Sandra Sato
Agência Estado
No final do ano passado foi adiada para março a votação da proposta de reformulação do Código Florestal conforme relatório do deputado Moacir Michelletto (PMDB-PR). A proposta é mais do interesse dos ruralistas e até março o Ministério do Meio Ambiente deve preparar um texto que concilie os interesses dos ambientalistas e dos ruralistas. O ministro José Sarney Filho quer um zoneamento ecológico econômico, em substituição à fixação de um porcentual para reserva legal, pois existem áreas em que não se pode fazer nenhum desmatamento, enquanto outras permitem maior ocupação.
AE - A quais artigos do relatório do deputado Moacir Michelletto o senhor proporia vetos, se a proposta tivesse sido aprovada no Congresso conforme defendiam os ruralistas?
Sarney Filho – Eu pediria o veto de vários artigos. O principal é o da redução da reserva legal. Não íamos aceitar nunca. Somos contra a redução de 80% para 50% da área da reserva legal para as propriedades da Amazônia e de 50% para 20% para as propriedades do Cerrado. Também discordamos do artigo que desobriga os proprietários de áreas inferiores a 24 hectares de preservarem a reserva legal. Pela proposta, esse grupo seria obrigado apenas a manter áreas de preservação permanente. Reprovo ainda a regra que permite a inclusão de áreas de preservação permanente no cálculo da reserva legal. As duas áreas têm que ser tratadas de forma diferenciada. Por fim, rejeitaria a concessão de anistia a fazendeiros que desrespeitaram a legislação ambiental.
AE - A Câmara Técnica do Conselho Nacional do Meio Ambiente tem até março para apresentar uma proposta de alteração do Código. Será possível agradar aos ambientalistas e ruralistas, simultaneamente?
Sarney Filho – Eu acredito que nós vamos encontrar um meio termo. Nós deveremos sempre usar o zoneamento ecológico econômico. O que se discute hoje é muito parecido com o mercado persa. A discussão não pode acontecer nesses termos, porque há partes mais sensíveis e menos sensíveis, umas antropizadas, outras que não foram. Isso seria detectado com o zoneamento. Porque podem haver áreas em que não se possa fazer nenhum tipo de desmatamento, como podem existir outras em que o zoneamento consinta uma maior ocupação. A nossa proposta é que se use o zoneamento como instrumento de mensuração do que pode ou não ser usado na terra. Isso coloca um novo enfoque na discussão.
AE – O Governo pretendia aprovar nesse ano (1999) o projeto que cria o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Snuc), mas não deu certo.
O que aconteceu?
Sarney Filho –á Nós pedimos que o assunto fosse incluído na convocação extraordinária do Congresso, mas não foi, para a nossa surpresa. Não sei os motivos. Os entraves já foram todos superados, ela já passou pela Câmara dos Deputados e também em todas as comissões do Senado. Só faltava ir a plenário. Acho que pode ter sido um pequeno escorregão.
AE – O Conama tem dois meses para preparar a sua proposta sobre o Código Florestal, acha que terá participação dos ambientalistas? Por que o que se assistiu, no início do mês (dezembro), foi uma falta de mobilização dos ambientalistas contra uma organização dos ruralistas. Os ambientalistas conseguiram impedir a votação, mas quase foram derrotados.
Sarney Filho – A posição agora é mais transparente e participativa. Não tenho receio de que não haja permanente ação dos grupos ligados ao meio ambiente nessa discussão.
AE – Antes as críticas eram para a comissão mista do Congresso, agora que a discussão está centralizada no Conama, subordinado ao Ministério, o senhor não tem medo de virar vidraça?
Sarney Filho – Faz parte do jogo. Eu tenho que assumir a minha responsabilidade que é tentar encontrar uma solução que contemple a preservação do meio ambiente e, ao mesmo tempo, não engesse a agricultura e o desenvolvimento do País. Vamos definir essa solução e lutar por ela.
AE – O senhor prometeu reduzir em 30% o desmatamento no próximo ano. O que está realmente sendo feito para atingir essa meta?
Sarney Filho – Muita coisa. A regulamentação da Lei dos Crimes Ambientais aumentou em proporções gigantescas as multas, o que de certa forma tem um poder dissuasivo. A Operação Fique Legal que, este ano começou tarde, será reiniciada em janeiro, com o apoio da Marinha, Aeronáutica e do Exército. O orçamento assegurado de R$10 milhões. Essa operação foi um sucesso, mesmo começando tarde. Neste ano (2000) começará mais cedo e mais estruturada. Afora a postura do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), de honestidade absoluta: mudamos os superintendentes no Mato Grosso e no Pará, e isso assustou muito os que estavam na ilegalidade.
AE – O senhor acredita que essas medidas efetivamente vão impedir ações predatórias por parte das madeireiras?
Sarney Filho - A Fundação Getúlio Vargas nos informou que 30% das madeireiras no Pará fecharam as portas, por causa da ação de fiscalização e das multas do Ibama. O Sindicato das Indústrias do Mato Grosso diz também que em Sinop, região de alta degradação, 40% das indústrias madeireiras abondonaram a atividade. Eles estão vendo que não é mais como antigamente.
AE – A experiência do incêndio de Roraima parece não ter servido de lição para este ano. O Governo foi pego de surpresa com as queimadas, novamente.
Sarney Filho – Não, não. Diminuímos em 15% as queimadas na Amazônia, apesar das condições climáticas muito mais adversas. O que houve de aumento foi em São Paulo, Paraná, Rio de Janeiro. E 97% dos incêndios nessas regiões foram em áreas que já tinham sido utilizadas pelo homem para agricultura ou para pecuária, ou seja, não tivemos grandes danos em áreas de rica biodiversidade.
AE – O que o Governo está fazendo para prevenir as queimadas?
Sarney Filho – Temos as brigadas, estamos trabalhando a educação ambiental, o monitoramento preciso e a força-tarefa. Tudo está sendo feito. Este ano (1999) aconteceu uma coisa interessante: queimou mais no País todo, porque o clima estava adverso, mas na Amazônia foi menos 15%.
AE – Isso não mostra que se precisa fazer uma campanha mais ampla com os agricultores?
Sarney Filho – Mostra. Isso não é questão do Ministério do Meio Ambiente, mas dos Estados e dos municípios. O Ministério se coloca no finzinho disso. Fiquei surpreso com a falta de estrutura de alguns Estados, como Rio de Janeiro e São Paulo, no combate às queimadas este ano. Eles entraram tarde, não se anteciparam, acho que não vai se repetir em 2000. A responsabilização é sempre posta no Governo Federal, quando na realidade nós temos nossas responsabilidades sobre as florestas nacionais e os parques, onde este ano os danos causados foram muito menores.