Ato público foi na quadra de esportes do conjunto Avelino Vieira (zona oeste), um dos locais preferidos de Matheus Evangelista, morto precocemente de forma violenta
Ato público foi na quadra de esportes do conjunto Avelino Vieira (zona oeste), um dos locais preferidos de Matheus Evangelista, morto precocemente de forma violenta | Foto: Fotos: Ricardo Chicarelli



Matheus Ferreira Evangelista sonhava em se tornar jogador de futebol profissional, assim como grande parte dos garotos de sua idade. As partidas disputadas com amigos do bairro eram sua diversão favorita e ocupavam parte de seu tempo, dividido também entre os estudos no segundo grau e o trabalho como marceneiro. Na tarde de domingo (18), a quadra de esportes do conjunto Avelino Vieira (zona oeste), um dos locais de lazer preferido do londrinense de 18 anos, acabou se tornando palco de um protesto contra sua morte precoce. Cerca de 70 pessoas, incluindo familiares, amigos, professores e representantes de coletivos ligados a cidadania, ao movimento negro e aos direitos humanos se reuniram para pedir a elucidação do assassinato de Matheus, morto com um tiro no último dia 11, na zona norte da cidade.

Matheus participava de uma festa de aniversário de um colega, no Jardim Porto Seguro, quando três guardas municipais chegaram ao local para atender a uma denúncia de perturbação ao sossego. Na versão deles, o jovem já estava ferido e após prestarem os primeiros socorros, o encaminharam o Hospital Universitário, onde o londrinense acabou morrendo por não resistir aos ferimentos. Entretanto, testemunhas contestaram a versão dos guardas municipais e apontaram um deles como o autor dos disparos que feriram a vítima.

"A gente ficou sabendo que os guardas municipais teriam voltado à casa onde acontecia a festa e ameaçaram as pessoas que estavam lá para que não contassem sobre o que viram. Estamos com muito medo", afirmou uma das irmãs de Matheus durante o protesto que aconteceu na tarde de domingo. Ela contou que o irmão era um jovem trabalhador e sem nenhuma passagem pela polícia. "O Matheus era muito sorridente e tranquilo. Ele jamais se envolveu em brigas ou confusões. A gente recebeu com muita surpresa a notícia da morte dele. Está sendo muito difícil para toda a minha família lidar com toda essa situação", acrescentou.

Amigo de Matheus desde a infância, o estudante Teo Teodoro destacou que Matheus era muito estável emocionalmente. "Ele não tinha nenhum traço de revolta e era um jovem muito humilde. A gente estudava junto e jogava bola todas as semanas e nesses anos todos eu nunca vi ele brigando com ninguém. Acho quase impossível que ele tenha se envolvido em qualquer tipo de confusão na festa onde foi morto", ressaltou.

"Não respeitaram o Matheus, assim como não repeitaram a Marielle (Franco, ex-vereadora do Rio de Janeiro assassinada na semana passa), e não respeitam ninguém. A gente não pode usar boné, bermuda, correntes e roupas típicas da periferia que os policiais já chegam nos intimidando como se fossemos bandidos. Isso tem que acabar", afirmou outro amigo de Matheus que não quis se identificar por medo de represálias.


Contra a violência - Sob gritos de "Matheus, presente! Mariele, presente!", representantes de coletivos londrinenses reforçaram a importância da união da comunidade contra todos os atos de violência que têm acontecido na cidade. "A gente fica se questionando: será que se os guardas municipais tivessem sido chamados para atender a mesma ocorrência em um bairro de classe média alta eles teriam tido esse mesmo tipo de abordagem tão truculenta? É claro que não. Assim como a gente sabe que em qualquer circunstância, o negro é sempre visto como o principal suspeito, assim como aconteceu com o Matheus, que era negro. Que este caso sirva para a gente se unir de uma vez por todas contra esse estado de calamidade que vivemos", salientou Vanilda Rodrigues Pereira, representante do Coletivo do Movimento Negro de Londrina.

"Em menos de um ano, foram registradas cinco mortes envolvendo guardas municipais de Londrina. Será que não está na hora da secretaria de Defesa Social refletir sobre isso e pensar numa solução? Com o objetivo de acabar com esse tipo de ocorrência criamos hoje (18) na internet o abaixo-assinado 'Desarmem a Guarda Municipal de Londrina Já'. Quem tiver interesse em assiná-lo basta acessar o site avaaz.org", informou Carlos Santana, coordenador do Centro de Direitos Humanos de Londrina.

O Coletivo de Combate ao Genocídio de Jovens havia criado um outro abaixo-assinado para colher assinaturas favoráveis pelo desarmamento da Guarda Municipal. Entretanto, o mesmo foi retirado da internet pelos organizadores que ficaram com medo de represália após receberem informações de que um guarda municipal teria feito ameaças à iniciativa nas redes sociais. O caso foi parar na Ouvidoria-Geral da Prefeitura de Londrina. À FOLHA, o ouvidor-geral, Alexandre Sanches Vicente, confirmou o recebimento da denúncia e disse que não poderia fornecer mais detalhes do caso, mas que "uma resposta será dada ao autor do protocolo em 20 dias".

O assassinato de Matheus Ferreira Evangelista está sendo investigado pela Polícia Civil. O guarda municipal Michael de Souza Garcia foi preso na noite da última quinta-feira (15) por suspeita de envolvimento na morte do jovem. O pedido de prisão foi solicitado pela Delegacia de Homicídios. A prisão temporária, pelo prazo de 30 dias, foi determinada pela juíza Elisabeth Kather, da 1ª Vara Criminal de Londrina. A Justiça também determinou o afastamento de outros dois agentes de suas funções.