O Ministério da Saúde confirmou o primeiro caso de coronavírus na quinta-feira, 26 de fevereiro e não demorou para as surgirem as primeiras piadas prontas relacionadas a data festiva: "No Brasil, até o coronavírus começa depois do Carnaval". Depois das piadas comparando com uma famosa marca de cerveja pipocarem nas redes sociais, foi a vez da maior festa popular brasileira render diversos memes e piadas: "Beijou 100 bocas no Carnaval e agora está aí correndo para comprar álcool em gel para não pegar coronavirus", provocou mais um no twitter. Aliás, é com bom humor que o brasileiro se prepara para o avanço do Covid-19 pelo mundo. Até piadas e comparações com outros problemas sociais surgiram. "Coronavírus mata menos que a PM brasileira", escreveu mais um internauta no microblog.

A cantora brasileira Corona ficou famosa nos anos 1990 pelo Hit 'Rhythm Of The Night' que voltou às paradas de sucesso após surto do vírus
A cantora brasileira Corona ficou famosa nos anos 1990 pelo Hit 'Rhythm Of The Night' que voltou às paradas de sucesso após surto do vírus | Foto: Adriano Vizoni/Folhapress

Pesquisa publicada pela FGV (Fundação Getúlio Vargas) traduz bem como a notícia é encarada pela maioria do brasileiro. Cerca de 34% das interações nas redes com menções ao vírus são irônicas ou bem-humoradas. Ou seja, o dobro de mensagens compartilhadas de notícias de veículos de informação ou fontes oficiais. Só 17% foram tuítes de notícias. Segundo o estudo, apenas 10% das menções de pessoas comuns nas redes aludem ao medo de contrair o vírus ou de o número de casos confirmados explodir no Brasil. Desde janeiro, foram mais de 33 milhões de interações em links sobre o coronavírus e o país está em quarto apareceu em quarto lugar em menções sobre assunto.

Será que o brasileiro tem seguido seguido à risca a orientação de que não é necessário entrar em pânico? Para a a psicóloga Natalia Mendes Ferrer rir das adversidades é uma forma de amenizar as situações negativas. "O bom humor e o riso favorecem a liberação de neurotransmissores relacionados ao bem estar, como a endorfina. Estudos e a própria história do país herdada dos portugueses apontam que essa e é um jeito positivo do brasileiro ao encerar muitas situações" Entretanto, segundo ela, a característica de certa forma pode ser benéfica, mas precisa ter sempre um limite. "É positivo até o momento que a gente passa a negligenciar determinados assuntos. Podemos rir dos memes, mas não ficar distantes dos perigos reais. Rir é bom, mas manter um olhar atento para determinadas situações, sobretudo às relacionas a saúde, é ainda mais importante", alerta Natalia.

Cerveja Corona, marca da empresa brasileira Ambev, registrou queda nas vendas por conta da desinformação em volta do vírus
Cerveja Corona, marca da empresa brasileira Ambev, registrou queda nas vendas por conta da desinformação em volta do vírus | Foto: iStock

É sob este ponto de vista de "alerta" que o Governo do Paraná pretende tratar a comunicação sobre a chegada do Covid-19. Já são 13 casos suspeitos no Estado e as medidas de prevenção e de como tratar o inimigo - ainda pouco conhecido - começam a ser tomadas. Apesar do Brasil ter tradição em utilizar o humor como forma de abordagem, na comunicação pública o Governo não considerada pertinente a aplicação dessa linguagem, notadamente em situações críticas.

O secretário estadual de Comunicação e Cultura, Hudson José, diz que o Governo do Estado estuda uma resposta rápida para a população, sem alarmar, mas informando com prudência. "Temos uma responsabilidade muito grande em tratar essa situação e nosso foco é adotar uma abordagem específica e ao mesmo tempo orientadora", diz. Outra preocupação é não tornar a comunicação oficial do estado apenas mais do mesmo. Ou seja, repetir velhas chamadas de como lavar bem as mãos, por exemplo. " Já estamos levantando como outros países tem tratado o assunto com a população. Estamos buscando um caminho para não ser repetitivo, nem desinteressante."

A pesquisa da FGV revelou justamente que boa parte dos internautas que dizem temer o vírus o faz devido ao receio de que o Governo não tenha capacidade para lidar com uma eventual explosão no número de casos confirmados. Mais de 150 mil publicações citam o avanço da dengue e do sarampo no país, bem como a queda de investimentos em ciência e pesquisa, para dar corpo aos questionamentos.

'Fanfic' cria briga entre vírus para ver quem manda no Brasil
'Fanfic' cria briga entre vírus para ver quem manda no Brasil | Foto: Reprodução Twitter

Hudson José aponta que para tratar do assunto corona de maneira séria, o Governo do Paraná poderá usar fórmulas já testadas nos últimos meses com a dengue para atingir cada vez um maior público. "Precisamos quebrar algumas barreiras, fazer uma comunicação séria, mas cada vez mais coloquial" Se não cabem piadas ao governo, é possível ser mais acessível. "A população em geral tem um ritmo de vida que não lhe permite ficar atenta a tudo o tempo todo. Por isso, temos a intenção de impactar as pessoas a qualquer momento seja por meio das redes sociais, em anúncio no busdoor, em um programa da rádio, no jornal ou com ajuda de um comunicador de massa ou influencer, que possa atingir um grande público. Estamos de olho nessas novas plataformas" garante.

@sebastiao.salgados
@sebastiao.salgados | Foto: Reprodução Instagram

Entre o riso fácil dos memes e gifs nas redes sociais e da seriedade que se exige dos veículos de comunicação e do governo para tratar o assunto estão os brasileiros que seguem fazendo piada com coronavírus, ou indignados com os que fazem piada com o assunto ou até aqueles indignados com indignados com piadas com o coronavírus. Para a psicóloga, o mais importante de tudo isso, do ponto de vista cognitivo, é que as brincadeiras e o bom humor não sejam traduzidas em negligência ou falta de cuidado. "Daí a piada não fica mais tão engraçada assim" conclui Natalia. (Com Folhapress).