

Até a tarde desta terça (28), a Bahia contabilizava 34.163 desabrigados e 42.929 desalojados, de acordo com dados enviados pelas prefeituras e tabulados pela Sudec (Superintendência de Proteção e Defesa Civil). O número de municípios em situação de emergência já chega a 136. Segundo o governo, 471.786 pessoas já foram afetadas pelo desastre natural, e 21 morreram em decorrência dos temporais.

Para amenizar as críticas, o governo federal montou uma força-tarefa para divulgar as respostas de Bolsonaro à tragédia, mas o principal anúncio de liberação de verba à Bahia gerou confusão. Os canais oficiais, além de auxiliares do presidente, divulgaram fala de Bolsonaro que indicava abertura de crédito de R$ 200 milhões somente para o estado, mas uma MP (medida provisória) publicada na terça-feira distribuiu esta verba para reconstruir rodovias em cinco estados do país.

O governo ainda não explicou se editará nova medida para liberar esta cifra apenas à Bahia. O anúncio frustrou gestores e parlamentares baianos.

O governador Rui Costa (PT) reclamou de o estado ter recebido R$ 80 milhões com a MP. "Com R$ 80 milhões não dá para recuperar da Bahia, pelo estrago que tem. Tem vários rompimentos", disse ele na terça ao lado de ministros de Bolsonaro.

Reservadamente, auxiliares do presidente reconhecem que o ideal seria ele suspender a folga e viajar às áreas atingidas. Consideram, porém, difícil Bolsonaro dividir espaço com o governador petista da Bahia nas ações.

Bolsonaro teria sinalizado a aliados que pode ceder e ir ao estado, mas não foi assertivo nem confirmou uma data para antecipar o fim do descanso. Na segunda-feira (27), afirmou que "espera não ter de retornar antes" do feriado de Réveillon no litoral catarinense.

O deputado João Carlos Bacelar (PL-BA) disse que Bolsonaro deve visitar o estado quando for mensurada a tragédia. "Agora é hora de resgatar as vítimas, para depois vir a reconstrução." Ele afirmou que o governo prometeu entregar toda a ajuda que for necessária ao estado. "Se [Bolsonaro] chega lá hoje e amanhã chover mais, aí volta amanhã de novo? É preciso saber qual o tamanho do problema. Ele vai", declarou Bacelar.

Para a oposição, Bolsonaro age com desdém à crise causada pelas chuvas e terceiriza responsabilidades. "Bolsonaro já mostrou que é indiferente ao sofrimento dos brasileiros: ironizando pacientes com falta de ar devido à Covid, omitindo-se diante da miséria que levou brasileiros a disputar ossos para comer e, agora, divertindo-se nas férias enquanto baianos morrem e ficam desabrigados graças às fortes chuvas", disse o líder da oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ).

Como parte da mobilização para abafar as críticas ao presidente, ministros têm destacado que as ações de ajuda à Bahia foram orquestradas por Bolsonaro.

João Roma (Cidadania), potencial candidato ao governo baiano, escreveu no Twitter que "estamos juntos trabalhando para minimizar o sofrimento". "Essa é a orientação do presidente Bolsonaro", completou.

O vice-presidente, Hamilton Mourão (PRTB), também está de folga. Ele descansa com a família em Aratu, no litoral da Bahia. A assessoria do general disse nesta quarta (29) que não há previsão de Mourão ir às áreas atingidas.

Deputados que compõem a base aliada do governo minimizam as críticas. Apoiadora do presidente, a deputada Bia Kicis (PSL-DF) afirma que Bolsonaro já esteve na Bahia no início de dezembro para sobrevoar cidades que afetadas pelas chuvas. "A equipe dele está lá, tem quatro ministros lá e o presidente já esteve lá no começo do mês, até mesmo antes do governador. O presidente precisa descansar para aguentar o rojão. Essas críticas são absolutamente descabidas", afirmou.

Nessa mesma viagem, o presidente causou aglomeração ao percorrer a cidade e atacou medidas de combate à Covid-19. Jornalistas ainda foram agredidos por seguranças e um apoiador do presidente.

AGLOMERAÇÃO

Bolsonaro voltou a provocar aglomeração na manhã desta quarta-feira (29), em São Francisco do Sul. O passeio teve início por volta das 10h, quando o presidente saiu de jet ski da praia do Forte Marechal Luz. Na praia, banhistas gritavam o nome do presidente e pediam para que ele se aproximasse, mas Bolsonaro seguiu sem dar atenção a esses apoiadores. Em seguida, foi visto na Ilha da Paz, costa da praia de Ubatuba, por pessoas que transitavam de barco pela região. Depois, Bolsonaro foi até a praia da Enseada, mesmo local em que esteve na terça, e, sem máscara, foi recebido por apoiadores que se aglomeraram dentro da água.