Estudo realizado pela NABU (União da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, na sigla em inglês) concluiu que a radiação do celular afeta a população de insetos.

Realizada pela renomada entidade alemã ligada ao meio ambiente, em parceria com duas ONGS, uma da Alemanha e outra de Luxemburgo, a pesquisa consistiu em uma metanálise de 190 estudos científicos recentemente publicados. A metanálise é uma técnica estatística que combina resultados provenientes de diferentes estudos.

Entre os estudos analisados, 83 deles foram considerados cientificamente relevantes. Dentro dessa menor amostra, 72 revelaram que a radiação teve um efeito negativo sobre as abelhas, vespas e moscas. Esses efeitos variaram desde a redução da orientação durante o voo – devido à perturbação dos campos magnéticos – até danos ao material genético e às larvas.

As pesquisas mostraram que a radiação do celular – em especial, do espectro magnético abrangido pelas redes de wi-fi – abre os canais de cálcio na membrana de certas células.

Com os canais abertos, as células absorvem mais íons de cálcio. O excesso de cálcio, por sua vez, pode desencadear uma reação bioquímica em cadeia nos insetos, afetando o sistema imunológico e interrompendo os ritmos circadianos.

Os ritmos circadianos regulam os ciclos de um ser vivo, como fome, sede, estar desperto ou dormindo.

CADEIA

O engenheiro agrônomo Décio Luiz Gazzoni, pesquisador da Embrapa Soja e membro do Conselho Agro Sustentável, destaca que os insetos são elos da cadeia alimentar.

“Trata-se de um sistema altamente complexo e, sempre que um dos elos da cadeia é rompido, ocorrem perturbações, com efeitos imprevisíveis. Nós, humanos, estamos situados no topo da cadeia, portanto, qualquer perturbação ou rompimento ao longo da cadeia afeta diretamente a espécie humana”, explica.

Como exemplos, o pesquisador cita a polinização, o controle biológico, a regulação do clima e a ciclagem de nutrientes. Esse último processo é a contínua transferência de substâncias entre o solo e as plantas, e vice-versa.

“Sem eles, a vida na Terra ou não existiria, ou seria muito diferente do que é. Se forem afetados serviços como polinização ou controle biológico de pragas prestados por insetos, a oferta de alimentos e de outros produtos agrícolas pode ser profundamente comprometida”, analisa.

DIFERENTE

Sobre os estudos em questão, o pesquisador lembra que a condução foi feita em laboratório, com as abelhas e outros insetos confinados, sendo obrigados a se submeter aos efeitos da radiação.

Ele salienta que a situação é totalmente diferente no campo e, nesse caso, é preciso considerar os conceitos de perigo e risco.

“O estudo mostrou que existe um perigo, ou seja, a radiação eletromagnética pode prejudicar as abelhas. Mas, para que exista um risco efetivo, as abelhas precisam ser expostas a esse perigo. E nós temos que considerar que as abelhas normalmente estão protegidas em matas, ou no interior de culturas, longe da radiação eletromagnética. Portanto, o estudo é um alerta para o perigo, mas o risco é baixo em condições rotineiras”, pondera.

EXPOSIÇÃO

O pesquisador entende que esse estudo deveria chamar a atenção para um eventual problema de saúde pública. “Ao contrário das abelhas, nós, humanos, estamos expostos quase 24 horas por dia à radiação eletromagnética dos celulares, das redes wi-fi ou a outras formas de radiação. Então fica a pergunta: qual o efeito sobre os humanos? Em meu entender, seria necessário estudar profundamente se o que foi verificado com abelhas se repete com humanos”, sugere.

MONITORAMENTO

A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) declarou, por meio de nota, que acompanha os estudos realizados pela OMS (Organização Mundial de Saúde) e também os estudos apresentados na UIT (União Internacional de Telecomunicações) que tratam dos efeitos do CEMFR (campo elétrico, magnético e eletromagnético) nos diversos meios e organismos.

“Salienta-se que, até o momento, nos estudos apresentados pela OMS e na UIT, não há manifestações conclusivas quanto à possibilidade de que a radiação de telefones celulares possa ter contribuído para o declínio dramático nas populações de insetos ao redor do mundo. Ademais, considerando apenas o trecho destacado do estudo em questão, e tendo em vista as competências da Agência, não há como avaliar os resultados deste estudo ou tecer comentários adicionais sobre ele, pois os normativos hoje existentes são voltados para análises de CEMRF e os efeitos diretos relacionados à saúde humana.”

Por fim, a Anatel destaca que “acompanha e continuará acompanhando os estudos internacionais sobre o assunto na OMS e na UIT, para poder avaliar a aplicação das recomendações internacionais nos normativos do país”.