O número de casos de crimes virtuais tem aumentado de forma significativa no pós-pandemia da Covid-19. Em Londrina, não são poucos os relatos de moradores e estabelecimentos comerciais que passaram a ser visados para essa prática criminosa, que na maioria dos casos busca uma vantagem financeira.

Além de crescimento dos casos, houve uma migração de criminosos para o mundo digital
Além de crescimento dos casos, houve uma migração de criminosos para o mundo digital | Foto: iStock

A empresária londrinense Patricia Palmieri Marconi, proprietária do Mestizzo Bar, tem convivido com o uso indevido do nome do seu estabelecimento. À FOLHA, ela conta que dois perfis falsos no Instagram já foram criados usando o nome do local. “Eles entram em contato com os meus contatos, e falam para participar de uma promoção e dão um link para eles entrarem”, relata, citando que precisou criar um destaque na rede social alertando para o problema. Além disso, Patrícia registrou um boletim de ocorrência.

“Eu sei de vários estabelecimentos que foram lesados, é um crime que está acontecendo muito [em Londrina], não só com Instagram, com Facebook, mas com o WhatsApp e contas de aplicativos”, completa.

A percepção local do aumento de cibercrimes está alinhada ao cenário estadual. A FOLHA publicou em 2022 um levantamento do Nuciber (Núcleo de Combate aos Cibercrimes) que aponta um crescimento de 325% de ocorrências no pós-pandemia - em 2019 foram cerca de 4 mil atendimentos e, em 2021, quase 17 mil no Paraná.

O advogado e especialista em direito virtual Fernando Peres protocolou, em agosto de 2022, um pedido na Sesp (Secretaria de Estado da Segurança Pública) para a instalação de um Nuciber em Londrina. Hoje, o único está localizado em Curitiba e atende apenas residentes da capital, além de auxiliar outros órgãos da PCPR (Polícia Civil do Paraná). A solicitação foi feita em nome do projeto Segurança na Rede, que tem Peres como coordenador.

Hoje, os crimes virtuais mais comuns, segundo Peres, são aqueles que buscam vantagens financeiras das vítimas, e que são praticados de uma maneira organizada. Mas existem crimes diversos, como os que ofendem a honra. “São velhos crimes cometidos por novos meios, como o estelionato, a fraude.”

Para o advogado, houve, além de um crescimento dos casos, uma migração de criminosos para o mundo digital. “A gente pode pensar em no mínimo 200% a 300% de aumento no número de ocorrências de crimes. Nós ficamos mais tempo em casa, e os criminosos também”, diz o especialista, apontando uma maior vulnerabilidade das pessoas a partir do consumo de mais serviços digitais.

A londrinense Larissa, que preferiu não ter o sobrenome divulgado, foi vítima de uma tentativa de golpe no ano passado. Ela relata que outra pessoa usou uma foto sua e entrou em contato com sua mãe pelo aplicativo WhatsApp. “Não chegaram a pedir nada, porque minha mãe bloqueou as duas vezes e denunciou o número”, afirma. “Assim que tentaram se passar por mim, ela ‘se ligou’, ligou no meu número mesmo e descobriu que era golpe.” A suspeita é que tanto a foto quanto a informação da família de Larissa tenham sido retiradas de outra rede social, o Facebook.

Procurada, a Polícia Civil informou que “investe na formação constante de seu efetivo, assim a meta é que todas as delegacias tenham policiais capacitados para a investigação de crimes cibernéticos. Para isto, também foram elaborados manuais de procedimentos que guiam a atuação investigativa nos diferentes tipos de crimes e situações”. Também, ressaltou que os atendimentos “permanecem focados nas delegacias da Polícia Civil.

PESQUISA

O projeto Segurança na Rede realizou, em 2022, uma pesquisa sobre segurança no mundo on-line. A pesquisa foi feita no site do projeto e compartilhada em redes sociais, chegando a usuários de 18 estados, além do Distrito Federal. No total, foram 12.364 participantes, sendo que 39% afirmaram já ter sido vítimas de crimes na internet, 81% disseram fazer compras pela internet e 47% relataram ter tido problemas na compra ou no recebimento de produto.

A pesquisa aponta que 77% dos participantes disseram não saber como proceder caso se tornem vítimas, e 89% responderam que não acreditam estar integralmente protegidos ao acessar a internet. Os crimes mais recorrentes, segundo o levantamento, foram ataque à honra (48%), fraude financeira (29%), estelionato (28%), ameaça (22%) e falsa identidade (18%).

ATENDIMENTO

A demanda pela instalação de uma delegacia especializada em Londrina se dá porque a concentração de cibercrimes não é apenas na capital, segundo o advogado Fernando Peres. Ele acredita que uma unidade do Nuciber na cidade seria “extremamente importante para acolher as vítimas da cidade e da região”.

“Esses crimes acontecem no estado todo, e há só uma delegacia para conduzir hoje. Em quantidade, os crimes virtuais talvez ultrapassem a quantidade da maioria dos outros casos. Existem várias outras delegacias especializadas em Londrina, o que é excelente, mas concentrar isso apenas na capital faz com que a gente não consiga resolver todos os casos. A polícia é competente, tem conhecimento, tem toda a expertise, mas acaba concentrando muito. Talvez, em muitos dos casos, somente os principais crimes acabem sendo conduzidos, os mais comuns. A polícia recepciona, acolhe a vítima, mas a capacidade, em nível de quantidade, é quase impossível de lidar”, acredita o advogado.

A existência de um núcleo especializado, portanto, aponta ele, ajudaria não só na repressão e no combate aos golpes virtuais, mas também na prevenção. “A ideia do projeto Segurança na Rede nasceu porque a maioria dos crimes cibernéticos que acontecem hoje ocorre por pequenas falhas, pequenos procedimentos, precauções, garantias que deveriam ter sido tomadas pela vítima e que teriam evitado toda a ocorrência de um crime. A existência de uma delegacia pode ajudar e, sem dúvida, é muito importante para a prevenção.”

O Nuciber apresenta uma série de recomendações sobre como agir no caso de ser vítima de golpe. Primeiro, é preciso manter a calma e não excluir nenhuma conversa, postagem, mensagem, vídeo, áudio ou qualquer indício do crime. Caso o autor insista no contato, é recomendável bloqueá-lo. A delegacia pede que não seja realizado nenhum pagamento, nem sob ameaça, e que não seja mantido contato com o autor para tentar descobrir sua identidade. É importante fazer prints das informações mais importantes, como dados de pagamentos, trechos de conversas, além de informações dos perfis dos autores. É preciso anotar data e horário dos fatos e da coleta das provas, e, caso tenha alguma conta ou cartão envolvidos, entrar em contato com o banco ou operadora - também é preciso bloquear temporariamente ou mudar a senha da conta e contestar transações fraudulentas ou enganosas. O registro da ocorrência pode ser feito pelo site da Polícia Civil (www.policiacivil.pr.gov.br), em uma delegacia ou no Nuciber, na Rua Pedro Ivo, 672, no Centro de Curitiba, apenas para moradores da capital.

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