Recentemente, uma fazenda de 60 hectares em Cambé (Região Metropolitana de Londrina) foi negociada por R$ 8,7 milhões. Como dizem os corretores, nada mau para um mercado desaquecido pelos preços baixos da saca de soja, bem mais favorável para quem está comprando do que para quem está vendendo. Ainda assim, um levantamento da FOLHA com base na tabela do Departamento de Economia Rural (Deral) da Secretaria Estadual da Agricultura e do Abastecimento, mostra que os anos 2020 têm sido um período de intensa valorização para as terras agrícolas do Estado.

A pesquisa anual de terras mostra que entre 2020 e 2025, o preço das terras da Classe A-II (as terras de boa produtividade para grãos, com necessidades básicas de manejo) na região de Londrina deu um salto muito maior que a inflação (36%), que o dólar (praticamente estagnado na comparação com cinco anos atrás), do Índice Bovespa da B3 (apreciação de pouco mais de 20%) e até do que a cotação internacional do ouro, que vive um boom pela instabilidade geopolítica global, mas que não passou de 100% de variação positiva no preço da onça durante o quinquênio.

Em Arapongas, por exemplo, o hectare da Classe II passou de R$ 58,3 mil para R$ 145 mil, valorização de 148%. Em Cambé e Rolândia, a valorização alcançou 139% e em Ibiporã, 128%. Em Londrina, a média do preço do hectare em 2020 era de R$53,5 mil em 2020. Em 2025, a tabela aponta valor de R$ 124,5 mil, alta de 132%.

No Estado, as terras mais valiosas estão concentradas em três regiões. Em nove municípios, a média do hectare ultrapassou os R$140 mil na tabela divulgada em 2025. Maringá lidera, com hectare de mais de R$150 mil, seguido de três municípios de código telefônico 43 - Arapongas, Mauá da Serra e Sabáudia. Completam a lista, outros três municípios de código 44, Paiçandu, Sarandi e Ivatuba e outros dois do Sudoeste, Pato Branco e Bom Sucesso do Sul.

Imagem ilustrativa da imagem Preço das terras agrícolas subiu mais que o ouro em 5 anos
| Foto: Folha Arte

Nos informes sobre a tabela, o corpo técnico do Deral destaca mais a variação anual de 6% entre 2024 e 2025, lembrando que o percentual está muito próximo do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e do Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI). “Isso mostra como o mercado de terras permanece com preços desaquecidos após a grande valorização das commodities ocorrida nos anos anteriores”, adverte o chefe do Deral, Marcelo Garrido.

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Contudo, os preços frustrantes da soja e o clima um tanto hostil dos últimos tempos em algumas regiões estão longe de estragar um período sublime para quem detém o valioso ativo. Quando o olhar se torna mais panorâmico e profundo, ter um bom pedaço de terra agricultável ainda faz toda diferença para qualquer família.

O organizador da tabela do Deral, o engenheiro agrônomo Carlos Hugo Godinho, responsável pelas análises de conjuntura do departamento, lembra que o preço da soja é o principal fator de influência no preço das terras no Paraná. De acordo com as tabelas das cooperativas, usando como base a terceira semana de maio, a saca de 60 quilos variou de R$ 98 em 2020 para R$ 115 em 2025. No entanto, os preços dispararam a partir de 2021, alcançando R$ 162 naquele ano e R$ 181 em 2022, com forte recuo a partir de então, de cerca de 35%.

“A variação do preço da terra tende a acompanhar mais as altas do que as baixas na cotação da soja. Quando teve o pico em 2022, o custo da terra acompanhou a tendência e acabou se estabilizando num patamar alto”, explica.

O advogado especialista em Direito Agrário e Imobiliário e proprietário da Agro+ Fazendas, Ricardo Krei Bandolin Filho, esclarece que a disparada no preço das commodities no pós-pandemia agitou o mercado de terras e que a queda de preço que se seguiu não afetou os valores, apesar de ter reduzido o número de negócios no setor.

“A terra é um bem de valorização constante, o preço sempre vai subir acima da inflação. Entre 2024 e 2025, isso se confirmou porque há uma característica peculiar neste mercado que é a consolidação do preço em períodos extremamente favoráveis. Agora é a vez do comprador, que tem recursos disponíveis e uma ampla oferta de propriedades à venda, o que ajuda na negociação porque o preço da saca não está bom e isso estabiliza os preços. Alguns anos atrás o momento era claramente vantajoso para o vendedor, que jogou o preço do hectare para o alto”, compara.

RELEVO, FERTILIDADE E LOCALIZAÇÃO

Na tabela do Deral, são sete classes de capacidade de uso pesquisadas em todos os municípios, três faixas numa espécie de primeira divisão, a “A”, outras duas na “B” e duas na “C”. É uma classificação antiga, baseada num documento de 1983 da Sociedade Brasileira de Ciência do Solo.

Na primeira divisão estão as terras cultiváveis, com faixas que variam de acordo com o nível histórico de produtividade relacionado às exigências de conservação - quanto mais problemas para o viabilizar uma boa safra, a classificação recebe um número maior. Na segunda divisão estão as terras para pastagens e/ou reflorestamento, sem a necessidade de prática especial de conservação. E na terceira, terras impróprias para cultura, pastagem ou reflorestamento, podendo servir apenas como abrigo e proteção da fauna e flora silvestre, como ambiente para recreação, ou para fins de armazenamento de água.

Em 2022, o Mapa de Potencialidade Agrícola Natural das Terras do Brasil, uma publicação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontou que o Paraná é o estado com a maior área do seu território classificada com potencialidade agrícola “muito boa”, a classe A1. Cerca de 24 mil quilômetros quadrados - 12,2% do território estadual - fazem parte desta “elite”. Este percentual é seis vezes maior que a média nacional e mais que o dobro da média da região Sul, graças, principalmente, às grandes manchas de terra vermelha que dominam o Norte, o Norte Pioneiro e o Oeste do Estado.

O Paraná tem ainda 18,5% de suas terras classificadas como “boa” (classe A2), o que equivale a uma área de cerca 36 mil quilômetros quadrados. São solos favoráveis às atividades agrícolas, com relevo aplainado e pequenas restrições e limitações, mas que podem ser facilmente corrigidas para o cultivo. Entre as melhores terras, esta é a classe mais abrangente na tabela do Deral e serviu como base de comparação para esta reportagem.

Godinho esclarece que a classificação está muito relacionada à capacidade de mecanização da área. Quanto mais plana a superfície, mais valor a terra tem. “Uma área fértil em declive, não tem potencial econômico. Por outro lado, um terreno plano e pedregoso também não. Áreas férteis e com boa permeabilidade, mas inundável, também perdem valor”, explica.

Outro fator decisivo é a localização da fazenda em áreas tradicionais de cultivo de grãos, o que explica os disparates entre Maringá, líder da tabela, e União da Vitória, a lanterna. “Em regiões onde as terras são férteis, de bom relevo e nas quais a agroindústria é muito desenvolvida, a valorização é muito mais intensa. Normalmente são regiões de boa infraestrutura para escoar a safra, próximas a estradas adequadas e com forte ligação com grandes cooperativas. São os municípios que vão liderar a próxima etapa do agronegócio, que é a industrialização das matérias-primas de olho no mercado externo”, analisa Bandolin Filho.

NOVA TABELA

Além do resultado da pesquisa do preço das terras aguardada anualmente pelo mercado, pela primeira vez o Deral divulgou a tabela que é repassada à Receita Federal, com uma nova metodologia que incorpora o coeficiente de variação médio dos preços. De acordo com o informe do departamento, tornar público os valores da tabela contribui para uma informação mais padronizada no Sistema de Preços de Terra (SIPT), permitindo que os produtores declarem valores mais compatíveis com a Receita.

Na divulgação prévia foi descontado das médias municipais o coeficiente de variação médio da pesquisa. “Foi aplicado um desconto baseado na variação dos preços observados, para mostrar melhor a partir de que valor as terras costumam ser negociadas com mais frequência a fim de evitar que proprietários que possuam valores abaixo da média sejam prejudicados”, afirma Godinho. O Deral frisa que a publicação da tabela não interfere na autonomia dos municípios em definir os valores de terras a serem informados para a Receita, “pois a subjetividade da definição permite interpretações alternativas”.

De acordo com a justificativa do governo do Estado, a alteração contribui para um sistema “mais justo e transparente” com uma série de argumentos que engloba seis pontos, desde o alinhamento com a classificação federal, a uniformização para os municípios, as disparidades entre os estados, a metodologia do desconto (em média de 28% este ano), o respeito à autonomia municipal e a valorização da terras e as alíquotas do Imposto Territorial Rural (ITR).

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