Adoções caem 12% no Paraná em 2024
De janeiro a setembro deste ano, o estado realizou 428 adoções; no mesmo período do ano passado foram 479
PUBLICAÇÃO
quarta-feira, 06 de novembro de 2024
De janeiro a setembro deste ano, o estado realizou 428 adoções; no mesmo período do ano passado foram 479
Jéssica Sabbadini - Especial para a FOLHA

O número de adoções no Paraná caiu 12% nos nove primeiros meses de 2024 se comparado ao mesmo período do ano passado. De acordo com dados do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), foram 428 adoções entre janeiro e setembro deste ano contra 479 em 2023. O número, no entanto, ainda é superior ao registrado no mesmo período desde 2019, quando os dados começaram a ser computados.
A promotora Fabiana Pimenta Soares, da 22ª Promotoria de Justiça de Londrina, atua na área da Infância e explica que a redução no número de adoções entre 2023 e 2024 pode ter como causa alguns pontos, como o melhor funcionamento das políticas públicas que servem de suporte às famílias, permitindo controlar a situação de risco antes que a criança ou adolescente precise ser retirado da casa.
“Pode-se pensar em um menor número de crianças e adolescentes acolhidos, o que vai gerar, proporcionalmente, uma redução no número de crianças e adolescentes disponíveis para adoção”, aponta.
No Paraná, a idade mais procurada pelos adotantes é de crianças entre 4 e 6 anos, seguido de 2 a 4 anos. Essa também pode ser uma das justificativas para a queda de adoções, já que há poucas crianças disponíveis nesse perfil.
“Se a gente tem um número maior de adolescentes que estão disponíveis para adoção, nós não vemos o processo evoluindo, já que a maioria dos pretendentes prefere um perfil de criança de até 10 anos de idade”, explica. Por fim, aponta, a pandemia de Covid também pode ter contribuído para o cenário, já que prolongou o processo de adoção.
QUEM PODE ADOTAR?
A promotora explica que, no Brasil, é considerada como legal a adoção feita através de um processo judicial nas varas da Infância e Juventude, assegurando os direitos da família de origem, das crianças ou adolescentes e dos adotantes. Os menores que estão na fila da adoção costumam vir de lares em que os pais fazem uso de drogas ou que sofreram violências e abusos.
A adoção pode ser feita por pessoas maiores de 18 anos, independentemente da orientação sexual ou do estado civil. Uma das exigências é que os adotantes sejam, ao menos, 16 anos mais velhos do que a criança ou adolescente que pretendem adotar, assim como tenham capacidade financeira para garantir a criação integral.
Quem tem o desejo de adotar precisa comparecer na Vara da Infância e Juventude para preencher um formulário com os dados pessoais e protocolar documentos, como o atestado de sanidade física e mental e de antecedentes criminais.
“A partir daí, eles são encaminhados para a avaliação por uma equipe profissional encarregada de elaborar um estudo técnico para verificar se são motivos genuínos que estão levando essas pessoas ao desejo de adotar”, detalha, complementando que também são ministrados cursos que esclarecem como funciona o processo de adoção.
ADOÇÃO TARDIA
Um dado curioso é que o número de pretendentes costuma ser muito superior ao de crianças e, mesmo assim, a fila de adoção não é zerada. No Paraná, por exemplo, 465 menores estão disponíveis para adoção, sendo que 2.523 adotantes estão na fila; em Londrina, são 15 crianças e adolescentes para 172 pessoas aptas à adoção.
Isso acontece, de acordo com Fabiana Pimenta Soares, pela diferença no perfil escolhido pelos pretendentes. “De regra, o que se vê é que as pessoas têm uma preferência para adotar crianças de até, no máximo, 6 anos de idade, então se torna muito mais difícil o processo de incluir em uma família substituta aqueles que têm uma idade superior aos 7 anos”, esclarece.
A adoção tardia enfrenta alguns desafios, segundo a promotora, por conta da alegação de dificuldades na educação do adolescente por ele já trazer uma vivência anterior. “O desafio perpassa pela desconstrução em relação à adoção de crianças maiores de 6 ou 7 anos porque todos trazem a sua história”, destaca.
Soares ressalta que é fundamental que as famílias adotantes legitimem o passado desse menor e que, com o passar do tempo, o desenvolvimento do vínculo vai permitir que diversas situações possam ser mediadas de maneira natural e afetuosa, buscando a superação dos desafios e traumas.
MUDANÇA NA VIDA DA FAMÍLIA
Leila Donária, 39, foi adotada pela gerente do hospital em que nasceu aos três dias de vida após ser abandonada pela mãe na maternidade. Ela cresceu sabendo que era adotada, mas nunca teve a vontade de conhecer a história da família biológica. Donária, que é influenciadora e palestrante, explica que, apesar de ter sido adotada ainda recém-nascida, cresceu vivendo alguns dos traumas do abandono, sempre insegura e precisando da aprovação de outras pessoas.
Conforme foi crescendo, a vontade de também adotar sempre esteve presente, tanto que, após casar com o médico cirurgião Gabriel Libanori Ferreira e ter um filho biológico, Gabriel, ela viu que era hora de entrar na fila da adoção. A única exigência traçada no perfil é de que fosse uma criança de até 10 anos. Para ela, o momento em que o telefone tocou foi como se a “bolsa estivesse se rompendo”.
A ligação era da Vara da Infância e Juventude de Londrina, para informar que havia uma menina que poderia ser adoltada por ela. O processo não foi fácil, já que pessoas próximas achavam que o casal estava “louco” e que iriam “arrumar para a cabeça”, já que a criança poderia chegar com traumas. “As pessoas não estão preparadas para lidar com a adoção tardia”, relata.
Foi então que a Marta Bianca chegou em dezembro de 2019, com 9 anos e 9 meses de idade. Apesar da imensa alegria de ter a filha em casa, Donária conta que a família enfrentou algumas dificuldades, já que a menina enfrentava alguns medos e o vínculo ainda não havia sido criado.
Com a chegada da filha, Donária começou a estudar mais a fundo o que é a adoção, o que a fez ter autoconhecimento de sua própria adoção. E foi a partir daí que ela resolveu que era o momento de ir atrás da família biológica. Foi quando encontrou os irmãos de Bia, que moram em Arapongas. Além disso, a irmã caçula, que também foi colocada para adoção, vive no Japão e hoje aguarda ansiosa o dia em que finalmente vão poder se abraçar. “A Bia chegou para mudar a minha vida”, afirma, muito emocionada.
Para ela, a única motivação para adotar uma criança ou adolescente deve ser a de ter um filho, já que a adoção não deve ser tratada como um ato de caridade ou uma forma de dar um irmão para um filho biológico.

