Por Felipe Werneck
Rio, 29 (AE) - A Arquidiocese do Rio pretende impedir na Justiça o desfile da Unidos da Tijuca, programado para a segunda-feira de carnaval, por considerar "crime de vilipêndio" a utilização da imagem de Nossa Senhora da Esperança em um carro alegórico da escola de samba. O cardeal-arcebispo dom Eugenio Sales já se reuniu com o governador Anthony Garotinho (PDT) para discutir o caso e advogado da Arquidiocese, Antônio Passos, procurou hoje o secretário da Segurança Pública, coronel Josias Quintal, para encaminhar uma representação contra a agremiação.
"Se não cumprir a ordem da polícia, a escola pode ser impedida pela Justiça de desfilar, porque estaria cometendo crime contra o sagrado ao misturar uma imagem santa com uma festa absolutamente profana e frenética", afirma o advogado, que é procurador do cardeal. "São pessoas que não têm visão de fé e podem ser processadas por crime de vilipêndio se não retirarem a imagem". O artigo 208 do Código Penal prevê pena de um mês a um ano de detenção - ou pagamento de multa - para quem "vilipendiar (desprezar) publicamente ato ou objeto de culto religioso".
Enredo - O português Fernando Horta, presidente de honra da Unidos da Tijuca, disse hoje considerar "estranha" a posição da Arquidiocese, porque, segundo ele, não houve um comunicado oficial sobre a questão e, após a visita que fez à quadra da escola, o advogado não teria feito restrições ao desfile. "Dizem que todo português é burro, talvez por isso eu não consiga entender algumas coisas da Igreja Católica, como o Padre Marcelo (Rossi) dançando com mulheres de biquini, mas sou católico, já fui até coroinha", disse Horta. "Não estamos hostilizando ninguém com o desfile".
O presidente da agremiação explicou que a imagem de Nossa Senhora da Esperança "está totalmente inserida no enredo". Ela deverá, segundo a programação da escola, vir ao lado de uma alegoria que homenageia o navegador Vasco da Gama. O enredo da Unidos da Tijuca, "Terra dos Papagaios... Navegar foi preciso", descreve a viagem de Pedro álvares Cabral e a chegada dos portugueses ao Brasil. "A imagem de Nossa Senhora, um presente do rei de Portugal para Cabral, foi a padroeira da viagem", conta. Guerra - Segundo Horta, caso a polêmica chegue à Justiça, será providenciada uma cortina para cobrir a imagem durante o desfile. "Se precisar cobrir a gente cobre", diz. "A maior Justiça é a Justiça de Deus, e acho que a igreja está defasada, com uma visão antiga, mas não queremos guerra", diz o presidente da Unidos da Tijuca.
O advogado da Arquidiocese não admite a entrada da imagem nem coberta. "O sambódromo não é local apropriado para cultivar a fé", diz. "A igreja não interfere no carnaval, mas também não deve deixar seu direito ser interferido".