De olho no consumidor mais consciente, empresas e grandes varejistas têm se comprometido a comprar apenas ovos de galinhas livres, como ocorre na Fazenda Toca
De olho no consumidor mais consciente, empresas e grandes varejistas têm se comprometido a comprar apenas ovos de galinhas livres, como ocorre na Fazenda Toca | Foto: Geraldo Lazzari/Divulgação

Proteína barata e de fácil acesso ao consumidor, o ovo ao longo dos últimos anos quebrou tabus de “vilão do colesterol” e assumiu protagonismo na dieta do brasileiro. Os números de consumo crescem vertiginosamente: foram 212 unidades per capita em 2018 – crescimento de 10,4% comparado ao ano anterior – e recorde absoluto ao longo da série histórica registrada no País. Segunda a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), foram 44,2 bilhões de unidades produzidas, sendo o Paraná responsável por pouco mais de 5% do alojamento das galinhas de postura.

Mas o consumidor mudou e não tem os olhos voltados apenas para a proteína. A movimentação da sociedade em torno do bem-estar animal e humanizado nas cadeias produtivas gerou, nos últimos anos, uma atenção sobre como essa galinha vive ao longo do seu ciclo de dois anos em botar ovos. O alojamento tradicional das aves, em gaiolas, tem feito o brasileiro a optar – ainda em pequeno percentual, é verdade – por produtores e empresas que comercializam os chamados ovos free-cage, ou seja, em que a galinha fica longe da gaiola.

Empresas e grandes varejistas, aliás, tem se comprometido nos próximos anos a comprar apenas ovos de galinhas livres, como uma forma de atrair o consumidor “mais consciente” sobre o bem-estar animal e, claro, abocanhar uma fatia de mercado. Caso do Carrefour e outras diversas gigantes do ramo alimentício. Produtores seguem o mesmo pensamento e, no Paraná, um projeto pioneiro de grande porte começa a produzir um volume significativo de ovos free-cage na região de Cascavel (veja box). Em outros estados, as certificações de propriedades e empresas de produtos oriundos de animais com “criação humanizada” cresce, com cases bem interessantes.

Por outro lado, é preciso dizer também que entidades que representam a cadeia da produção de ovos – caso da ABPA e o Instituto Ovos Brasil - não colocam esse sistema de produção como uma regra, mas sim no mesmo patamar da produção convencional, em gaiolas. “Apoiamos os sistemas de produção alternativos, mas isso não quer dizer que apenas esse é o correto. Temos a mesma posição da ABPA, sem colocar nenhum sistema como melhor que o outro. O bem-estar animal não se resume ao fato do animal estar solto, mas tem outros pilares como água, alimentação, boa temperatura do local e cuidados quando fica doente”, explica o presidente do Conselho Diretor do Instituto Ovos Brasil, Ricardo Santin.

Santin avalia ainda que a produção convencional possui outros protocolo de bem-estar animal, como densidade e ambiência, por exemplo, que faz com que ave possa manifestar as ações naturais dela, mesmo que esteja dentro de uma gaiola. “Quem dita as mudanças de consumo é o consumidor, e não nenhuma ONG ou a imprensa. Agora, se o consumidor entender que só quer comer ovo produzido longe de gaiola e pagar mais por isso, o setor está pronto para fazer essa migração. Mas não vamos fazê-la puxada por ONGs que não sabem como se produz. Tampouco vamos deixar as pessoas sem essa proteína essencial para ficar apenas ovos mais caros, perdendo poder de compra.”

Para o diretor do Instituto, é válido esse tipo de produção, mas se trata de um sistema de nicho, que caminha junto com a produção convencional. “Temos um crescimento dessa tendência, mas sobre base de compradores baixa, já que é preciso ter maior poder aquisitivo. Reconhecemos a opção de comer de cada um. Se o consumidor quiser (ovos free-cage), estamos prontos para atendê-los.”

Pela norma da certificadora, o sistema de produção deve estar identificado nos ovos e na embalagem
Pela norma da certificadora, o sistema de produção deve estar identificado nos ovos e na embalagem | Foto: Gina Mardones

A Fazenda da Toca, da família Diniz, sem dúvida é um dos cases de maior sucesso pensando no modelo sustentável na produção de alimentos orgânicos. A área de 2,3 mil hectares, localizada em Itirapina, a 200 km de São Paulo, ficou famosa no Brasil inteiro devido à aplicação eficiente de agrofloresta, ou agricultura sintrópica, idealizada por Ernst Götsch.

Desde 2011 a Toca atua na produção de ovos orgânicos, que possuem o topo da complexidade em bem-estar animal e manejo no sistema. A certificação veio em 2012. Além de produção cage-free, as aves de postura têm acesso a pastejo fora do galpão e ainda alimentação com base orgânica. Algo bastante complexo num País que trabalha basicamente com a produção de grãos transgênicos. Vale dizer que os produtos são identificados tanto na embalagem como no próprio ovo, conforme norma da certificadora.

Hoje, a Toca conta com um plantel de 130 mil aves de postura, com uma produção de ovos orgânicos de 100 mil unidades por dia. Hoje, nos Estados Unidos, por exemplo, 14% dos ovos são de produção fora da gaiola, sendo 4,6% deles orgânicos. No Brasil, o percentual de ovos orgânicos é inferior a 1%, com potencial enorme para crescer.

Diretor-executivo da Fazenda da Toca, Fernando Bicaletto, explica que hoje os ovos orgânicos da Toca são vendidos para outros fornecedores – como marcas próprias de grandes supermercados e granjas – além de marca própria. Na gôndola, uma dezena desse ovo custa em média de R$ 15. “Em relação a custos de produção, os orgânicos custam três vezes mais, o que reflete no preço final do produto. A maioria dos custos, como no ovo convencional, está na ração, em torno de 70%. A saca do grão convencional custa em torno de R$ 30, enquanto do grão orgânico, atinge entre R$ 60 e R$ 64.”

Mesmo que o consumidor ainda esteja absorvendo aos poucos os conceitos relacionados ao bem-estar animal, hoje os ovos da Toca estão sendo muito bem aceitos no mercado. “Estamos com um crescimento constante, sustentável e deve continuar assim. Hoje estamos expandindo nossas vendas para o Sul, recentemente no Paraná, e Sudeste. Para o Nordeste ainda é difícil, devido à questão de logística dificultosa.”