As redes sociais se tornaram vitrine de produtos e pessoas e os algoritmos sabem exatamente o que você quer antes mesmo de verbalizar isso. Uma teia digital na qual, a qualquer momento, uma fala ou a publicidade errada pode “cancelar” alguém. Elas também têm sido o meio mais usado para campanhas publicitárias. A pós-graduada em marketing digital e gestora de tráfego de anúncios online Michele Aparecida da Silva explica que como o principal objetivo de uma campanha publicitária é posicionamento de marca e visibilidade as redes sociais são o espaço ideal. O Facebook, por exemplo, em 2016, de acordo com a própria empresa, tinha mais de 102 milhões de brasileiros conectados na plataforma e três milhões de anunciantes pelo globo. Isso também acontece devido a possibilidade de segmentar totalmente o público que a campanha quer atingir e direcionar exatamente ao seu público alvo.

A gestora de tráfego aponta que as próprias plataformas de redes sociais têm ferramentas para evitar a veiculação de campanhas preconceituosas em suas páginas: “depois que eu crio o anúncio ele passa por uma fase de validação da equipe interna das redes sociais ou do Google, nessa fase eles vão analisar se aquela campanha está em conformidade com as políticas, se estiver ok ela vai passar. Contudo se algum usuário achar que está ferindo-o de alguma maneira pode denunciar ou ocultar dentro da ferramenta”. Esta atitude das plataformas não é pensando somente em direito humanos: “Isso é porque ela quer que o usuário permaneça na rede social. Facebook, Instagram, LinkedIn, etc., são empresas e eles visam o lucro”, complementa Silva.

É por meio dessas ferramentas de denúncias que as pessoas vêm cobrando posicionamentos de marcas e não aceitam falas preconceituosas. O pós-doutor em Comunicação Social pela Universidade Federal de Santa Maria e estudioso da publicidade e da pós-modernidade desde 2009, Rodolfo Rorato Londero analisa que, com a inclusão das publicidades nas redes sociais, não somente nos meios de comunicação de massa, por ser um ambiente mais participativo e com uma pluralidade de vozes entram em cena as questões sociais. “Isso levou as marcas a fazerem um reposicionamento muito forte, seja na questão de orientação sexual, seja na questão dos movimentos étnicos, seja questão do movimento feminista. Uma das mudanças que mais chama a atenção é o reposicionamento que algumas marcas de cerveja estão fazendo em suas propagandas, antes conhecidas por uma forte objetificação da mulher”, explica Londero.

Imagem ilustrativa da imagem O cliente tem sempre razão?

Com esse apelo por mudanças no discurso, aos que insistem em não aprender e reproduzem falas ou atitudes machistas, racistas, LGBTQIA+fóbicas, entre outros tipos de preconceitos, têm sofrido as consequências também dentro das redes sociais e o boicote é uma das formas de protesto amplamente usadas. Ou seja, quando uma marca ou uma pessoa faz e/ou fala algo que as pessoas identificam como ofensiva, a marca é boicotada. E quando já não consumia o conteúdo ou serviço oferecido, como fazer esse boicote? A solução encontrada foi “desmonetizar” o alvo, ou seja, boicotar suas redes sociais e de seus anunciantes, forçando-os a encerrar o patrocínio.

Isso aconteceu recentemente, em junho deste ano, com o apresentador de televisão Sikera Jr. Após uma sequência de falas homofóbicas e com o estopim no dia que chamou pessoas LBGTQIA+ de “raça desgraçada”, ao analisar um comercial da Burger King em respeito à diversidade, iniciou-se nas redes sociais a #DesmonetizaSikera. A hashtag pedia que as empresas parassem com a publicidade no programa Alerta Nacional, do apresentador. Com isso pelo menos 43 empresas cortaram patrocínios ao programa.

Este ato foi coordenado pelo Sleeping Gigants Brasil, um perfil que tem como foco principal desmonetizar perfis, sites e pessoas que disseminam fake news. Eles atuam nas redes sociais – especialmente no Twitter – fazendo uma mobilização dos internautas. Também alertando os anunciantes que suas publicidades estão aparecendo em sites de fake news. A companhia muitas vezes somente especifica seu público e não sabem o site exato que a propaganda é divulgada. Mas após o alerta dos Sleeping Gigants a maioria cadastra o endereço indesejado em uma lista negra, assim sua publicidade não é mais exposta lá.

A efetividade de ações como essa ainda é questionada. De acordo com Londero, a real efetividade de boicotes como esses dependem da intenção da pessoa ou marca e da campanha publicitária que a envolve. Se a intenção é ser muito mencionado e ter ganhos a curto prazo então para estes não importa o quão ruim seja a reação do público, contanto que estejam falando sobre. Já para as campanhas e pessoas que tem o foco principal em sua imagem e possuem a intenção de lucro a longo prazo isso pode ser prejudicial.

Michele Aparecida da Silva analisa a importância de saber quem é o rosto da sua marca: “A campanha publicitária, normalmente, vai ter a função de trazer visibilidade e trabalha posicionamento de marca. Se minha campanha possui uma pessoa que vai contra os valores que a marca preza, automaticamente, não vai ter o retorno que estava esperando sobre aquele investimento”.

(supervisão de Patrícia Maria Alves/ editora)

LEIA TAMBÉM:

Café com robôs no Japão aposta na inclusão