Acompanhando o desenvolvimento da agricultura, o ensino de agronomia está em constante mudança, incorporando na matriz curricular conteúdos relacionados aos avanços tecnológicos
Acompanhando o desenvolvimento da agricultura, o ensino de agronomia está em constante mudança, incorporando na matriz curricular conteúdos relacionados aos avanços tecnológicos | Foto: iStock

Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que o PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil caiu 9,7% no segundo trimestre de 2020, refletindo os impactos da pandemia. A agropecuária, no entanto, foi no movimento contrário, sendo o único setor a apresentar crescimento em relação ao trimestre anterior, com um aumento de 0,4%.

Coordenadora do curso de agronomia da UEL (Universidade Estadual de Londrina), a professora Inês Cristina de Batista Fonseca considera que o agronegócio tem seu lugar de destaque na economia brasileira.

“O agro é gerador de riquezas para o mercado interno e para as exportações, com grande representatividade no PIB do Brasil. Se pensarmos no papel que o Brasil tem como provedor de alimento para o mundo e nas estimativas de crescimento necessário do setor para garantir a segurança alimentar, ainda temos muitos desafios e precisaremos de profissionais altamente qualificados. Para os novos estudantes, é um campo repleto de oportunidades”, destaca.

Ela reforça que é preciso destacar o quanto a agricultura brasileira avançou nas últimas décadas. “O Brasil passou de importador de alimentos para um dos mais importantes produtores e exportadores mundiais. O avanço é resultado da notoriedade e da excelência da contribuição das instituições de pesquisa em todas as áreas da agronomia e afins”, pontuou.

Professor aposentado do Departamento de Agronomia da UEL, Ricardo Ralish acrescenta que a agricultura brasileira passou por uma verdadeira e ampla revolução, tecnológica e conceitual.

“Uma importante tecnologia foi a consolidação do plantio direto, que nasceu em Rolândia (PR), em 1972, e se espalhou pela América Latina e para o mundo. É consenso seu importante papel na preservação dos recursos naturais, principalmente do solo e da biodiversidade. Hoje não se pode pensar em agricultura que não seja sustentável”, destacou.

Evolução

Mais recentemente, a professora Inês Fonseca cita a evolução das áreas de biotecnologia, de agricultura de precisão e de tecnologias digitais.

“O uso de ferramentas como marcadores moleculares, engenharia genética e edição genômica tem possibilitado o desenvolvimento de cultivares com resistência a herbicidas e pragas, com maior tolerância a estresses e com maior valor nutricional.”

Além disso, a agricultura de precisão, com a gestão da variabilidade espaço-temporal, e as tecnologias digitais, com o planejamento e gestão da propriedade, têm tornado o processo de produção no campo mais eficiente pelo aumento da produção, em um cenário de escassez de mão de obra e de restrição da expansão de área cultivada.

“Neste contexto, acompanhando o desenvolvimento da agricultura, o ensino de agronomia está em constante mudança, incorporando na matriz curricular conteúdos relacionados aos avanços tecnológicos. No curso de agronomia da UEL, mesmo com um corpo docente altamente qualificado, que desenvolve pesquisa e produz ciência, atender às expectativas do mercado de trabalho nem sempre é possível e, por isso, os alunos têm na sua formação profissional, além das disciplinas obrigatórias que contemplam as competências de um engenheiro agrônomo, horas de estágio obrigatório e de atividades acadêmicas complementares.”

As atividades complementares podem ser projetos de ensino, pesquisa e extensão, cursos de extensão, eventos e disciplinas eletivas.

“Além destas horas, os alunos são incentivados a realizar estágios extracurriculares (não obrigatórios) e participar de programas de mobilidade acadêmica para França, Portugal e Estados Unidos. Os estágios, obrigatório e não obrigatório, são realizados em instituições de pesquisa agronômicas, como Embrapa e Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR-Paraná), empresas, cooperativas, propriedades rurais e outras universidades.”

O docente Ricardo Ralisch acrescenta que é preciso ver com atenção as inúmeras demandas de inclusão de temas específicos na matriz curricular dos cursos de agronomia.

“O mais importante é que os cursos apresentem os fundamentos e que possibilitem aos estudantes estarem atentos a toda esta dinâmica típica do setor. É fundamental também que esta atualização ocorra nas disciplinas, dando aos professores a autonomia necessária, dentro das ementas definidas.

Isto acontece com muita eficiência nas universidades, pois as atividades da graduação estão associadas a programas de pós-graduação, setor responsável pelo maior volume de pesquisas no setor”, destaca.

Agricultura digital

Tecnologias que eram novidades há uma década, hoje fazem parte do dia a dia dos estudantes de agronomia
Tecnologias que eram novidades há uma década, hoje fazem parte do dia a dia dos estudantes de agronomia | Foto: iStock

Professor do Departamento de Agronomia da UEL, Marcelo Giovanetti Canteri reforça que as soluções tecnológicas devem fazer parte da formação dos novos agrônomos.

“O curso de agronomia da UEL tem em sua matriz curricular uma disciplina exclusiva para abordar a agricultura digital. A dinâmica do assunto exige atualizações constantes. Tecnologias que eram novidades 10 anos atrás, como agricultura de precisão, hoje devem fazer parte da formação dos agrônomos. Drones na agricultura também não são mais considerados tecnologia do futuro, pois estão sendo usados no presente.”

O docente cita ainda novas tecnologias que farão parte da formação dos alunos. “Machine Learning, Internet das Coisas (IoT) e Inteligência Artificial são abordadas e os alunos, futuros agrônomos, são estimulados a não apenas conhecer o assunto, mas também procurar criar novas aplicações para a tecnologia. Assim, eles também são estimulados a criar sua própria startup na Incubadora Tecnológica da UEL.”

E as soluções tecnológicas também estão presentes nas aulas. “Plataformas digitais permitem interações teóricas avançadas para facilitar as atividades práticas. Por exemplo, games e testes com imagens de sintomas de doenças auxiliam os alunos a fixar as características de cada enfermidade”, exemplifica o professor.

Expoente

A coordenadora Inês Fonseca considera que o fato de a agricultura ser um expoente da economia brasileira impacta, em um primeiro momento, no interesse pela profissão.

“A popularização do agro junto à sociedade por meio dos veículos de comunicação e das redes sociais, bem como a disponibilização de conteúdos (agroinfluencers, lives etc.) de fácil compreensão, tem auxiliado na conscientização da importância do agronegócio para a produção e qualidade de alimentos e produtos. Essa informação tem possibilitado o ingresso de alunos com maior clareza dos campos de atuação do engenheiro agrônomo e do seu papel como profissional.”

Além disso, pela sua importância econômica, a agricultura gera demandas por parte de empresas privadas, instituições públicas de pesquisa, produtores e consumidores e dessas demandas surgem parcerias com docentes e grupos de pesquisa.

“Essas parcerias oportunizam recursos para infraestrutura de ensino e pesquisa, vivências e práticas de extensão, desenvolvimento de habilidades e competências pessoais e profissionais e, consequentemente, a formação de recursos humanos qualificados e em consonância com as demandas do mercado.”

Uenp formou quase 5 mil agrônomos

O diretor do Centro de Ciências Agrárias da Uenp (Universidade Estadual do Norte do Paraná), Euripedes Bomfim Rodrigues, destaca que a instituição já formou quase 5 mil agrônomos desde o início da sua história, profissionais que estão distribuídos por todo o Brasil e também atuando no exterior.

“Desses bancos escolares saíram grandes professores, pesquisadores e profissionais renomados”, pontuou.

Ele considera que hoje, em plena pandemia, o agro está ‘salvando a pátria’, graças à dedicação dos profissionais que conseguiram, a partir da criação da Embrapa, desenvolver tecnologias que possibilitaram dominar as áreas antes improdutivas, principalmente do cerrado, além da criação de novas variedades de plantas e do uso consciente de insumos.

“Esse é o legado que nossos futuros agrônomos devem honrar e disciplinadamente manter e priorizar para o futuro. Responsabilidade imensa a ser desempenhada com capacidade e dedicação, preservando nossos recursos naturais”, concluiu.