São Paulo - Principal causa de afastamento do trabalho no Brasil neste ano, a Covid-19 e suas sequelas têm levado hospitais privados a criar novos serviços para reabilitar pessoas que continuam com sintomas meses depois da infecção pelo coronavírus.

Programas de recuperação atacam esse problemas e procuram diminuir a taxa de reinternação
Programas de recuperação atacam esse problemas e procuram diminuir a taxa de reinternação | Foto: iStock

Nos primeiros seis meses de 2021, foram 64.861 afastamentos por mais de 15 dias relacionados à Covid, contra 37.045 de abril a dezembro de 2020, um aumento de 75%, segundo dados da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho.

Problemas na coluna lombar, que antes lideravam os afastamentos, agora estão em segundo lugar, com 17.831 casos.

A maioria dessas incapacidades é temporária, mas é preciso fazer a reabilitação precoce, de preferência iniciada ainda durante a internação, e conduzida por uma equipe multidisciplinar. Quanto mais rápido e coordenado esse trabalho, mais chances o paciente terá de se recuperar.

Estados e municípios também têm criado ambulatórios de reabilitação pós-Covid, mas a oferta no SUS ainda é muito inferior à demanda e há demora no início das terapias necessárias, segundo os médicos.

O Ministério da Saúde não tem dados oficiais do número de sequelados da Covid. Mas estudo recente publicado na revista científica The Lancet, o primeiro a analisar as sequelas da Covid um ano após a contaminação, mostra que metade dos pacientes continua com queixas 12 meses depois de contrair a doença, sendo as mais frequentes o cansaço e a fadiga muscular. Um em cada três também apresenta dificuldade de respirar.

Os programas de recuperação atacam esse problemas e procuram diminuir a taxa de reinternação, que está em torno de 20% em até seis meses. Entre os pacientes que passaram por ventilação mecânica, o índice chega a 40%, segundo estudo multicêntrico brasileiro.

Pacientes intubados precisam usar um bloqueador neuromuscular que paralisa completamente os músculos para que ventilador mecânico substitua as funções do pulmão. "Isso faz com que os músculos atrofiem muito rápido", diz a fisiatra Andréa Thomaz Viana.

"Reabilitação não é só fisioterapia. Muitos desses pacientes, pelo tempo que ficam intubados, sem respirar pelo nariz e sem engolir, têm fraqueza no músculo da deglutição. Então vão precisar de fonoaudiologia para não engasgar, de terapeuta ocupacional para fazer as adaptações temporárias. Como segurar um garfo se eu não tenho força? Engrossando o cabo do garfo", explica a médica.

Uma linha unificada de cuidados no pós-Covid tem sido o mote de outros serviços já estruturados, como os dos hospitais Albert Einstein, Sírio-Libanês e Hcor, em São Paulo, e o Moinhos de Vento, em Porto Alegre (RS). Entre os públicos, a Rede de Reabilitação Lucy Montoro, ligada ao Hospital das Clínicas de São Paulo, é uma das referências.Por meio da EEP (Escola de Educação Permanente), o HC vem ministrando vários cursos a distância de tratamento e reabilitação da Covid-19 destinados a profissionais de saúde de todo o país.

Em parceria com o Ministério da Saúde, por meio do Proadi-SUS, (Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do SUS), o Hospital Sírio-Libanês também pilota um projeto de reabilitação do pós-Covid em hospitais públicos.

Segundo a médica Amanda Santos Pereira, coordenadora do projeto, houve melhora de 26% da funcionalidade dos pacientes que tinham limitações causadas pela Covid, como não conseguir se alimentar, tomar banho ou se locomover sozinho.

No projeto estão envolvidos enfermeiras, nutricionistas, fisioterapeutas, médicos infectologistas e intensivistas, além de assistentes sociais que acompanham o paciente no pós-alta. "O paciente precisa ter consulta de seguimento no posto de saúde e reabilitação. E vai receber ligações do hospital todos os dias para saber se está seguro em casa."

O cuidado é importante. Levantamento recente do CDC (Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA) com 1,4 milhão de pacientes mostra, por exemplo, que o risco de miocardite (jnflamação do músculo cardíaco) é 16 vezes maior em quem teve Covid em relação a quem não teve. A infecção pelo coronavírus também aumenta os riscos de infarto e AVC (acidente vascular cerebral).

A meta do projeto é a redução do tempo de permanência na UTI. A média de permanência de pacientes nas terapias intensivas do SUS é de nove dias, o dobro das privadas. "Menor tempo na UTI significa menos sequelas", diz Pereira. Para Sérgio Okane, secretário de atenção especializada à saúde no Ministério da Saúde, o desafio agora é levar esse tratamento de excelência na reabilitação a todos os hospitais do SUS. Nos próximos três anos, o projeto atenderá cinco instituições selecionadas a cada seis meses.