Após fala de Caiado, Ministério da Saúde nega plano de confisco de vacina contra Covid (1)
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sexta-feira, 11 de dezembro de 2020
RENATO MACHADO E RICARDO DELLA COLETTA
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O Ministério da Saúde negou no fim da tarde desta sexta-feira (11) ter manifestado a intenção de confiscar ou requerer vacinas contra a Covid-19 que tenham sido adquiridas por estados.
A negativa ocorreu horas após o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), ter publicado em redes sociais que ouviu do ministro Eduardo Pazuello (Saúde) que toda vacina registrada, produzida ou importada no país, seria "requisitada, centralizada e distribuída aos estados pelo Ministério da Saúde".
Pazuello e o governador goiano se encontraram na manhã desta sexta-feira, em Goiânia, durante evento de inauguração de um hospital maternidade.
"Reiteramos que, em nenhum momento, o Ministério da Saúde se manifestou sobre confisco ou requerimento de vacinas adquiridas pelos estados", informou a nota do ministério.
Com a publicação de Caiado, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), também em rede social, reagiu. Ele afirmou que o governo federal "prevê o confisco de vacinas". O tucano e o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) travam uma guerra política em torno da imunização.
Caiado escrevera que ministério pretende "requisitar" todas as vacinas contra o novo coronavírus produzidas ou importadas pelo Brasil.
"Toda e qualquer vacina registrada, produzida ou importada no país será requisitada, centralizada e distribuída aos estados pelo Ministério da Saúde. Pazuello me informou isso aqui em Goiânia, hoje. Nenhum estado vai fazer politicagem e escolher quem vai viver ou morrer de Covid", escreveu Caiado.​ Ele afirmou que o instrumento utilizado pelo governo seria uma MP (Medida Provisória).
À reportagem o governador de Goiás disse que o objetivo da norma é garantir que não haja diferenciação entre estados na distribuição do imunizante. Ele argumentou que não se trata de um confisco.
"[Vai] deixar claro que toda a produção nacional ou importação está requisitada pelo Ministério da Saúde para que faça uma distribuição de acordo com o grupo de risco em cada estado", disse. "Requisitar existe na legislação brasileira e não tem nada de diferente do que pé feito a todo momento, o governo está tratando de saúde publica. Requisitar administrativamente é algo legal, é garantir isonomia a todos os brasileiros. Não pode admitir que numa politica de imunização um estado tenha preferência sobre o outro. É uma regra que existe no Brasil e no PNI [Plano Nacional de Imunização]."
Doria anunciou para 25 de janeiro o início da vacinação no estado de São Paulo com a vacina Coronavac, parceria do Instituto Butantan com a chinesa Sinovac.​
Apesar da negativa da Saúde, interlocutores afirmam que o governo Bolsonaro avaliou editar um decreto prevendo a requisição administrativa dos imunizantes, de acordo com uma lei de fevereiro deste ano. Mas a intenção foi questionada até por auxiliares de Bolsonaro, que apontaram que há grande risco de uma ação do tipo ser considerada inconstitucional pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
A possibilidade de uma requisição administrativa preocupa o governo paulista. Isso porque essa figura jurídica não é uma ação de compra e venda normal. Ela prevê, por exemplo, indenização posterior pelo bem requisitado, sem prazo determinado para o pagamento.
Interlocutores no governo paulista destacam que uma requisição administrativa seria uma medida desproporcional, que só se justificaria caso o estado se recusasse a vender as doses normalmente para o governo federal o que não é o caso, dizem.
O principal problema legal caso o governo adote essa medida, segundo interlocutores, é que Doria poderia argumentar que a lei brasileira não permite a requisição pela União de um bem público de outro ente federado.
Em rede social, Doria criticou a medida. "Os brasileiros esperam pelas doses da vacina, mas a União demonstra dose de insanidade ao propor uma MP [Medida Provisória] que prevê o confisco de vacinas", escreveu. "Esta proposta é um ataque ao federalismo. Vamos cuidar de salvar vidas e não interesses políticos."
Em seu discurso na inauguração do hospital, Pazuello disse que o plano de vacinação nacional é de responsabilidade do governo federal e que nenhum brasileiro terá vantagem, por morar em determinado estado.
"Nosso plano nacional de imunização é nacional. Nenhum estado da Federação será tratado de forma diferente, nenhum brasileiro terá vantagem sobre outros brasileiros", disse.
Em paralelo, o governo Bolsonaro deve editar uma MP liberando R$ 20 bilhões para a compra de imunizantes.
Esse valor, segundo o ministro Paulo Guedes (Economia), é o necessário para uma campanha de vacinação em massa. O objetivo da disponibilização do dinheiro ainda neste ano, mesmo sem a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) ter certificado alguma vacina contra a Covid, é permitir que os gastos entrem nas regras fiscais flexíveis vigentes em 2020 em razão da pandemia.
Por outro lado, o ministério não negou que pretenda centralizar as compras e distribuição. Uma fonte na pasta explica que o governo pretende adquirir todas as doses necessárias para imunizar a população brasileira, considerando o PNI (Plano Nacional de Imunização) como o único plano no país com a proposta de promover a vacinação contra a Covid-19. A princípio, porém, o governo não pretende implementar nenhum mecanismo que proíba estados de efetuarem suas próprias aquisições de vacinas.
Essa fonte compara as aquisições de vacinas com a compra de EPIs (Equipamentos de Proteção Individual), quando aviões brasileiros foram enviados à China para buscar os equipamentos, distribuídos depois a estados e municípios.
A fala, no entanto, pode ser vista como uma forma de afastar a pasta de uma medida mais autoritária, após reação negativa à proposta de requisitar e centralizar no ministério todas as vacinas.

