A agricultura, via de regra, é uma atividade de alto risco; uma espécie de loteria. Se o clima for favorável e não incidir nenhuma nova praga ou doença sobre a lavoura, o agricultor relaxa e dorme tranquilo. Se não tiver essa sorte, ele amarga prejuízos de maior ou menor monta, a depender da intensidade da contrariedade climática ou mercadológica.

Já houve época no Brasil (anos 60 e 70), que o produtor era protegido contra os infortúnios da natureza e recebia pagamento pela produção não realizada em decorrência de perdas motivadas por desastres climáticos.

O subsídio acabou, o que ajudou, aparentemente, o Brasil a incrementar a sua produtividade agrícola, pois só ficaram no campo os produtores vocacionados para a atividade e competitivos. Os que só sobreviviam no campo à custa dos subsídios, sem essa bengala se viram forçados a vender ou arrendar suas terras e migrar para a periferia de alguma cidade. O dinheiro da venda da propriedade rural rapidamente acabou e hoje, muitos desses outrora agricultores se converteram num pesado fardo para as administrações das cidades, visto constituírem mão de obra desqualificada para as atividades urbanas e, portanto, mal pagas.

Mas tem agricultor - e não é brasileiro - que não perde o sono por causa de desastres climáticos, da baixa produtividade ou da queda nos preços de mercado. Colha muito ou colha pouco, esteja o mercado favorável ou desfavorável, ele tem seu lucro garantido pelo subsídio disponibilizado pelo governo rico do país ao qual ele pertence: Estados Unidos, Japão e países da Comunidade Europeia, principalmente.

Nos Estados Unidos, o instrumento que garante aos seus agricultores o lucro certo, mesmo sem produção, se chama Farm Bill (Lei Agrícola) e na Comunidade Econômica Europeia atende pelo nome de PAC (Política Agrícola Comum).

Os subsídios que os países ricos disponibilizam aos seus agricultores são injustos, porque distorcem as leis do livre comércio, dando competitividade a quem não tem e prejudicando os países mais pobres, os quais não dispõem de recursos para subsidiar os seus produtores, que, como consequência, perdem duas vezes: primeiro, porque são privados de vender aos mercados subsidiados que se auto abastecem e segundo, porque na busca pelo auto abastecimento, os produtores subsidiados geram sobras que são desovadas no que resta de mercado e deprimem seus preços. Resultado: os produtores dos países em desenvolvimento, além de vender menos porque o mercado está saturado pela produção subsidiada, ganham pouco pelo que vendem porque o mercado está depreciado.

Uma afronta ao desenvolvimento dos países mais pobres, cuja balança de pagamentos depende muito da comercialização de commodities agrícolas, em contraste com os países desenvolvidos, que contam com produtos de alta tecnologia para equilibrar seu comércio com os países em desenvolvimento.

Os subsídios têm contribuído para aumentar o abismo entre o bem estar de nações ricas e pobres, o que é péssimo. A bem da verdade, o Primeiro Mundo poderia reconhecer que, em boa medida, a sua riqueza foi construída à custa da miséria do Terceiro Mundo.

A Farm Bill americana garante um seguro, não sobre a produção esperada, mas sobre o lucro presumido. É um seguro contra a quebra de safra causada por más condições climáticas e contra a queda de preços motivada pelo excesso de produção. Já a PAC europeia, vai ainda mais longe. Paga um valor fixo por hectare - que pode variar entre os países da Comunidade - mas fica, na média, em torno de 250 Euros/ha/ano (cerca de R$ 1.300,00). Na ausência de produção, o agricultor europeu embolsa R$ 1.300,00/ha e se produzir algo, soma o que produziu com este valor e dorme sem pesadelos.

Uma afronta aos nossos agricultores, que além de não contarem com este mimo do governo, porque o país é pobre, são compelidos a competir, não com os agricultores dos países desenvolvidos, mas com os gigantescos orçamentos desses governos. Muitos dos nossos produtores, quiçá, conseguem lucrar no final da safra os R$ 1.300,00/ha que o agricultor europeu recebe de lambuja.

“Não se pode competir com quem tem renda garantida, independentemente da produtividade, dos preços e do clima” (Kátia Abreu, Senadora e ex-Ministra do MAPA).

Amélio Dall’Agnol, Pesquisador da Embrapa soja