Comida grátis por um ano, cerveja de graça, ingressos para jogos, descontos em redes de farmácias e sorteios de até US$ 1 milhão por pessoa. São alguns atrativos oferecidos por empresas privadas e pelos governos locais dos Estados Unidos para incentivar a população a tomar a vacina contra Covid-19. Apesar de apresentar dados expressivos com relação à imunização (são mais de 250 milhões de doses aplicadas), ainda há uma boa parcela da população que optou por não receber a vacina, seja por desconfiança ou questões ideológicas.

O país se destaca no número de imunizados - foram mais de 250 milhões de doses aplicadas, sendo 30% da população totalmente vacinada, ou seja, mais de 110 milhões de pessoas imunizadas com as duas doses, até sábado (15), 46,71% da população americana havia recebido ao menos uma dose da vacina, segundo o Our World in Data e conforme dados do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC na sigla em inglês), em abril desse ano, o país chegou a vacinar mais de 4 milhões de pessoas por dia, porém, nas últimas semanas, esse número tem caído, variando na casa dos 2 milhões por dia. O motivo não está relacionado a falta de insumos, tanto que em Nova York, por exemplo, a intenção é partir para a vacinação de turistas. O problema é a desconfiança das pessoas, que optam por não receberem a vacina com medo de possíveis efeitos colaterais ou por questões ideológicas.

Imagem ilustrativa da imagem Cerveja, maconha até US$ 1 milhão visam aumentar número de vacinados nos EUA
| Foto: Niyi Fote/Thenews2/Folhapress

“O problema não está sendo a falta de vacina, mas sim a conscientização da população”, reforça estudante londrinense Cindy Lima, em entrevista para a FOLHA. Há quase dois meses, Lima trancou o curso de jornalismo na UEL (Universidade Estadual de Londrina) e se mudou para Nova Jersey, nos Estados Unido para estudar o inglês. Quando a etapa de vacinação atingiu a sua idade, ela logo fez seu cadastro e, no dia seguinte, já foi receber a primeira dose. A segunda dose já está marcada para esta terça-feira (18), mas ela ainda se mostra apreensiva. “Essas pessoas (não vacinadas) podem me colocar em risco. A gente sabe que o vírus sofre mutações, então eu fico com medo que, diante disso, possa surgir uma nova variante e a minha vacina não faça mais efeito”.

A estudante Cindy Lima está há dois meses nos EUA e ficou surpresa com a facilidade para a vacinação
A estudante Cindy Lima está há dois meses nos EUA e ficou surpresa com a facilidade para a vacinação | Foto: Arquivo Pessoal

Lima se impressionou com a facilidade do acesso à vacina. No estado onde mora, por exemplo, conta que não é mais necessário realizar o agendamento, apenas ir a um ponto de vacinação. Além disso, alguns centros de vacinação em massa, como escolas e campos de futebol, estão sendo desativados para dar lugar às farmácias, a fim de aproximar os locais de vacinação das pessoas.

INTERESSES EMPRESARIAIS

Com a preocupação de surgirem novas variantes do vírus resistentes à vacina, iniciativas governamentais e privadas correm para adotar medidas alternativas. Uma das mais surpreendentes, parte do governo estadual de Ohio, que vai sortear cinco pessoas que tomarem a vacina contra a Covid-19 para concorrerem um prêmio de US$ 1 milhão cada. Empresas de transporte privado também entraram na onda e estão oferecendo desconto nas viagens até os centros de vacinação.

Para Jessica Mendes, profissional de Marketing, especialista em humanização de marcas em Londrina, essa forma de incentivo pode surtir efeito, porque visa a parcela da população que ainda está em cima do muro. "O marketing de uma empresa tem que focar em quem está em dúvida, porque já existe aqueles defensores que vão comprar de você de qualquer jeito”, observa.

A especialista indica que há certos interesses envolvidos por trás disso. Mendes explica há de se pontuar, em primeiro lugar, a necessidade de que esse período de crise termine, para que se possa atingir novamente o crescimento ou a estabilidade econômica dos negócios. Para isso, é preciso uma campanha de vacinação eficiente no país e também dentro da própria empresa, já que funcionários contaminados precisam ficar de licença. Assim, “sabe-se que, financeiramente, a vacina é a melhor solução”.

Outro fator ressaltado por Mendes é a divulgação da própria marca de uma empresa. Ela será lembrada por estar agindo para contribuir de alguma forma no combate à pandemia, fora que seu nome vai circular em diversos lugares.

BANALIZAÇÃO DA VACINA

“É uma alternativa no desespero. Uma das últimas coisas que se pode fazer”, dispara Jean Petri, consultor de marketing londrinense, sobre as entidades estarem adotando tais medidas. Petri apresenta outro lado a ser destacado: “o valor que estão dando para uma questão de saúde”.

Para o consultor, trocar a vacina por um outro produto qualquer, uma comodity simples, significa a banalização da própria vacina, da pandemia e da vida. Pensando nas empresas, é compreensível a preocupação em realizar campanhas que incentivem a vacinação, pois “quanto antes todo mundo for vacinado, antes as coisas voltam a funcionar normalmente para essas empresas”, completa Petri.

(*supervisão de Patrícia Maria Alves)

BENEFÍCIOS

Uma das empresas que adotam estímulos à vacinação é a unidade americana da brasileira JBS, que oferece US$ 100 (R$ 531) a cada funcionário que se vacinar.

A rede de supermercados Kroger, presente em 35 estados americanos, também disse que vai pagar US$ 100 para os empregados que se imunizarem. A empresa abriu exceção para quem afirma não poder ser vacinado por motivos de saúde ou religiosos. Nesse caso, o pagamento é oferecido em troca de um curso sobre saúde.

O McDonald's, por sua vez, não prometeu dinheiro, mas garantiu aos funcionários da empresa e dos restaurantes até quatro horas de folga remunerada para quem tomar o imunizante.

Já a companhia aérea American Airlines se comprometeu a fazer ambos: pagar um bônus de US$ 50 (R$ 265) no programa de recompensas para funcionários e conceder um dia extra de férias para quem tomar a vacina.

Em carta aos funcionários enviada em março, Doug Parker, presidente do conselho da empresa aérea, e Robert Isom, presidente-executivo, incentivaram a equipe a se vacinar assim que tivessem oportunidade e prometeram que a empresa faria o possível para facilitar o processo.

A Dollar General Corporation, presente em 46 estados, disse que seus funcionários não deveriam ter de escolher entre ir para o trabalho e se imunizar e por isso prometeu pagamento equivalente a quatro horas de serviço para quem tomar a vacina.

O hospital Houston Metodist foi além e pagou US$ 500 (R$ 2.650) por profissional vacinado.

Stefanie Asin, diretora de comunicação da organização, disse que o bônus é oferecido para recompensar a equipe pelo trabalho estressante durante o enfrentamento da pandemia. Atrelar o pagamento à vacinação, segundo ela, lembra o quão importante a imunização é para proteger os pacientes. Até agora, 97% dos funcionários já foram vacinados.

Outras empresas passaram a oferecer incentivos também para não funcionários. A Uber, por exemplo, anunciou nesta semana que vai oferecer corridas de graça para quem ainda não se vacinou.

Em sua conta no Twitter, o presidente dos EUA, Joe Biden, anunciou que a Lyft também vai fornecer corridas gratuitas.

No Brasil, a Uber disponibilizou corridas de graça para grupos prioritários e profissionais da saúde em algumas cidades e estados.

Os incentivos também tomaram a forma de cerveja grátis oferecidas a consumidores a partir de parcerias entre governos estaduais e associações de empresas em busca de divulgação.

O estado de Connecticut criou a campanha "Drinks Are On Us" (as bebidas são por nossa conta, em tradução livre) com centenas de restaurantes locais. Entre os dias 19 e 31 de maio, os estabelecimentos oferecem a bebida de graça para quem mostrar o cartão de vacinação preenchido.

Em Nova Jersey, o programa "Shot and a Beer" (uma dose e uma cerveja, em tradução livre) foi feito com a Brewer's Guild, associação de cervejarias independentes do estado. Vale para quem tomar a vacina no mês de maio.

No fim de abril, o governo da Virgínia Ocidental anunciou que pagaria US$ 100 para jovens, com idade de 16 a 35 anos, que se vacinassem. O pagamento vale até para os que já haviam sido imunizados antes do início do programa. ( com Folhapress)