Londrina - A casinha de madeira pintada de azul é como qualquer outra da Vila Guarujá, na área central de Londrina. Não fosse pela placa "Centro de Umbanda Cachoeirinha de Xangô", pregada sobre os lambrequins que adornam a parede sobre a janela frontal. O telhado ainda guarda marcas das chuvas de pedra que costumavam cair por lá. Culpa da frieza; não do granizo, mas da intolerância religiosa.


Esta semana, as mães de santo Cláudia Ikandayô e Bete Obaloby, que há dez anos lutam para manter o centro na Rua Humberto Picinin, acompanharam com apreensão a história da garota de 11 anos que levou uma pedrada na cabeça ao sair de um culto de Candomblé na zona norte do Rio de Janeiro. Segundo a família da menina, antes de fugir em um ônibus, os agressores gritaram: "Sai Satanás, queima! Vocês vão para o inferno".


Cláudia lembrou do medo que sentiu ao escutar o barulho das telhas quebrarem com as pedras da intolerância. "Só quem já sofreu essa perseguição sabe o que isso representa. No meu caso, a pedra não me acertou, mas a dor é mesma", solidarizou-se Cláudia. "As pessoas têm pouco conhecimento do que acontece dentro de uma casa de umbanda e têm uma visão deturpada, insistindo em nos demonizar. A umbanda não é isso", comentou.


As mães de santo londrinenses disseram notar um crescimento do preconceito nos últimos anos. O portão do centro que ficava aberto para a comunidade, hoje permanece trancado. "Estamos voltando ao tempo das senzalas, em que tínhamos que ir para o meio da mata tocar nossos tambores e cultuar nossos orixás", desabafou Cláudia. "Aqui deveria funcionar igual uma igreja, com as portas abertas, mas não tenho coragem de fazer isso. Esses atentados não ocorrem só no Rio, é no País inteiro", completou Bete.

DENÚNCIAS
De acordo com dados da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, no ano passado foram registradas 149 denúncias de discriminação religiosa por meio do canal de denúncias Disque 100. O Rio de Janeiro foi o estado com maior número de denúncias em 2014. Do total, 39 casos ocorreram no Rio e 29 em São Paulo. No Paraná, foram cinco denúncias.


O serviço foi criado em 2011, quando houve o registro de apenas 15 denúncias. No ano seguinte, foram 109 registros. O recorde foi registrado em 2013, com 231 ligações. Nos quatro anos, 22 denúncias partiram do Paraná. Os adeptos das religiões de matrizes africanas são as vítimas mais frequentes. "Tem gente evitando sair às ruas com as vestimentas por medo. Eu acho que não podemos nos esconder. Prefiro lutar contra a ignorância", disse Cláudia.


Elas lembraram do assassinato da mãe de santo Ya Mukumbi, em agosto de 2013. A líder religiosa, a mãe e a neta foram esfaqueadas por um vizinho que alegou ter sofrido um surto psicótico. Na época, o Ministério Público ofereceu denúncia apontando que a chacina teria sido motivada por intolerância religiosa. "É um crime que chocou a cidade pela barbaridade do ato, mas não conseguimos enxergar essa comoção das pessoas no dia a dia", lamentou Bete.