Doha, Qatar - Após dizer que o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) finalmente começou a adquirir as feições de seu governo conservador, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) declarou nesta quarta-feira (18) que a prova nunca serviu para medir o conhecimento dos estudantes.

O Brasil, segundo o presidente Jair Bolsonaro, vive uma situação de atraso educacional
O Brasil, segundo o presidente Jair Bolsonaro, vive uma situação de atraso educacional | Foto: Alan Santos/PR

"Olha o padrão do Enem no Brasil. Pelo amor de Deus. Aquilo mede algum conhecimento? Ou é ativismo político e na questão comportamental?", declarou Bolsonaro durante visita ao Qatar, parte de seu giro pelo Oriente Médio. Apesar disso, o presidente assegurou que não viu a prova deste ano com antecedência. "Não vi, não vejo, não tenho conhecimento", declarou.

A realização do Enem, cujo início está marcado para o próximo domingo (21), foi abalada nos últimos dias pela renúncia de diversos servidores dos cargos de chefia que mantinham no Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), organizador da prova.

Como razão para isso, citaram falta de capacidade gerencial da direção do órgão, e fragilidade técnica e administrativa. Para o governo, o motivo real foi uma disputa por valores de gratificação, o que os servidores negam.

A base conservadora do presidente sempre teve o Enem como um dos seus alvos prediletos, por mencionar temas como identidade de gênero, direitos humanos e minorias, seja em questões ou na redação. Bolsonaro, na entrevista, reforçou essa opinião. "Você gostava dos temas do passado? Pelo amor de Deus. Você tem família, tem filhos, que temas esquisitos esses que havia no passado. Acaba com isso", afirmou.

O Brasil, segundo Bolsonaro, vive uma situação de atraso educacional. Para ilustrar esse fato, ele deu o exemplo de uma escola não especificada, que teria trocado as datas da Independência e da Proclamação da República. "Eu vi uma escola agora dizendo que era feriado dia 15 de novembro em virtude da Independência do Brasil. Pelo amor de Deus, será que não sabe o básico, quando é a Independência do Brasil, quando é a Proclamação da República?"

Bolsonaro deu as declarações no final de uma viagem que o levou a Emirados Árabes Unidos, Bahrein e Qatar. Ele citou estes países como exemplos educacionais. "Tive agora num país, o Bahrein, que tem 35 km por 15 km [de território], é um retângulo. Olha o que eles são, olha o que nós não somos. A mesma coisa aqui no Qatar, você vê progresso, desenvolvimento".

Segundo ele, o Brasil precisa se aproximar destes e outros países com bons indicadores de ensino. "O que falta para nós, brasileiros, para chegarmos a esse desenvolvimento? Falta a gente se aproximar de países como Qatar, Emirados Árabes, Israel, Coreia do Sul, e trocar informações".

O presidente afirmou que nestes países, ao contrário do Brasil, a educação sempre foi prioridade. "Aqui tem investimento pesado em educação séria, não essas besteiras que nós vemos no Brasil."

CONVITE

A Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (17) um convite para que o ministro da Educação, Milton Ribeiro, compareça ao colegiado para explicar as denúncias de assédio moral e os pedidos exonerações ocorridos no Inep.

No requerimento, o deputado Israel Batista (PV-DF) pede que ele esclareça "aos parlamentares e à sociedade sobre os principais pontos que envolvem o Enem 2021 diante desses fatos tão relevantes no momento que antecede o exame de maior abrangência da educação brasileira".

Israel queria convocar o ministro, o que tornaria a presença obrigatória, mas o pedido foi transformado em convite após sugestão do deputado Aluisio Mendes (PSC-MA).Ribeiro não é obrigado a comparecer, mas já avisou aos deputados que deve ir ao colegiado em 8 de dezembro, após a realização das provas, marcadas para os próximos dias 21 e 28.

O presidente do Inep, Danilo Dupas Ribeiro, também negou nesta quarta-feira que haja interferência do Palácio do Planalto na elaboração das provas do Enem. "Não houve interferência alguma do Palácio do Planalto, não houve. A cara do nosso governo, no caso, é a gestão do senhor ministro Milton Ribeiro, a seriedade e a transparência. Não houve interferência do Palácio do Planalto em decidir ou escolher qualquer item da prova ou tema de redação. Não houve qualquer tipo de interferência nisso", disse durante audiência em comissão do Senado.