Pesquisa liderada pela Embrapa Meio Ambiente e pela Syngenta mostrou que a polinização assistida com a inserção de colônias de abelhas ampliou a produtividade e a qualidade do café nas fazendas onde foi realizado o estudo.

A polinização assistida aumentou a produtividade em 16,5% por hectare. Além disso, a nota sensorial da bebida aumentou em 2,4 pontos e o salto de qualidade elevou o valor da saca em 13,15%, o que representa um ganho de US$ 25,40 por saca. Outro resultado relevante foi que o uso do defensivo agrícola tiametoxam apresentou resíduos baixos no néctar e pólen e não afetou a saúde das colmeias.

O estudo foi realizado entre 2020 e 2023. Os testes de polinização com as abelhas africanizadas foram feitos na florada de 2021 (setembro-outubro) e na safra de 2022 (junho-julho), envolvendo 17 fazendas nos estados de São Paulo e Minas Gerais

Os testes de polinização com abelhas sem ferrão e sobre a saúde das colônias em cultivos tratados com tiametoxam foram feitos na florada de 2022 (setembro-outubro) e na safra de 2023 (junho-julho), abrangendo oito fazendas em São Paulo e Minas Gerais.

Abelha africanizada em flor do café: polinização benéfica e um ambiente saudável
Abelha africanizada em flor do café: polinização benéfica e um ambiente saudável | Foto: Divulgação/Embrapa

Ao todo, foram inseridas 68 colmeias de abelhas africanizadas (Apis mellifera) e 80 colmeias de abelhas sem ferrão Mandaguari (Scaptotrigona depilis).

Cristiano Menezes, pesquisador da Embrapa Meio Ambiente, explica que a lacuna de conhecimento existente sobre o benefício da introdução de abelhas na plantação de café e o quanto isso poderia gerar de rendimentos para o agricultor foram elementos motivadores para a pesquisa.

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“Já tínhamos informações robustas sobre o benefício da abundância e da diversidade de polinizadores oferecidos pelas áreas naturais nas proximidades da plantação para o café arábica, porém não havia informações robustas sobre os benefícios das abelhas manejadas”, pontua.

Cristiano Menezes, da Embrapa Meio Ambiente, explica que os pesquisadores queriam saber se as plantações de café convencionais seriam ambientes seguros para as abelhas
Cristiano Menezes, da Embrapa Meio Ambiente, explica que os pesquisadores queriam saber se as plantações de café convencionais seriam ambientes seguros para as abelhas | Foto: Divulgação/Embrapa

Por outro lado, os pesquisadores também queriam saber se as plantações de café convencionais seriam ambientes seguros para as abelhas manejadas. “Por isso, investigamos o efeito de um dos principais produtos usados na cafeicultura, o tiametoxam, que é um produto que pode oferecer risco às abelhas por deixar resíduos no pólen e no néctar das flores.”

A PESQUISA

Para avaliar o efeito da introdução de abelhas na produtividade e na qualidade do café, as colmeias foram introduzidas em um dos extremos do talhão entre 5 e 15 dias antes da floração.

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A produtividade foi comparada entre os pés de cafés próximos às colmeias e os distantes. A densidade de abelhas africanizadas foi de 4 colmeias por hectare e de abelhas sem ferrão Mandaguari, 10 colmeias por hectare. A qualidade do café produzido foi avaliada em 7 das 17 fazendas testadas com abelhas africanizadas levando em conta parâmetros físicos, químicos e sensoriais.

Para avaliar o efeito do tiametoxam, colmeias de abelhas sem ferrão Mandaguari foram introduzidas em 8 fazendas 15 dias antes da floração, sendo 6 que usaram o produto e 2 orgânicas que não fizeram uso do produto.

EFEITO

Sobre o efeito das abelhas, o pesquisador enfatiza que a principal hipótese é que a polinização cruzada, realizada entre indivíduos geneticamente diferentes, reduz o aborto e problemas de origem genética nos frutos e sementes.

“É possível também que ocorram alterações hormonais na planta que favoreçam sementes de melhor qualidade. Contudo, ainda são especulações que precisam ser devidamente testadas.”

O pesquisador acrescenta que as abelhas são um excelente bioindicador de qualidade ambiental.

“Se elas estão bem naquele ambiente, é bem provável que seja um ambiente saudável. O fato de terem tamanha importância econômica para os agricultores é um excelente estímulo para a adoção de técnicas de manejo da plantação mais sustentáveis e uma mudança cultural na prática.”

SURPRESA PARA O PRODUTOR

O engenheiro agrônomo Gustavo Facanali é sócio-proprietário de uma empresa que tem hoje 120 hectares de café com propriedades em Espírito Santo do Pinhal (SP) e Albertina (MG). A pesquisa foi aplicada na propriedade em território paulista, e o resultado surpreendeu o produtor.

O produtor Gustavo Facanali celebra os bons resultados na lavoura do café após a polinização assistida e pensa em expandir o uso de colmeias em outras áreas da propriedade
O produtor Gustavo Facanali celebra os bons resultados na lavoura do café após a polinização assistida e pensa em expandir o uso de colmeias em outras áreas da propriedade | Foto: Arquivo pessoal

“Embora já tivesse ouvido falar sobre o aumento de produtividade com o auxílio das abelhas, confesso que não acreditava muito na eficácia dessa prática, pois as flores do café são hermafroditas e se autofecundam em mais de 80%”, pontua.

Ao acompanhar os resultados de perto na propriedade, o aumento foi de 17% na produção nas áreas em que as abelhas voaram, saindo de 110 sacas por hectare (uma excelente marca) para 128 sacas por hectare — um incremento de 18 sacas por hectare.

“Esse aumento representa um acréscimo de aproximadamente R$ 27 mil por hectare, se considerarmos os preços atuais do café. Fiquei realmente impressionado, especialmente porque todos os tratamentos, tanto de nutrição quanto de controle fitossanitário, foram mantidos idênticos nas áreas com e sem as colmeias.”

Segundo o produtor, o ganho de produtividade está diretamente relacionado à polinização assistida. “Além disso, a qualidade do café na parte sensorial aumentou em aproximadamente 2,4 pontos, o que valoriza o preço final da saca”, acrescenta.

Diante desses resultados extraordinários, o produtor já pretende expandir a implementação das colmeias em outras áreas da propriedade.

“A Embrapa fez um trabalho excepcional, que certamente revolucionará não apenas a cafeicultura, mas toda a agricultura. Esse estudo comprova que é possível alcançar maiores produtividades sem a necessidade de ampliar a área plantada. E o melhor, de forma sustentável, com responsabilidade ambiental”, conclui.

CONCLUSÃO

O pesquisador da Embrapa conta que a pesquisa já foi concluída, mas os próximos passos são avaliar o efeito de múltiplas ações que o produtor de café pode adotar para beneficiar os polinizadores.

“Além da polinização assistida e do manejo de colmeias na plantação, o agricultor pode melhorar a paisagem de forma estratégica para fornecer alimento e locais de nidificação para polinizadores silvestres e manejar os insumos agrícolas de forma a favorecer a saúde dos polinizadores.”

Segundo o pesquisador, os benefícios dessa sinergia entre as diferentes possibilidades de manejo podem trazer benefícios ainda maiores para a cafeicultura. “Estamos estruturando uma ferramenta de gestão com informações robustas para auxiliar o agricultor nas suas decisões e providências, que deve ser lançada em 2025”, acrescenta.

NO CAMPO

Se um produtor de café quiser inserir as abelhas na sua lavoura, poderá recorrer à startup AgroBee, parceria da pesquisa. Segundo o pesquisador, apicultores e meliponicultores experientes também estão aptos a prestar essa assessoria.

“Também temos um curso on-line gratuito sobre polinização agrícola oferecido pela Embrapa, em parceria com a Associação Brasileira de Estudo das Abelhas, no site da Embrapa. Além de aspectos gerais relacionados à polinização agrícola, também temos uma parte específica sobre o café”, explica.

PARCEIROS

A pesquisa foi liderada pela Embrapa Meio Ambiente e pela Syngenta, com a colaboração da AgroBee, Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e Natural England e Eurofins.