Em tempo de pandemia, como milhares de pessoas do meu grupo, estou em casa, primeira coisa que redescobri como sendo o melhor lugar do mundo, além de ser alertada a todo momento: fique em casa! Em pouco tempo já fiz e refiz tudo o que havia para se fazer: mexo e remexo, seleciono, organizo, separo, arrumo num lugar, mudo, invento e reinvento, ando pelo quintal, cuido das flores, cozinho, alimento os gatos, tomo sol, leio o jornal. Limpo a casa inteira, aliás, como diz minha amiga.

Imagem ilustrativa da imagem Tempo de pandemia
| Foto: Marco Jacobsen

, já limpei tudo o que tinha para limpar.

O álcool corre solto, a água sanitária já danificou unhas, manchou os tapetes, mudou as cores , estragou roupas, tudo na ânsia de acabar com o monstro invisível. Até os gatos correm de medo do álcool gel. Isso quando não estou no celular inventando jogos e besteiras, rindo das piadas e conversando com os amigos para relaxar. A televisão angustia um pouco, pois, como dizia minha mãe, “só passa coisa ruim”... mas a gente quer saber das notícias, sejam elas boas ou más.

Assim vamos vivendo, aprendendo a lição da vida neste momento. Nessa clausura necessária, nosso tempo é precioso, se bem aproveitado. Podemos fazer incursões maravilhosas ao passado, quando, por exemplo, nos deparamos com uma caixa de fotos antigas, ao arrumar o armário. Aí nos perdemos e nos achamos, sorrimos e choramos, a saudade vem com tudo. Esquecemos da vida real, uma imensidão de sentimentos nos remexem por dentro, faz sofrer mas também desperta muitas alegrias esquecidas...ficamos ali por horas porque já não precisamos obedecer a horários, não temos compromisso maior, a não ser ficar em casa.

Ficamos tão envolvidos , até que um cheiro de queimado invade a casa para nos fazer voltar à realidade: o bolo que esquecemos no forno! Outra coisa positiva nesse tempo, para o nosso grupo de risco ( sinal que somos amados ) é a oração, o voltar-se para Deus, para as coisas essenciais da vida: com o tempo e a experiência que temos agora, faz tão bem ouvir, ler, refletir, religar, reconectar com Deus. E novamente vamos espiar cenas de nossa infância, a pureza da contemplação, a descoberta, as primeiras orações, a família que nos recebeu e nos falou de Deus, a Igreja que frequentávamos, as pessoas que nos inspiraram, o porquê da amizade, a descoberta do amor e da fraternidade.

Olhamos nossa história, uma longa caminhada, o sentido de estarmos aqui porque tudo nessa vida tem sentido, todo tempo é sagrado, até os mais difíceis e tristes, até aqueles que achamos que estão demorando demais para passar, dado o nosso imediatismo.

Em tempo de quarentena, vamos fazer, com menos sofrimento e mais leveza, a parte que nos cabe. Agradecer, se estamos em segurança, se temos uma casa, e nos solidarizar com quem sofre mais e tem menos, às vezes não tem nada, para viver essa tribulação onde todos são dependentes uns dos outros nessa luta. Com certeza sairemos dessa! Fortalecidos, transformados, com mais sabedoria, mais amor, e muito mais alegria porque tivemos tempo para dar o valor devido a esse tesouro que todos lutamos para preservar: a vida!

Estela Maria Ferreira, leitora da FOLHA