Quem é a pessoa que não deixa o 'Big Ben' de Londrina parar?
Há 54 anos, José Gonçalves cuida de um dos primeiros arranha-céus de Londrina e do Relojão no seu topo
PUBLICAÇÃO
quinta-feira, 29 de agosto de 2024
Há 54 anos, José Gonçalves cuida de um dos primeiros arranha-céus de Londrina e do Relojão no seu topo
Maria Tereza Nascimento
Anos 70, um jovem de 22 anos entra em um dos primeiros arranha-céus do centro de Londrina: o Edifício América. O prédio, com exuberantes 17 andares, fora projetado para concentrar a comercialização do café, no auge do Ouro Verde na região, e subir e descer os andares como ascensorista foi a primeira função de José Gonçalves.
Hoje, Gonçalves está com 78 anos de idade e completa 54 anos de trabalho no Edifício América que é apontado pelos mais jovens como o prédio do ‘Relojão’ de Londrina e conhecido ao longo da história como o prédio da papelaria Central ou O Edifício do Café e que recentemente foi chamado de 'Big Ben' de Londrina, pelo influencer digital e youtuber londrinense Felca, no vídeocast Inteligência Ltda. Nesse prédio cheio de história, o zelador é o responsável pelo cuidado com a estrutura do edifício e do 'Relojão' de Londrina, cuja manutenção técnica é feita pela família de relojoeiros Ueda desde 1972.
Rotina que marca, dia após dia, o ritmo de crescimento da cidade e de sua própria história.
Antes, Gonçalves já havia trabalhado numa gráfica na região central da cidade; como técnico de manutenção no aeroporto e até de porteiro em um prédio na avenida Paraná que ele ajudou a construir, como servente de pedreiro, nos anos 60.
Mas, foi no edifício do Café que ele encontrou mais que um emprego; encontrou o amor, casou-se e formou uma família no apartamento que ele mesmo reformou. O tempo, como o relógio do qual cuida, trouxe alegrias e também provações. “Aqui me casei, criei meus dois filhos e cuidei seis anos da minha segunda esposa quando ela teve Alzheimer”, compartilha.
O tempo mudou o edifício, e com ele, o papel de José. O zelador, que relutou em assumir essa responsabilidade, porém, agora a exerce com orgulho. “Aqui eu faço de tudo. Não sou só zelador. Eu mexo com a parte elétrica e encanamento. Eu tomo conta do prédio e do relógio. Todo problema que dá, eu tenho que resolver ou encontrar alguém que resolva.”
Nos anos áureos do café, o prédio fervilhava de vida. De acordo com Gonçalves, nos anos 80 a 90, a portaria “fervia de gente, mas agora está calma”. No entanto, a importância do relógio não diminuiu. O zelador conta que, uma vez, moradores do cinco conjuntos, zona norte de Londrina, estavam ligando para saber porque o relógio não estava funcionando. “Se esse relógio parar, todo mundo reclama. Ele serve como serviço para a cidade”.
Atualmente, o relojão não pode mais receber visitas por orientação do Corpo de Bombeiros. As únicas pessoas que sobem até lá são Gonçalves e o relojoeiro. “Hoje que está ventando, o ponteiro do relógio enrosca, aí amanhã o técnico vem para desenroscar”, explica.
Enquanto o zelador sobe até o topo do edifício para verificar as caixas d'água ou trocar as lâmpadas que iluminam o relógio à noite, ele mantém vivo o símbolo que continua a marcar o compasso da vida em Londrina e promete que enquanto estiver aqui, o relógio continuará a funcionar, assegurando que o tempo não pare de fluir.
História do relojão
O relojão do Edifício América, em Londrina, foi contruído em 1958 pela Fábrica de Relógios Dimep. E inaugurado junto com o edifício do café. A construção representa um dos maiores relógios do Brasil, com 6,50 metros de comprimento e 6,50 metros de largura. Já a estrutura de suporte mede 3,50 metros e os ponteiros, feitos de lata e ferro, têm 3 metros e 2,80 metros. Na época, o relojão tinha o patrocínio da Papelaria Central e teve muitos patrocinadores ao longo dos anos, por ser mantido por iniciativa privada.
Visível de vários pontos da cidade, o relojão é mantido em funcionamento por duas baterias que emitem um sistema de impulsos elétricos para movimentar os ponteiros a cada 60 segundos. Depois de tantos anos, ele continua a ser um marco histórico e cultural para Londrina, refletindo o progresso e o orgulho da cidade ao longo das décadas.
Em sua coluna social de 2019, o jornalista Oswaldo Militão citou que o relógio “sempre significou o estímulo ao progresso da cidade: a hora certa para os grandes negócios da cafeicultura, dos tempos áureos do "ouro verde" [...] Ele, achamos nós, ainda é o símbolo maior para entusiasmar o progresso da cidade: marca o tempo, sugere que tempo é progresso da cidade, pois tempo é dinheiro, é desenvolvimento, não tem volta, e é dele que a cidade precisa, para gerar empregos e melhor a vida de todos”.
Maria Tereza Nascimento estagiária com supervisão de Patrícia Maria Alves (editora)
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Felca apresenta 'Big Ben' de Londrina para Rogério Vilela do Inteligência LTDA.