Dados recentes apontam que o número de celulares vem crescendo vertiginosamente chegando a triplicar em questão de um ano. Esta pequena máquina está fazendo com que distribuamos o tempo de forma desigual.

Estamos consumindo demasiadamente informações desnecessárias e fúteis e chegando ao ponto de até virtualizarmos nossas emoções e relações interpessoais.

Imagem ilustrativa da imagem DEDO DE PROSA - Quando o tempo era nosso aliado
| Foto: Marco Jacobsen

Já circula entre nós uma nova doença da era digital, a nomofobia! Essa “geração luz” parece extrair dele a energia vital e suficiente para sua sobrevivência diária!

Mas houve um tempo em que nos dedicávamos mais às coisas simples da vida e extraíamos dela o máximo de prazer. O tempo não era um inimigo e, sim, um aliado.

Desde cedo, por morar na área rural, aprendi a gostar das coisas do campo: árvores centenárias, lavouras em plena produção, o cheiro da terra quando as chuvas principiam a irrigação, os animais soltos a pastar, riachos serpenteando o solo, bicas d’água jorrando a mais fresca e saborosa das bebidas! Ah, os cheiros das plantas e flores! Basta senti-los que as lembranças saltam à memória!

Recordo-me da casa de minha infância no interior perdido deste meu Paraná. Feita de madeira nobre sobre palanques com assoalho que rangia a cada passo. As frestas na parede deixavam o vento fresco entrar.

No terreiro havia três frondosas paineiras. Debaixo delas três bancos de madeira que serviam de sala para as visitas. Galinhas andavam soltas a riscar o chão em busca de alimentos para seus pintainhos.

Quando algum vizinho matava qualquer animal já podíamos esperar que em um pequeno caldeirão alguém traria pedaços de carne fresca. Eram as gentilezas da vida na roça!

Mas a lida no campo não era fácil. As tarefas braçais consumiam as forças de papai e mamãe. Sob sol forte ocorria derriça do café, a colheita da mamona e do feijão. Os terreirões ficavam abarrotados de grãos que diariamente eram revolvidos até atingirem a secura ideal.

Outros grãos eram retirados das vagens com cambaus que levavam uma verdadeira “surra” para que libertassem as sementes. As tuias ficavam repletas garantindo nossa sobrevivência.

Já na adolescência cuidava de uma horta cujos frutos retirados da terra sustentavam uma comunidade religiosa de padres e seminaristas. Uma miscelânea de cores e sabores que encantavam os olhos.

Regadas com água de uma mina e adubadas exclusivamente com material orgânico, as plantas cresciam viçosas. Ali as horas passavam depressa demais quando laborava nos canteiros.

Mas a melhor parte ainda era o pomar. Havia uma grande quantidade de cítricos dos mais variados sabores e cores: laranjas, poncãs, tangerinas...uma fartura que só vendo!

O velho pé de laranja caipira reinava soberano entre todas. Não havia sabor igual. Subíamos nele munidos com canivetes afiados e fazíamos competição para ver quem mais consumia seus frutos. 47! Sim, 47 laranjas foi meu recorde!

O chão ficava repleto de cascas, sementes e bagaços. Sentados em seus galhos o tempo parecia correr devagar e o paraíso estava tão próximo de nós! Risadas e histórias malucas eram nosso passatempo até que nos fartássemos. O doce ócio saudável!

“Oh! que saudades que tenho da aurora da minha vida, da minha infância querida que os anos não trazem mais” - parafraseando o grande e bom poeta!

Valdinei Franco, leitor da FOLHA